São Paulo, quinta, 26 de março de 1998

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REGIME MILITAR
Zuzu Angel foi assassinada, diz comissão

ABNOR GONDIM

da Sucursal de Brasília

A Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, do Ministério da Justiça, reconheceu ontem, por 4 votos a 3, que a estilista Zuzu Angel foi vítima de atentado político, em 1976, em acidente de carro provocado por agentes do regime militar (1964-85). A decisão da comissão foi baseada principalmente em novo laudo sobre o acidente. Esse laudo desmonta a versão oficial de que ela teria dormido ao volante e capotado depois de bater nos meios-fios da auto-estrada Lagoa-Barra, na cidade do Rio de Janeiro. Com a decisão de ontem, a família da estilista terá direito a indenização, cujo valor ainda será arbitrado. Mãe de Stuart Angel, ativista político morto em 1971 na Base Aérea do Galeão (RJ), Zuzu Angel denunciava na época a violência do regime militar. A comissão já aprovou pedido de indenização apresentado pela família em relação a Stuart Angel. Cada indenização varia entre R$ 100 mil e R$ 150 mil. A família quer utilizar esses recursos para divulgar a luta de ambos em defesa dos direitos humanos. O relator do processo da estilista, Luís Francisco Carvalho Filho, afirma que o Karmann-Guia dirigido por Angel foi fechado por outro carro, com base nos testemunhos dos advogados Marcos Pires e Carlos Medeiros, que estavam próximos do acidente. "Fora da perspectiva política, não há explicação razoável para a falsidade da versão oficial", afirma o relator. "Minha convicção é de que Zuleika Jones foi vítima de atentado político."

Meio-fio
O novo laudo foi elaborado pelos especialistas em acidente de trânsito Valdir Florenzo e Ventura Martello Filho, da Polícia Civil de São Paulo.
Um vídeo elaborado pelos especialistas apresenta simulação gráfica do acidente e imagens de um carro ultrapassando facilmente um meio-fio da mesma altura do do local onde ocorreu o acidente.
Eles contestam laudo elaborado na época pelo perito Elson Rangel, do Instituto de Criminalística Carlos Éboli, da Polícia Civil do Rio. Segundo Rangel, o carro ziguezagueou e derrapou na pista após bater nos meios-fios.
Em entrevista à Folha, publicada no dia 23 de fevereiro, Elson Rangel estranhou que as fotos do acidente não apresentassem sinais da derrapagem do carro. "É estranho, não tem. Não é preciso ter foto. Eu tenho fé pública", disse o perito.
O vídeo exibido pelo relator aponta que a estilista apresentou fratura do perônio direito por ter freado o carro no momento do impacto. Isso mostra que ela não estava adormecida no momento da colisão.
Esses fatos levaram a comissão a retificar decisão anterior sobre o caso. Em agosto passado, com o apoio do relator, a comissão havia rejeitado por 5 votos a 2 o pedido apresentado pela família por falta de provas que apontassem o envolvimento de agentes públicos na morte da estilista.
O caso da estilista foi desempatado pelo voto do presidente da comissão, Miguel Reale Júnior. Para ele, ficou caracterizado que a estilista morreu por ação de agentes do Estado.



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