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Eletricidade chega a município na era do apagão
DO ENVIADO ESPECIAL AO VALE DO CARIRI
Os 30 alunos do curso noturno
de alfabetização de adultos da Escola Municipal Valdemar de
Alencar Lima, na serra da Perua, a
35 km da sede do município de
Araripe (CE), já estavam acostumados com as aulas iluminadas
por lampiões a gás. Agora, a partir
de 8 de junho, uma semana depois de o país entrar na era do racionamento, tudo vai mudar.
Nesse dia, vai ser acionado o
"Mané Magro", como é conhecido um gafanhoto da região, apelido dado pelos alunos ao catavento de alumínio que gerará energia
eólica (produzida pelo vento) suficiente não só para iluminar a sala de aula, mas também para ligar
um aparelho de TV.
"Já fizemos uma revoluçãozinha aqui", diz a diretora Maria
das Graças Parente Almeida, 51,
que chegou a Araripe há três anos,
quando a escola só tinha 20 alunos. Hoje, tem quase 200.
Foi uma revolução bem caseira.
Quem desenvolveu e montou o
catavento foi o marido de Maria
das Graças, Adauto Manoel de
Paula Almeida, 49, ex-executivo
de multinacional e ex-empresário
de informática, que se apaixonou
pela serra do Araripe, largou tudo
e resolveu criar bodes.
Há um ano, ele comprou um catavento para puxar água na sua
casa. Observando seu funcionamento, resolveu adaptá-lo para
conseguir energia eólica. Como
funcionou bem na casa do casal,
gastou mais R$ 1.300 para montar
outro catavento e o instalou na escola, ligado a uma bateria de carro
de 12 volts. Deu certo.
Mas Adauto, que montou o primeiro microcomputador no Nordeste há 15 anos e chegou a ter
mais de 300 empregados na sua
empresa, a Corisco, nem pensa
em patentear o engenho, montar
uma fábrica e começar tudo de
novo. "Quem quiser fazer igual
que faça, eu até ajudo."
Formada em pedagogia, com
especialização em orientação
educacional, Maria das Graças
não vê a hora de aposentar os
lampiões e instalar o monitor de
televisão. "Agora, vamos ter o telecurso aqui para ajudar os professores nas aulas. Além disso,
vou abrir a escola aos domingos
para que a comunidade toda possa ver futebol e filmes na TV."
Assistir à televisão por aqui ainda é um luxo. Mas, a poucos quilômetros da escola, às margens da
estrada da Taboquinha, entre
Araripe e Exu, ninguém se queixa
da falta de energia elétrica.
Na vizinha serra da Ingá, 50 famílias habituaram-se a desenvolver energias alternativas. Na casa
de Francisco Raimundo Gomes,
por exemplo, os aparelhos de som
e de TV funcionam ligados numa
bateria de carro.
A cada semana, a bateria é recarregada na feira de sábado em
Exu, a 28 km dali, ao módico preço de R$ 2. Na casa de farinha, o
motor é movido a gás.
Há um ano, o professor Raimundo Nogueira Soares, 47, ilumina a casa com energia solar. A
placa instalada diante da casa, que
alimenta uma bateria de caminhão, custou cerca de R$ 1.500.
"Agora, só falta juntar dinheiro
para comprar uma televisão", sonha Raimundo, que ganha R$ 180
para dar quatro horas e meia de
aula por dia. Na estrada da Taboquinha, pelo menos, o racionamento de energia não mete medo.
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