São Paulo, sexta-feira, 26 de março de 2004

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SOMBRA NO PLANALTO

Em conversa reservada com músicos, presidente diz que 2004 será seu ano mais difícil

Lula culpa os "conservadores" por crise e prevê ano de guerra

MÔNICA BERGAMO
COLUNISTA DA FOLHA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem a um grupo de representantes do movimento hip hop que foram recebidos por ele no Palácio do Planalto que "este é o ano mais difícil de todo o governo", culpou "os conservadores" pela atual crise política e previu "uma guerra" contra a sua administração.
A Folha teve acesso à audiência e presenciou a conversa de Lula com os artistas. A reportagem foi convidada a participar do evento por integrantes do movimento.
Lula se encontrou com músicos como MV Bill, Rappin'hood, o grupo Racionais e Gog, que foram a Brasília pedir maior interlocução com a gestão. No fim da conversa, quando já se abraçavam e tiravam fotografias, Lula pediu silêncio para fazer um "alerta".
"Este é o ano mais difícil de todo o governo. O ano passado foi um ano econômico muito difícil. Este ano é um ano político muito difícil." Em tom professoral, ele continuou: "Por que político? Porque nós terminamos o ano [de 2003] muito bem. Ou seja, todo mundo pensava que a gente não ia conseguir recuperar a credibilidade deste país e chegar ao final do ano numa situação confortável. E nós provamos que sabemos tomar conta do pedaço".
"E o que aconteceu?", prosseguiu Lula. "Os conservadores sabem se reorganizar. Eles têm pesquisas de opinião pública e sabem que nós podemos ganhar [as eleições] em muitas capitais neste ano. Então, todo esse barulho que vocês estão ouvindo por aí é a demonstração do que vai ser este ano. Neste ano, pelo que estão dizendo aí, parece que vão fazer uma guerra contra o governo."
Informalmente, Lula acabou fazendo a declaração mais aberta sobre o que pensa do momento político de seu governo -que vive um terremoto desde 13 de fevereiro, quando foi veiculado que o ex-subchefe do Planalto, Waldomiro Diniz, pediu propina em 2002 para si e para campanhas do PT e do PSB a um empresário do jogo. À época, trabalhava no governo Benedita da Silva (PT-RJ).
Waldomiro saiu do governo, mas o caso só cresceu desde então. Com a paralisia do governo, as dificuldades econômicas do país e o enfraquecimento político de José Dirceu (Casa Civil) -até então homem mais poderoso da Esplanada dos Ministérios-, aliados aproveitaram para exigir cargos e emendas parlamentares.
A crise quase provocou o esfarelamento da base aliada. Para contê-la, o governo foi obrigado a fazer uma série de concessões.

Apanhei tanto na vida
Na conversa com os músicos, o presidente não disse quem seriam os "conservadores" em questão.
Ontem, a oposição liderada por PFL e PSDB lançou um fórum para tentar unificar seu discurso. Aliados como o PL e o PMDB, além do próprio PT, têm feito críticas à política econômica.
Lula afirmou ainda que "o governo nunca pode perder a tranqüilidade" e disse aos músicos: "Vocês nunca vão me ver ficar nervoso com isso. Eu já apanhei tanto na minha vida". Para ele, os músicos do hip hop, que só chamavam o presidente de "você" e o governo petista de "nosso", têm de aproveitar enquanto ele estiver exercendo o poder no Planalto.
"O importante é vocês terem claro o seguinte: nós temos um mandato de quatro anos. Vamos aproveitar para prestigiar companheiros como vocês. Os companheiros de "depois" [de ter sido eleito] têm qualidade. Mas os de antes têm muito mais qualidade."


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