São Paulo, quarta-feira, 24 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/HORA DAS PROVAS

Presidente do PL alega que os R$ 6,5 mi sacados de contas de Marcos Valério saldaram dívidas do 2º turno da campanha de 2002

Usei caixa 2 em eleição de Lula, diz Valdemar

RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

SILVIO NAVARRO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O ex-deputado Valdemar Costa Neto, presidente do PL, afirmou ontem na CPI do Mensalão que os R$ 6,5 milhões que recebeu entre fevereiro de 2003 e janeiro de 2004 das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza foram integralmente usados para pagar dívidas da campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva -de quem José Alencar (PL) foi candidato a vice.
"Para as eleições de 2002, involuntariamente, recebi dinheiro não-oficializado do PT. (...) [O recurso] foi totalmente gasto na campanha do presidente Lula no segundo turno", disse Valdemar.
Segundo o ex-deputado, o dinheiro quitou dívidas contraídas com a confecção de material de campanha da coligação Lula-Alencar distribuído na região metropolitana de São Paulo.
Valdemar afirmou que Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, teria dito: "Faz a despesa, que depois acertamos". Em outro momento do depoimento, foi mais direto: "Pendurei tudo". Segundo o presidente do PL, o ex-tesoureiro do PT era "absoluto". "Delúbio tinha autonomia total para comandar as finanças do PT. Era absoluto."
Valdemar disse que os fornecedores do material trabalhavam com o PT, mas não citou nomes.
A maioria dos integrantes da CPI considerou a versão de Valdemar pouco crível. "Ele repetiu o que já havia dito e falou sobre coisas que sabíamos. O que devemos é confrontar a fala com a investigação em cima de documentos", avaliou o senador Amir Lando (PMDB-RO), presidente da CPI.
"Fica caracterizado o caixa dois; [já quanto a] o "mensalão", devo confessar, os dados são escassíssimos", disse o relator, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG).
O depoimento do presidente do PL também deu a entender que o ex-ministro José Dirceu (PT-SP) saberia do esquema. Segundo Valdemar, Dirceu disse a ele em meados de 2003, quando chefiava a Casa Civil, que Delúbio "estava viabilizando o dinheiro" e que o PT "iria honrar" todos os compromissos assumidos.

Blindagem
O ex-deputado -o único a renunciar até agora devido ao escândalo- começou a depor pouco depois do meio-dia e falou por mais de sete horas. Ele é acusado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser um dos integrantes do esquema do "mensalão". Valdemar procurou "blindar" o presidente, o vice e o PL.
"Não quero ser um problema para o presidente Lula", disse. "O Lula é um homem honesto. O caixa dois (...) aconteceu sem o conhecimento dele."
E continuou: "Sou o único responsável pela encomenda de material e pelos pagamentos efetuados. (...) O vice-presidente me chamou a atenção. Disse para ter cuidado com campanha. Nunca comentei com ele que estava recebendo dinheiro após a eleição".
Valdemar também excluiu Dirceu das negociações. "Zé Dirceu nunca discutiu comigo valores." Fez diversas menções a Dirceu e até citou dificuldades entre o ex-ministro e Antonio Palocci Filho (Fazenda). "O Zé Dirceu, por exemplo, a gente sabia que tinha o comando da Casa Civil, mas não tinha sobre a área do Palocci e isso era um estrago no governo. Ele acertava de mandar recursos para um Estado, mas não liberavam."
Valdemar disse que não é o único envolvido em pagamentos não-contabilizados. Ele teria recebido R$ 10,8 milhões das empresas de Valério, embora assuma só R$ 6,5 milhões. Desse montante, diz que 80% viria das empresas do publicitário. Do restante, não soube dizer a procedência.
Ontem, o ex-deputado disse ter "certeza que o "mensalão" nunca existiu". "O envolvimento do PL no "mensalão" é uma fantasia do Roberto Jefferson. O partido que tem o vice-presidente da República não precisa de "mensalão" para votar com o governo."
Ele diz ter recibo de apenas R$ 1,7 milhão dos R$ 6,5 milhões e confirmou que fez um acordo com o PT em 2002 para compor a candidatura Lula. Pelo acerto, R$ 10 milhões dos R$ 40 milhões que a coligação PL-PT esperava arrecadar iriam para o PL. "Isso é um acordo eminentemente político."
Sobre Jefferson, declarou que emissários do petebista ofereceram acordo. Eles queriam, segundo Valdemar, que o PL tirasse o pedido de cassação contra Jefferson, que, em troca, não pediria a cassação de integrantes do PL. "Quero dar esse recado agora ao Roberto Jefferson", disse olhando para a câmera: "Não retiro o processo de jeito nenhum, Vossa Excelência vai ficar oito anos sem mandato porque vai ser cassado e banido da vida partidária".
Jefferson respondeu por meio de um recado na notificação da Câmara que recebeu sobre seu segundo processo de cassação. "Recebo a notificação fruto de representação de um homúnculo chamado Valdemar Costa Neto. Homem covarde, leviano e moleque. A história nos julgará".
O PTB pediu a cassação de Valdemar, que renunciou antes da abertura do processo. Isso o livrou do risco da perda dos direitos políticos. "A renúncia libertou-me das ameaças do Jefferson. Preferi a liberdade à chantagem."


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