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São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 2003

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AJUSTE RETÓRICO

Presidente diz que não há previsão sobre a inflação que o faça perder "otimismo" e chama críticos de "apressados"

Lula lamenta país "dependente e fragilizado"

Alan Marques/Folha Imagem
O ministro José Graziano (Segurança Alimentar), o vice-presidente, José Alencar, e o presidente Lula durante evento de combate à fome


LEILA SUWWAN
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Depois do segundo aumento da taxa básica de juros em seu governo -de 25,5% para 26,5% ao ano- na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou ontem sobre a situação econômica e afirmou que o país "não poderia estar tão dependente do capital internacional e fragilizado". Para Lula, que participou de um evento voltado ao combate à fome na CNC (Confederação Nacional do Comércio), é preciso pensar na recuperação da economia e na redução dos juros.
"Concomitante [à mobilização social no Fome Zero], temos que pensar na recuperação do crescimento da economia. Temos que pensar na redução de juros deste país. Vocês sabem que a situação do nosso país não é das melhores. Um país do tamanho do Brasil não poderia estar tão dependente do capital internacional e fragilizado como está hoje", disse o presidente.
E completou: "A nossa economia já poderia estar crescendo. Mas vai crescer. [...] Não há indicador social, não há número de previsão de inflação que me faça perder o otimismo com que eu estava no dia 1º de janeiro, quando tomei posse".
Em seu discurso na solenidade de assinatura do protocolo de cooperação entre o Sesc (Serviço Social do Comércio) e o Ministério de Segurança Alimentar e Combate à Fome, Lula disse que a responsabilidade pelo sucesso do projeto Fome Zero é exclusivamente da sociedade civil, porque o governo federal precisa se concentrar na recuperação da economia e em baixar os juros.
É a primeira vez que Lula comenta o aumento dos juros desde a semana passada.

"Apressados"
O presidente abriu seu discurso respondendo diretamente a seus críticos -chamados por ele de "apressados"- e disse que o Fome Zero, que distribuirá verbas para a compra de alimentos, não é "proselitismo" nem "esmola".
"O Fome Zero não terá o sucesso que nós queremos se ficar dependendo apenas do governo. A sociedade civil, pela sua dinâmica, será a única e maior responsável pelo sucesso total do Fome Zero. O governo vai cumprir sua parte, vai fazer o que é possível fazer na medida do Orçamento e da burocracia", disse.
A seus críticos, o presidente afirmou que o projeto não ocorrerá com a rapidez cobrada e lembrou que há entre 43 milhões e 50 milhões de pessoas -"uma Argentina e meia"- passando fome no Brasil.
"Há sempre aqueles apressados que dizem: "Não adianta fazer isso, isso não resolve o problema, é dar migalha para as pessoas, é dar um prato de comida, o que nós precisamos é gerar emprego e riqueza". Quando chegarmos a isso, teremos ensinado as pessoas a pescar, mas ainda não chegamos a esse ponto", disse Lula, em relação a críticas de que o Fome Zero seria assistencialista. No dia em que o governo começou a pagar os R$ 50 para as famílias de Guaribas e Acauã (PI), ele não mencionou o benefício.
Na mesma mesa em que o governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), acusado de compra de votos pelo Ministério Público e pelo PT, Lula também afirmou que a fome leva as pessoas à submissão, o que facilita a troca de votos por comida.
"Não temos que ter vergonha de enfrentar o debate e dizer que não estamos fazendo proselitismo. Não estamos dando esmola a ninguém. A fome, em lugar algum do mundo, levou o ser humano à revolução. A fome leva sempre à submissão. A fome leva o ser humano a se tornar um pedinte, presa fácil na época das eleições de muitos políticos brasileiros que utilizam a pobreza como forma de se perpetuarem no poder", disse Lula.
O presidente agradeceu aos cerca de 200 presentes por oferecerem um prato de comida aos famintos "enquanto a gente [o governo] não pode fazer a economia crescer e enquanto não podemos gerar os empregos que queremos".
Lula fez ainda um apelo emocional aos comerciantes ao dizer que eles devem estar cansados de ver potenciais fregueses, que "passam olhando e não conseguem comprar", que dormem debaixo das marquises de suas lojas ou que morrem na calçada e só são removidos 12 horas depois.
Segundo ele, entram e saem governos, deputados, senadores e ministros e o resultado é sempre o mesmo: "O povo continua mais pobre do que antes". Essa foi a única menção direta à herança de dificuldades que recebeu.


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