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Elio Gaspari
O professor acha que pena de morte é pouco
Renato Janine quer prisões "sofridas". Por enquanto, esse nicho do mercado está com as gangues de presídios
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NUM ARTIGO RECENTE, tratando do
assassinato do menino João Hélio, o doutor Renato Janine Ribeiro, professor titular de ética da USP,
escreveu o seguinte:
"Se não defendo a pena de morte contra os assassinos, é apenas porque acho
que é pouco. (...) Todo o discurso que conheço, e que em larga medida sustento,
sobre o Estado não dever se igualar ao
criminoso, não dever matar pessoas, não
dever impor sentenças cruéis nem tortura -tudo isso entra em xeque, para mim,
diante do dado bruto que é o assassinato
impiedoso. Torço para que, na cadeia,
os assassinos recebam sua paga; torço
para que a recebam de modo demorado
e sofrido."
Janine é diretor de avaliação da Capes,
entidade encarregada de julgar a qualidade acadêmica das universidades brasileiras.
O professor não defende a pena de
morte, mas entende sua lógica. No ano
passado, uma pesquisa do Datafolha
mostrou que 51% dos brasileiros desejam uma lei que permita a execução de
bandidos. A Corte Suprema dos Estados
Unidos restabeleceu-a em 1976. Admitindo-se que essa penalidade existisse no
Brasil e fosse administrada de acordo
com os critérios da Justiça americana, é
possível que só o motorista do carro que
arrastou João Hélio arriscaria perder a
vida. O bandido de 16 anos, por menor,
estaria expressamente a salvo da pena
capital. Toda vez que se organiza uma
mesa-redonda para discutir o sistema
penal brasileiro sem a presença de um
defensor da pena de morte exerce-se um
piedoso patrulhamento que mutila o debate e mascara as execuções feitas por
policiais e milicianos.
A ética de Janine é assustadora quando ele diz que no caso dos quatro bandidos a pena de morte "é pouco", pois torce
para que os bandidos paguem, na cadeia,
"de modo demorado e sofrido".
Falta definir "sofrido", mas não falta
conhecer como se sofre nas cadeias brasileiras, comandadas por quadrilhas de
bandidos. Cada pessoa disposta a desejar
que um delinqüente seja submetido aos
sofrimentos estipulados pela "Lei da
Massa", ou "do Cão" pode escolher uma
pena cumulativa, com base na vida real.
A escolha é livre.
"E eles batiam no senhor? (...) E esculacharam? Estupraram o senhor?" "Fizeram tudo. Me esculacharam, tiraram
minha roupa todinha. Fizeram besteira
comigo. (...) Tem um mês que estão me
esculachando, e tudo." (Diálogo extraído
do trabalho "Oficina do Diabo", do sociólogo Edmundo Campos Coelho.)
Admita-se que o estupro sistemático
de presos faça parte do mundo das penitenciárias. Há também a chantagem
contra irmãs, mulheres e mães que vão
visitar os cárceres. Em alguns casos, cobra-se dinheiro ou serviços para a quadrilha. Em outros, sexo.
Preso sem dinheiro é obrigado a trabalhar para os outros e a assumir a responsabilidade por crimes alheios. Vira "robô". Em alguns casos, mata por encomenda. Há casos de "robôs" com mais de
dez homicídios dentro da prisão.
Nas penitenciárias controladas pelos
comandos, vigoram os códigos das quadrilhas, movidos a dinheiro. Mesmo que
os assassinos de João Hélio fossem retalhados vivos, a torcida haveria de se decepcionar. Qualquer que fosse a paga demorada e sofrida, ela nada teria a ver
com a indignação dos homens de bem.
Seria apenas um gesto destinado a intimidar bandidos que tumultuam os negócios das quadrilhas e do tráfico. Seria
uma iniciativa destinada a fortalecer a
bandidagem, enfraquecendo a lei.
Janine colocou "em xeque" a idéia de
que o Estado não deve torturar o criminoso, mas não propôs a entrega de bandidos à Lei do Cão. Fica uma dificuldade:
só ela inclui a tortura na sua lista de penas. Pelo Código Penal, tortura é crime
inafiançável.
