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SÃO PAULO
Diretor da Dersa afirma que vice-governador paulista foi informado de indícios de irregularidades nas licitações para privatização de rodovias paulistas em 1998, mas nada fez
Alckmin ignorou indícios de fraude
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Vice-governador e responsável
pelo programa de privatização de
São Paulo em 1998, Geraldo Alckmin foi informado de que havia
indícios de que as licitações para a
privatização de cinco estradas teriam sido fraudadas e não fez nada, segundo Celson Ferrari, diretor da Dersa (Desenvolvimento
Rodoviário S/A).
Os indícios de fraude são dois
documentos, com firma reconhecida em cartório, que antecipavam os vencedores da disputa.
A suspeita de fraude não é nova:
a própria Folha e a revista "IstoÉ"
noticiaram o caso em 1998. A novidade é que um diretor da Dersa,
representante dos funcionários,
diz que fez as informações chegarem a Alckmin, por intermédio de
um conhecido comum cujo nome
prefere não revelar, antes de a suspeita ter sido remetida ao Ministério Público. Segundo Ferrari, o
então vice-governador teria dito
que o caso não era com ele porque
havia deixado o programa de privatização.
Alckmin saiu da presidência do
conselho do PED (Programa Estadual de Desestatização) no dia 2
de abril de 1998. Afirma não se recordar de ter sido avisado sobre a
suspeita de fraude (leia texto nesta página).
Investigações
O Ministério Público Estadual
não tem a data exata em que começou a averiguar as suspeitas de
fraude. O único dado preciso é
que, em 7 de maio de 1998, o caso
foi encaminhado ao então procurador-geral de Justiça do Estado,
Luiz Antonio Marrey, porque havia a suspeita de que o governador Mário Covas (PSDB) estaria
envolvido -só o procurador-geral pode investigar o governador.
"Antes de enviar ao procurador-geral, fiz uma pré-avaliação
que demorou mais de 30 dias.
Mas não lembro com precisão da
data que recebi a denúncia", afirma o promotor Clilton Guimarães, que iniciou a investigação.
Como não ficou provado o suposto envolvimento do governador, o caso retornou à promotoria
da Cidadania em abril deste ano.
"Vamos fazer uma investigação
cuidadosa porque isso é uma
bomba atômica", diz o promotor
Fernando Capez, que investiga a
suspeita.
As cinco estradas atingem 1.105
km, o equivalente à distância que
separa São Paulo de Porto Alegre.
Para permitir que empresas explorem as praças de pedágio delas, o governo receberá R$ 2,36 bilhões até 2018.
Resultado antecipado
Assinado em 10 de dezembro de
1997 e com firma reconhecida em
cartório dois dias depois, o primeiro desses documentos declarava quais seriam os consórcios
vencedores da privatização de
duas das principais rodovias paulistas (o sistema Bandeirantes-Anhanguera e a Castelo Branco) e
duas estradas de menor movimento (veja no quadro ao lado).
Todos os nomes dos consórcios
vencedores estavam corretos
-havia algumas omissões dos
integrantes dos consórcios e uma
previsão errada, de que um banco
integraria o grupo que administra
a rodovia Castello Branco.
No caso do sistema Bandeirantes-Anhanguera, o resultado da licitação foi registrado 59 dias antes
da abertura das propostas financeiras e 87 dias antes de o vencedor ter sido homologado.
Só por esse contrato, o consórcio vencedor, a Autoban, pagará
US$ 1,551 bilhão ao governo num
período de 20 anos em troca do
direito de explorar o pedágio nessas duas rodovias.
O segundo dos documentos,
datado de 9 de janeiro de 1998 e
com firma reconhecida em cartório no mesmo dia, cravava que a
Primav ganharia a concessão do
sistema Anchieta-Imigrantes. No
dia 1º de abril (81 dias depois de o
documento ter sido registrado), a
Primav foi apresentada como a
vencedora da concorrência.
O diretor da Dersa diz que, se
não tivesse havido fraude, o Estado receberia mais pelas concessões das rodovias (leia texto nesta
página). "Houve um conluio entre empreiteiras para pagar o menor valor possível", afirma.
Informante
Ferrari afirma que ficou sabendo do resultado das licitações por
meio de um informante da Secretaria de Transportes.
Antes de entregar os documentos ao Ministério Público, Ferrari
diz que tentou falar com o governador Mário Covas e passou a informação a um conhecido de
Alckmin.
"Eu não queria fazer uma exploração política do caso. Tentei falar
com o Covas e com o Alckmin,
mas o Alckmin me mandou falar
com o secretário de Transportes",
conta Ferrari.
Em 1998, Covas, em quem Ferrari votara em 1994, era candidato
à reeleição, e o diretor do Dersa
temia que a suspeita de fraude
fosse explorada politicamente.
"Se eu quisesse que o caso fosse
explorado, teria entregado os documentos para o Paulo Maluf",
ilustra, referindo-se ao principal
adversário de Covas em 1998. Ferrari procurou o então presidente
da Dersa, Antônio Jamil Cury.
Cury encaminhou a suspeita de
fraude ao secretário de Transportes, Michael Zeitlin. A primeira
providência de Zeitlin foi tentar
esvaziar a suspeita.
Convocou uma entrevista coletiva na qual insinuou que o diretor da Dersa poderia ter registrado várias probabilidades de resultado das licitações e uma delas,
inevitavelmente, estaria certa.
Segundo Zeitlin, um diretor da
Dersa, poderia "deduzir, com razoável margem de acerto, os vencedores" (leia texto nesta página).
Ferrari, porém, fez os cálculos
de quantos documentos teria que
ter criado para registrar todos os
resultados possíveis: seriam mais
de 6.000.
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