São Paulo, terça-feira, 25 de junho de 2002

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CASO SANTO ANDRÉ

Partido diz que Polícia Federal "usou" juiz ao solicitar grampo sob o pretexto de investigar o narcotráfico

PT acusa a PF de "espionagem política"

DA REPORTAGEM LOCAL

O PT acusou ontem a Polícia Federal de ter feito espionagem política por meio de grampos telefônicos. Segundo o partido, a PF se valeu de um pedido para investigar o tráfico de drogas para obter a autorização legal de quebra de sigilo telefônico de autoridades petistas de Santo André, que nada teriam a ver com o objeto da investigação.
O partido apresentou ontem três ofícios da PF, assinados pelo delegado Marcelo Vieira Godoy, em que ele solicita à Justiça a "interceptação" de 41 telefones, entre celulares e fixos, com a justificativa de investigar seu uso "como meio de contato na articulação de organização criminosa atuando junto ao tráfico de drogas".
Por determinação do ministro da Justiça, Miguel Reale Jr., a superintendência da PF em São Paulo dará hoje uma entrevista coletiva para falar sobre o caso.
Os ofícios da PF foram expedidos entre 24 de janeiro e 6 de fevereiro de 2002. Segundo os documentos divulgados pelo partido, houve 18 autorizações pelo juiz-corregedor do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais), Maurício Lemos Porto Alves, entre 24 de janeiro e 8 de fevereiro.
Segundo os petistas, o juiz foi "enganado" pela PF, porque, entre os telefones grampeados estariam os do prefeito de Santo André, João Avamileno, do ex-secretário de Governo Gilberto Carvalho, do secretário de Serviços Municipais, Klinger Luiz de Oliveira Souza, e de Ivone de Santana, namorada do prefeito assassinado do município, Celso Daniel.
"A Polícia Federal estava investigando a morte do Celso [cujo corpo foi encontrado em 20 de janeiro" e em nenhum momento isso foi dito ao juiz", disse o deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh, que acompanhou o caso em nome do partido.
Outro documento apresentado pelos petistas é um relatório interno da Polícia Federal, batizado de Operação Távola Redonda, que investigou a morte de Celso.
Em um dos trechos do relatório, não enviado ao juiz que autorizou o grampo, afirma-se que o Ministério Público Estadual iria utilizar a investigação da morte do prefeito para apurar contratos da Prefeitura de Santo André.
"Segundo o promotor público João Alvares Soares, haverá um redirecionamento das investigações de possíveis irregularidades [nos contratos" por causa do inquérito aberto para investigar o assassinato de Celso Daniel. As informações serão cruzadas com as de três promotores de Justiça que acompanham o crime", diz um trecho do relatório.
Segundo petistas, isso poderia indicar que os grampos teriam sido usados pelo MPE para investigar os contratos da prefeitura.
"Queremos que seja investigado profundamente o que aconteceu em Santo André. Mas não queremos que contamine o processo eleitoral. Não se pode admitir bisbilhotagem desse tipo", disse o líder do PT na Câmara, João Paulo.
Segundo o secretário-geral do PT, Luiz Dulci, houve "espionagem política". "Houve uso ilegal do grampo. Não estava clara a sua real motivação. Que outros fins haveria para isso senão eleitorais?", perguntou Dulci.

Primeiro escalão
O PT não acusou diretamente a cúpula da PF ou o governo. "Não temos informação de que a cúpula da PF soubesse dessas operações", disse João Paulo. Nos bastidores, no entanto, o partido diz desconfiar da participação do primeiro escalão do governo.
O PT não sabe ainda se vai requerer a degravação de eventuais fitas e ainda estuda possíveis medidas judiciais. O partido já desconfiava do grampo desde fevereiro, mas não informou como conseguiu as informações tornadas públicas ontem.
Há cerca de um mês, o presidente do PT, José Dirceu, teve audiência com Miguel Reale Jr., na qual perguntou sobre possível espionagem. O ministro teria declarado não haver nada. "Os fatos que apresentamos desmentem o ministro", disse Greenhalgh.
Ao ser questionado sobre as declarações da cúpula petista, que afirmou ontem à tarde que o governo utilizou escutas telefônicas para rastrear conversas de petistas, o ministro Alberto Cardoso (Segurança Institucional) disse que não falaria sobre o assunto.
"Vocês conhecem muito bem a Abin [Agência Brasileira de Inteligência] e sabem que ela não age dessa maneira", afirmou Cardoso. (FÁBIO ZANINI)


Colaborou a Sucursal de Brasília



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