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ENTREVISTA DA 2ª/MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO
Secretária estadual de Educação diz que a desorganização pedagógica deve ser sanada com a adoção de currículo comum à rede; segundo ela, Grande SP precisa de R$ 1,5 bilhão
Autonomia das escolas gerou queda na qualidade do ensino
Thiago Bernardes/Folha Imagem
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A secretária estadual de Educação de SP, Maria Helena Guimarães de Castro, durante entrevista; pacote de medidas inclui a adoção de um currículo comum à toda rede (que não existia) e reformas nas escolas
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
PROFESSORES QUE NÃO se fixam nas escolas.
Liberdade excessiva aos colégios. Recursos
insuficientes para infra-estrutura e salários. Esses são os problemas na rede de ensino de São Paulo apontados pela secretária estadual
de Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, que
contribuem, segundo a titular do governo José Serra
(PSDB), para que os alunos da rede estadual tenham
dificuldades para aprender.
Nesta entrevista concedida à Folha na última quinta-feira, Maria Helena detalha os projetos da atual gestão -entre eles, a adoção de um currículo comum à toda rede e reformas nas escolas- e, sem citar nominalmente, afirma que houve falhas nas gestões anteriores, as duas últimas do PSDB (Geraldo
Alckmin e Mario Covas).
A reportagem procurou na última sexta-feira o
presidente da Apeoesp (sindicato dos professores),
Carlos Ramiro de Castro, mas não conseguiu localizá-lo para que comentasse as críticas aos docentes.
FOLHA - Faltam recursos para a
educação em São Paulo?
MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO - Precisamos melhorar a
infra-estrutura das nossas escolas. O governador José Serra
está investindo pesado nisso.
No ano passado, foram R$ 550
milhões e, neste ano, já alocamos R$ 107 milhões em apenas
dois meses. É muito mais do
que foi investido nas gestões
anteriores.
Mas são 5.530 escolas. É suficiente o que o Estado está alocando? Ainda não é, apesar de o
esforço ser muito grande.
Teve chuva agora, a quantidade de problemas que surgiu é
impressionante. Também há
escola que foi toda reformada,
mas na outra semana a fiação já
foi roubada, para que o cobre
seja trocado por droga.
Temos um diagnóstico de
que, só para a Grande São Paulo, precisamos de no mínimo
R$ 1,5 bilhão, imediatamente.
FOLHA - Quais são os principais
problemas de infra-estrutura?
MARIA HELENA - É preciso trocar
toda a parte elétrica, a hidráulica e os telhados de uma boa
parte das escolas. Muitas têm
mais de 40 anos, precisam de
uma reforma completa.
FOLHA - O R$ 1,5 bilhão imediato
está disponível?
MARIA HELENA - Até 2010, haverá R$ 1,7 bilhão, entre reformas
e obras. Mas já estamos fazendo um novo levantamento, que
mostra que o buraco é maior do
que tínhamos anteriormente,
principalmente na Grande São
Paulo. São necessárias reformas estruturais nas escolas.
FOLHA - Por que a situação chegou
a esse ponto?
MARIA HELENA - Houve falhas de
manutenção das escolas. Muitas vezes, os diretores não comunicam suas necessidades às
diretorias de ensino. E há diretorias que não têm clareza ao
hierarquizar os problemas. Estamos fazendo um grande estudo sobre a reorganização das
diretorias. Mas esse foi o legado
que recebemos. Estou aqui há
seis meses, o Serra, há um ano.
Há um problema estrutural.
FOLHA - Então são falhas dos governos Alckmin, Covas...
MARIA HELENA - Não quero dizer
que foram falhas de governo
nenhum, quero dizer que tem
um problema de estrutura organizacional.
FOLHA - Se de fato forem necessários mais recursos para infra-estrutura, a sra. vê possibilidade para liberação desse montante?
MARIA HELENA - Não. Não que o
governador não queira, mas as
necessidades em geral são infinitas, e os recursos, finitos.
Mas acho que neste ano daremos uma grande arrancada na
melhoria da infra-estrutura. Já
temos mais orçamento, e o
FDE [órgão da secretaria responsável pelas obras] está com
uma estrutura melhor.
FOLHA - Faltam recursos para outras áreas da educação no Estado?
MARIA HELENA - Para incentivo à
carreira e à valorização dos
profissionais. A carreira depende de um bom salário [levantamento da Folha mostrou que
SP paga o 10º maior salário do
país a professores iniciantes].
Mas isonomia, só, não resolve. Precisa ter um incentivo
concreto, o bônus por desempenho, para incentivar os mais
dedicados. E precisa melhorar
as condições de trabalho.
Do ponto de vista pedagógico, identificamos que tínhamos
uma grande fragmentação. Cada escola fazia uma coisa. Algumas muito boas, outras mais ou
menos, e a maioria com desempenho muito insatisfatório, segundo os exames de avaliação.
Ficou provado que essa plena autonomia didático-pedagógica não era boa, levou a uma
queda na qualidade. A progressão continuada não é o problema. O problema é a fragmentação pedagógica nas escolas e a ausência de mecanismos de recuperação permanente, do início ao final do ano, como qualquer boa escola particular. Isso
não estava sendo feito.
