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Foco
Humor e leveza ditaram o caminho das canções do exílio durante a ditadura
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
A história das canções do
exílio feitas no Brasil por causa da ditadura militar começou em 1968 sob uma vaia que
o tempo tornou constrangedora. O calor do momento político fez com que a plateia do
Maracanãzinho massacrasse
"Sabiá", de Tom Jobim e Chico Buarque, para exaltar "Caminhando ("Pra Não Dizer
que Não Falei de Flores)", de
Geraldo Vandré, no 3º Festival Internacional da Canção.
As circunstâncias impediram que um público de esquerda, num momento de
maniqueísmo político, percebesse que Chico estava reinterpretando a "Canção do
Exílio", de Gonçalves Dias, à
luz da ditadura militar. "Vou
voltar/ Sei que ainda vou voltar/ Para o meu lugar", clamava a letra.
Apesar do trauma inicial e
do acirramento da repressão,
inclusive aos artistas, muito
do que se compôs sobre o tema foi permeado de humor.
Esta aparente leveza deu uma
contribuição fundamental
para que as músicas passassem pela censura e, também,
sobrevivessem ao tempo, sem
o estigma das canções de protesto tradicionais.
Obrigados em 1969 a trocar
o Rio de Janeiro por Londres,
Gilberto Gil saiu mandando
"Aquele Abraço" -era assim
que os soldados de onde esteve preso o saudavam- e Caetano Veloso homenageou sua
irmã em "Irene": "Eu quero
ir, minha gente/ Eu não sou
daqui/ Eu não tenho nada,
nada/ Quero ver Irene rir".
Por causa do choro que verteu ao receber a visita de Roberto Carlos em Londres,
Caetano ganhou do Rei, em
1971, "Debaixo dos Caracóis
dos Seus Cabelos", com muito mais dor do que humor.
Já Chico, quando voltou ao
assunto na epistolar "Meu
Caro Amigo" (1976), foi para
avisar com oblíqua graça ao
exilado dramaturgo Augusto
Boal, então na França, que a
coisa aqui estava "preta".
Se o humor persistiu sob os
anos de maior chumbo, não
faltaria em 1979, quando a
anistia aos exilados se avizinhava. O hino involuntário da
campanha -melodia de João
Bosco e voz de Elis Regina-
foi um suave samba-enredo
que começava fantasioso:
"Caía a tarde feito um viaduto". Na letra de "O Bêbado e a
Equilibrista", Aldir Blanc escreveu "irmão do Henfil" porque não sabia que ele se chamava Herbert de Souza.
Ainda mais leve, o samba
"Tô Voltando" (Maurício Tapajós/Paulo César Pinheiro),
gravado por Simone, imaginava um homem retornando
à sua mulher, à sua casa.
E não foi só na música que
vozes que tinham sido caladas voltaram a soar. Livros
com memórias sobre os anos
no exterior chegaram às listas
de mais vendidos. Ler "O que
É Isso, Companheiro?"
(1979) e "Crepúsculo do Macho" (1980), de Fernando Gabeira, era quase obrigatório.
"Não Verás País Nenhum"
(1981), de Ignácio de Loyola
Brandão, "Passagem para o
Próximo Sonho" (1982), de
Herbert Daniel, faziam a ponte entre o país que acabava e o
que queria começar.
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