|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
QUESTÃO AGRÁRIA
Novo laudo da Unicamp contesta versão da Polícia Militar
PMs atiraram primeiro em Carajás, revela laudo
RAQUEL LIMA
DA FOLHA CAMPINAS
ANA PAULA MARGARIDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA CAMPINAS
A Polícia Militar do Pará atirou
primeiro no massacre de Eldorado dos Carajás (PA), quando 19
sem-terra foram mortos, em 17 de
abril de 1996. Essa é a conclusão
do Laboratório de Fonética Forense e Processamento de Imagens da Universidade Estadual de
Campinas, que analisou a única
fita de vídeo do conflito, a pedido
do Ministério Público do Pará.
A dúvida foi levantada durante
julgamento popular que absolveu
três militares e foi anulado posteriormente pela Justiça do Pará.
A fita, com 9 minutos e 11 segundos, foi desmembrada em 33
frames dos quais pelo menos 7
comprovam que a polícia não atirou como forma de advertência.
Os tiros de advertência foram
usados como argumento no júri.
As cenas mostram integrantes
do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra atingidos
por disparos dos policiais na altura do abdômen, das pernas e da
cabeça. O laudo revela que, antes
do conflito, dois sem-terra foram
feridos e pelo menos um manifestante foi morto pelas costas depois que a estrada foi liberada.
A assessoria da Polícia Militar
do Pará não foi localizada para comentar o laudo: ninguém atendeu
os telefonemas. A Agência Folha
deixou recado com Américo Leal,
advogado do comandante do coronel Mário Pantoja, mas ele não
respondeu às ligações.
A perícia foi concluída no último dia 14 pelos peritos Ricardo
Molina de Figueiredo e Donato
Pasqual Júnior e contesta o laudo
feito pelo médico-legista Fortunato Badan Palhares, realizado a pedido da Secretaria de Estado da
Segurança Pública do Pará.
O laudo de Badan Palhares concluiu que a maioria dos sem-terra
morreu vítima de armas brancas,
o que leva a crer que manifestantes mataram os próprios companheiros. "O laudo de Badan não
tinha relevância", afirmou o promotor de Curionópolis (PA) e Eldorado (PA), Marco Aurélio Lima
do Nascimento, que não utilizou
o laudo de Badan Palhares.
A Folha não conseguiu localizar
ontem Badan Palhares. Seu advogado Nivaldo Doro disse que o
médico-legista foi designado pela
Unicamp para realizar um trabalho em Franco da Rocha e não poderia ser interrompido. Sobre o
massacre de Eldorado do Carajás,
Doro afirmou que Badan apenas
forneceu um parecer, porque, à
época, não teria elementos suficientes para fazer um laudo.
O Ministério Público pretende
usar as imagens da fita e as informações de Molina no novo julgamento dos policiais envolvidos.
"O novo julgamento deverá acontecer ainda este ano", disse o promotor Nascimento. Segundo ele,
a fita digitalizada mostra um fato
novo: um homem com um tiro
nas costas dentro do acampamento. A cena é posterior aos tiros enfocados pelo julgamento.
Para Molina, a discussão sobre
quem atirou primeiro é inócua.
Segundo ele, o conflito começou
antes, só que não foi gravado. A
cena começa com sons de metralhadoras. "Quando começou o tiroteio, a câmara estava no acampamento, mas dá para ouvir rajadas de metralhadora", afirmou.
Molina disse que, mesmo na cena enfocada no julgamento, não
há dúvida de que foi o policial
quem deu o primeiro tiro. O trabalho de edição de imagens mostra que o sem-terra atirou dois segundos depois. O primeiro tiro foi
dado com um minuto e 35 segundos de gravação. Antes do tiro, já
existe um sem-terra caído.
A testemunha Maria Abadia
Barbosa, que foi desqualificada
como testemunha, foi identificada na fita. A polícia alegou que
Maria Abadia tinha problemas
mentais e não estava no local.
Colaborou a Agência Folha
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: O massacre de Eldorado do Carajás Índice
|