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DOMINGUEIRA
Boçais
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo
O diretor abriu a porta da
sala de aula e a criançada entrou em pânico. Não pode
mais riscar com a caneta o
coleguinha da frente, morder
a orelha do gordinho ou colocar prego na cadeira da professora, sob o risco de punições severas.
A molecada não gosta de regras, muito menos de castigos.
O Brasil nenen não gosta de
leis. Não acredita que elas
possam ser realmente aplicadas e detesta a idéia de que
transgredi-las possa resultar
em punições.
O país reage infantilmente
ao novo Código de Trânsito.
Acostumado com a ausência
de rigor, habituado ao vale-tudo da guerra do asfalto,
prefere dedicar-se a descobrir
truques para burlá-lo e colecionar problemas com a esperança de inviabilizá-lo.
Como crianças na Disneylândia, os brasileiros encantam-se com o que vêem na
Europa. Vivem a contar aos
amiguinhos que lá no Primeiro Mundo os carros param
quando o pedestre pisa na faixa. Que o ônibus não sai correndo com gente pendurada
na porta. Que não se disputam grandes prêmios automobilísticos nas ruas e os sinais
são respeitados.
Mas cá entre nós, claro, a
coisa é diferente. A Europa,
como diz a curiosa linguagem
local, é "lá fora". E "lá fora" é
outro mundo. É quase uma
ficção, alguma coisa que se vê
nas férias, como um longo filme ou peça de teatro. Depois a
cortina fecha e volta-se à esculhambação de nossa vida
real.
É claro que o novo código é
extenso, com detalhes desnecessários e uma ou outra maluquice. É verdade que a regulamentação nem sempre será
simples e a aplicação dificilmente poderá ser integral.
Não se discute, também, que
os responsáveis pela implantação da nova legislação perdem-se, como de hábito, em
trapalhadas.
Mas nada disso deve servir
para ocultar o fato de que o
trânsito no Brasil é uma barbárie e precisa ser civilizado.
Não é apenas essa ruidosa
confusão, a napolitana bagunça "cultural" da informalidade: é a estupidez, é a violência, é o abuso, é o permanente risco de morte. São as
motos e fuscas que furam os
sinais vermelhos e perdem os
verdes, que levaram Caetano
Veloso a concluir na célebre
canção: "Somos uns boçais".
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