FOLHA - Mais falhas dos governos
tucanos anteriores?
MARIA HELENA - Mais falhas estruturais. Estamos enfrentando a desorganização pedagógica com várias ações, que já estão em andamento, como criação de um currículo para todas
as séries, de disciplinas e as expectativas de aprendizagem.
Ou seja, as escolas agora sabem o que devem ensinar aos
alunos. Não significa que a escola não tenha autonomia. Ela
continua escolhendo seus livros e seu projeto pedagógico.
Mas isso tem de seguir os conteúdos básicos.
FOLHA - Professores e diretores reclamam que não recebem reajuste
salarial há três anos. Alguns afirmam que, sem o aumento, os profissionais podem ficar desestimulados
e, assim, há o risco de os projetos da
secretaria não saírem do papel.
MARIA HELENA - A negociação salarial não é isolada, envolve o
governo como um todo. Não tenho nenhuma informação, por
enquanto, sobre negociação. A
remuneração por merecimento é importante, mas concordo
que a remuneração básica seja
importante também. Vamos
criar um grupo para revisão da
carreira. Temos, por exemplo,
problemas de absenteísmo [faltas dos professores]. Fica claro
que é devido a uma legislação
extremamente tolerante.
FOLHA - Caso não haja reajuste, os
projetos podem ficar só no papel?
MARIA HELENA - Não sei avaliar.
Só espero que a remuneração
fixa e a variável melhorem.
Também precisamos melhorar as condições de trabalho.
Estamos fazendo um estudo
para a revisão dos módulos [número de alunos por turma], para tentar diminuí-los. A superlotação é muito pontual, atinge
aquelas regiões onde não há
terreno para construir escola.
Nas outras áreas, podemos
reduzir o número de alunos por
turma: para 30 nas salas de 1ª a
4ª série; 35 para 5ª a 8ª [atualmente, a secretaria recomenda
35 e 40, respectivamente].
FOLHA - O país fica sempre nas últimas colocações em exames internacionais. Essa situação vai se alterar?
MARIA HELENA - As avaliações
são diagnósticos. Cabe a Estados e municípios estabelecerem políticas de médio e longo
prazo. Há agora o PDE [Plano
de Desenvolvimento da Educação, do governo federal], que
estabelece metas para Estados,
municípios e escolas. Isso é importante. O problema é que
poucos definiram o caminho
para atingir as metas que o
MEC estabeleceu.
A ação do MEC está começando, vai demorar [para dar
resultado]. Tudo demora em
educação.
FOLHA - Se não há mudanças no
curto prazo, não é um contra-senso
avaliar as escolas no período de apenas um ano para conceder bônus
aos funcionários, como será em SP?
MARIA HELENA - Não estou querendo que a escola dê um salto
no Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do
Estado de SP) de um ano para
outro. Mas qualquer avanço no
Saresp ou melhora na estabilidade do quadro de professores
terá impacto no índice.
Aliás, a estabilidade é um
problema. Anteontem fui a
uma escola em São Mateus [zona leste]. Era segundo dia de
aula e já havia cinco professores afastados, substituídos por
eventuais. A lei permite, não
posso fazer nada.
FOLHA - O que o governo fará?
MARIA HELENA - Tem de discutir
com os sindicatos. Não dá para
mudar isso se todo mundo for
contra. Vamos fazer uma comissão para analisar isso. Mas
essa coisa de remover a qualquer momento, e todo mundo
ter direito, é um crime contra o
direito da criança aprender.
Por que o direito do professor
se sobrepõe? Só neste começo
do ano, 45 mil professores mudaram de escola [a rede possui
250 mil professores]. E nem estou contando licenças médicas.
Os próprios professores da
rede me dizem que os professores eventuais, que passam a
substituir o efetivo que foi embora, chega de pára-quedas. O
substituto entra na sala de aula,
faz a chamada, cruza os braços
e começa a bater papo.
Agora, com o material que fizemos, os coordenadores vão
monitorar semanalmente o
currículo. Na hora que o eventual chegar, ele vai saber exatamente onde o outro parou.
FOLHA - Por que o currículo escolar
se perdeu?
MARIA HELENA - Começou em
meados da década de 80. Não é
um problema só de São Paulo.
E essa é minha crítica para as
faculdades de pedagogia, inclusive USP e Unicamp, porque
elas se focaram em um debate
equivocado que confundia autonomia da escola com fazer o
que quiser. Isso se propagou
[para todo os sistema].
FOLHA - SP vai aderir ao PDE?
MARIA HELENA - Sim. O ministro
deixou claro que os Estados podem escolher quais das 30
ações deseja aderir. Se não usar
nenhuma, pode aderir apenas
aos compromissos com as metas de qualidade. Mas vamos
adotar, ao menos, o programa
de EJA [antigo supletivo] profissionalizante.
FOLHA - A sra. conta com envio de
recursos com o PDE?
MARIA HELENA - Vou pedir muito. Tem Estado pedindo R$ 3
bilhões. Quem sabe não vem
um dinheiro para completar o
que faltará para a infra-estrutura para a Grande São Paulo?
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