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CELSO PINTO
Alemanha quer um G-20 forte
Berlim - A Alemanha quer fazer do primeiro encontro do recém-criado Grupo dos 20, o G-20, do qual participa o Brasil,
dia 16 de dezembro, em Berlim,
"uma reunião estratégica", para discutir as bases do novo sistema financeiro internacional.
"É uma ótima oportunidade
para o Brasil fazer uma grande
contribuição nessa área", disse-me o vice-ministro das Finanças da Alemanha, Caio Koch-Weser, em seu escritório no centro de Berlim, no prédio que já
foi sede do Ministério da Defesa
Aérea de Hitler.
Koch-Weser é um paranaense
de Rolândia, filho de alemães
que emigraram para o Brasil
em 1933. Ele trabalhou 25 anos
no Banco Mundial, onde chegou a vice-presidente, e, desde
maio, assumiu o segundo cargo
mais importante do poderoso
Ministério das Finanças. Nas
suas novas funções, ele é o representante alemão no Comitê
de Finanças da União Européia
e vice no G-7, que reúne os sete
países mais ricos.
Desde que assumiu, com a
saída do controverso ex-ministro das Finanças, Oskar Lafontaine, da esquerda dos social-democratas, e a subida de Hans
Eichel, mais conservador, Koch-Weser falou pouco à imprensa.
Sua prioridade tem sido ajudar
na implantação das reformas
fiscais e da Previdência, além de
um corte de 30 bilhões de marcos (US$ 16,7 bilhões) no Orçamento de 2000. São medidas
para corrigir problemas estruturais da economia alemã, mas
que têm feito despencar a popularidade do primeiro-ministro,
Gerhard Schröder.
O novo G-20 foi criado pelo G-7 na reunião do FMI, em Washington, em setembro. Para
Koch-Weser, "é um clube com
grandes possibilidades, que representa 80% do PIB mundial e
60% da população".
O Brasil e outros países emergentes gostariam que o G-20
fosse um verdadeiro G-7 ampliado e não apenas um grupo
para referendar decisões tomadas pelo G-7. Koch-Weser vê o
G-20 como um foro para discutir, de fato, as questões mais relevantes do G-7.
A agenda da reunião de dezembro ainda está sendo montada, mas a Alemanha gostaria
de discutir formas para implementar os novos "standards" de
transparência e as novas regras
de conduta definidas pelo FMI
nas áreas fiscal, monetária e financeira. Koch-Weser acha que
a experiência recente do Brasil,
depois da crise cambial, será
muito útil.
Na agenda do G-7, uma questão central é como fazer com
que o setor privado pague sua
parte nos pacotes de resgate de
crises em países emergentes. A
Alemanha quer a definição de
regras claras de conduta em crises futuras, mesmo que seja preciso, depois, flexibilizá-las. Os
Estados Unidos, ao contrário,
preferem soluções "ad hoc", caso a caso.
Quatro países pequenos estão
entrando como teste nessa discussão: Equador, Paquistão,
Ucrânia e Romênia. No caso do
Equador, prevaleceu a solução
sem regras fixas, que levou à
moratória. Koch-Weser acha
que será possível chegar a um
novo modelo, no G-7, até a reunião de abril do FMI.
As implicações desses princípios para países emergentes, inclusive o Brasil, são enormes. O
G-20, se funcionar, pode se tornar um foro importante para
esse tipo de discussão. A presidência do G-20, por dois anos,
será do ministro canadense,
Paul Martin, e a reunião preparatória dos vice-ministros será
em novembro, em Vancouver.
Koch-Weser acha que uma lição da crise cambial no Brasil é
a importância de ter um câmbio flexível. A rapidez na recuperação da economia tem sido
surpreendente, mas ele lembra
que "o Brasil precisa de reformas fiscais com grande urgência".
Precisa, também, cuidar de
seus problemas de longo prazo,
algo que o esforço para a estabilização e as crises externas acabaram atrapalhando. "A distribuição de renda no Brasil é um
desastre e piorou nos últimos 20
a 30 anos", diz. Feita a estabilização, observa, "é preciso lidar
com ímpeto" com a questão distributiva, a educação e as questões regionais.