Nosso Guia acha que os defensores da
redução da maioridade penal acabarão
perseguindo fetos. Blablablá. O inferno
não está nos outros, mas no seu governo,
no qual um hierarca do ministério da
Educação acha que a "pena de morte é
pouco".
Serviço: O artigo de Janine está nos seguintes sítios: Na Folha (para assinantes), no caderno Mais! do dia 18. No
Humanitas Unisinos, uma busca em
"Janine" traz o artigo, com data do dia
19.
DARCY, 10 ANOS
Uma colaboração para a lembrança dos dez anos da morte
de Darcy Ribeiro:
Em julho de 1969, Darcy estava preso no Batalhão de Comando do Corpo de Fuzileiros
Navais no Rio. Ocupava uma
espaçosa suíte com vista para a
baía e deu-se conta de que abaixo de sua janela viam-se as ruínas de um portão do início do
século 19. Tinha alguma beleza,
mas estava degradado.
Da cana, Darcy telefonou ao
diretor do Iphan, Renato Soeiro, pedindo ao governo que o
encarcerava que cuidasse melhor do patrimônio da Viúva. O
portão foi consertado
OITICICA NA TATE
Vem aí uma das maiores exposições já organizadas com a
obra de um artista brasileiro.
Infelizmente, será em Londres,
na Tate Gallery.
Irá de junho a setembro e
mostrará 150 trabalhos de Hélio Oiticica (1937-1980), alguns
dos quais estão guardados há
mais de 50 anos.
Hélio pegava pesado. Homenageou o bandido Cara de Cavalo, a quem conhecera no
morro da Mangueira, com uma
bandeira que dizia o seguinte:
"Seja marginal, seja herói".
METRÔ INTELIGENTE
A urucubaca continua perseguindo os transportecas do metrô de São Paulo. Enquanto eles
resistem à idéia de instalar um
sistema de tarifagem inteligente, o metrô do Rio deverá oferecer esse tipo de vantagem ainda
neste ano.
Com um bilhete inteligente,
virão descontos aos passageiros habituais (refresco que
os paulistas confiscaram) e
novas vantagens. Estuda-se
um jeito de dar desconto às
pessoas que tomam o metrô para ir ao cinema.
MARTA É MÓVEL
É ilusão acreditar que Lula e
Marta Suplicy podem cabalar
que ela permanecerá no ministério até 2010.
Nessa combinação, a permanência no ministério é irrelevante. No ano que vem, o problema dos dois será a busca de um candidato capaz de tomar a
Prefeitura de São Paulo do consórcio tucano.
ELO PERDIDO
Depois da queda de Severino
Cavalcanti surgiu a idéia de o
presidente da Câmara devolver
a mansão oficial em que vive
enquanto ocupa a função.
Aldo Rebelo esqueceu o assunto e Arlindo Chinaglia não
chegou a lembrá-lo.
Ela custa, no barato, R$ 50
mil por mês, fornecendo teto,
comida e roupa lavada.
GRANDE BORAT
Passado o Carnaval, a melhor
diversão é ver "Borat" nos
cinemas. Nele se ri daquilo que
o bom tom colocou fora do alcance do humor. O repórter
que saiu do Cazaquistão para
visitar os "US and A" é o caipira
globalizado. Sacha Baron Cohen é um grande comediante,
mas o maior artista do Cazaquistão é o presidente Nursultan Nazarbayev.
Começou como metalúrgico
comunista e manda no pedaço
desde 1984. Teve 91,5% dos votos e quer que as pessoas acreditem nisso, mas desmente que
tenha amealhado US$ 1 bilhão
em bancos europeus.
Nazarbayev está sentado em
imensas reservas de petróleo.
Na sua terra, oposicionista vai
embora e jornalista apanha.
Houve uma época em que pagava os melhores mensalões com
diamantes. Quando quer conversar assunto sério, chama o
convidado para a sauna. Com
os dois pelados, só ele grava.
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