Ele vê com grande simpatia a
negociação de um acordo de livre comércio entre a União Européia e o Mercosul (para onde
vão 50% das exportações alemãs na América Latina). A Alemanha foi fundamental para
ajudar a fixar um calendário
para as negociações na reunião
do Rio, em junho, apesar das resistências de franceses e britânicos.
As empresas alemãs tiveram
uma participação tímida na
privatização brasileira, mas ele
acha que existe espaço para entrar mais agressivamente na
área de infra-estrutura. Assim
como existe espaço para maiores investimentos de pequenas e
médias empresas alemãs no
Brasil.
Alemanha em reforma
A agenda de reformas econômicas do governo alemão é ambiciosa e Koch-Weser diz que
não há alternativas a ela. A
Previdência é inviável, por razões demográficas, o que torna
a trajetória da dívida fiscal insustentável. Além disso, é preciso flexibilizar os custos de trabalho para dar competitividade
à economia.
Tanto a população economicamente ativa, quanto a total,
vão começar a cair nas próximas décadas. Em 2050, a população atual de 82 milhões estará
reduzida para 70 milhões. O
que, a seu ver, justifica a Alemanha pensar em uma política
ativa de imigração, o que a ampliação da União Européia para os países do Leste pode ajudar.
Por essa razão, embora o déficit fiscal seja pequeno (2% do
PIB), a dívida total subiu de 200
bilhões de marcos em 1982 para
1,5 trilhão hoje. "Não é sustentável", diz.
Ele gosta de colocar as questões alemãs num contexto europeu. Acabou a fase dos ganhos
fiscais fáceis na Europa, pela redução dos juros que antecedeu
a união monetária. Alguns países pequenos, como Irlanda e
Holanda, estão numa ótima situação fiscal, mas três grandes,
França, Itália e Alemanha,
"têm que aumentar seus esforços".
Em nível europeu, tem havido
um aprendizado pela experiência dos outros, pela "pressão dos
pares" e pelos exemplos de sucesso. Ele diz que é preciso
"uma nova cultura, de aprender pelos resultados". Na prática, contudo, o debate fiscal acaba dominado pelas lutas políticas domésticas. E países maiores, como a Alemanha, são muito voltados para dentro.
Existe, também, uma defasagem entre lançar os planos e obter resultados -algo que levou
uma década na Holanda. "A
questão é como conciliar o
apoio e as expectativas políticas
com um processo lento de reformas", admite.
Os planos de Schröder incluem reduções de impostos para as empresas e de contribuições previdenciárias de trabalhadores e empregadores (1,6%,
em duas etapas). A perda de receita seria coberta com um "imposto verde" sobre combustíveis, polêmico pela magnitude
prevista.
Incluíram, também, a cobrança de contribuições previdenciárias sobre salários baixos
de autônomos. Para o governo,
seria uma forma de forçar um
aumento do mercado formal;
para os críticos, resultará em
menos empregos e recursos previdenciários. Prevê, ainda, reduções de alguns benefícios sociais.
É um pacote polêmico, visto
como conservador por muitos.
Koch-Weser acha que a população, em geral, "entende que não
há alternativa".
Outras idéias virão. Ele acha
interessante, por exemplo, a experiência holandesa de trabalho em meio período, como forma de reduzir o desemprego. Já
a experiência francesa de redução da jornada ele diz ser muito
custosa, do ponto de vista fiscal,
pelos subsídios implícitos para
as empresas.
Ele diz que há muito a avançar, na Europa, para se ter uma
maior mobilidade de mão-de-obra, o ponto fraco da integração. Por exemplo, criar "portabilidade", ou seja, a possibilidade de transferir contribuições
previdenciárias entre países.
A Alemanha deve crescer até
1,5% neste ano e até 2,5% no
próximo, na previsão oficial (ou
até 3% em projeções privadas).
Um problema, lembra, é que a
cada novo ciclo de crescimento
tem sido menor a criação líquida de empregos, especialmente
para os mais velhos.
Apesar de tudo, ele é otimista
com a Europa e com a perspectiva de uma retomada da economia alemã. O clima político
para Schröder, contudo, está
cada vez mais difícil, depois de
sucessivos reveses em eleições
estaduais, queda na popularidade e demonstrações nas ruas.
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