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O judeu Siegfried quase foi preso, acusado de "divulgar o idioma dos nazistas" no Brasil
Censura achou que iídiche era alemão
da Reportagem Local
As restrições que o Estado Novo impôs aos refugiados judeus
geraram, às vezes, episódios tragicômicos. Francisco Gotthilf,
74, que nasceu na Alemanha e
vive no Brasil desde 1938, conta
um caso.
Durante a Segunda Guerra, seu
pai, Siegfried, trabalhava na rádio Tupi, de São Paulo. Produzia
o programa diário "Hora Israelita", que costumava tocar músicas com letras em iídiche, língua falada por judeus da Europa.
Em 1943, agentes da Censura o
chamaram para depor. Ameaçaram prendê-lo sob a alegação de
estar divulgando "o idioma dos
nazistas" pelo rádio.
Como Siegfried não se expressava bem em português, levou
Francisco para ajudá-lo no interrogatório. O rapaz argumentou,
então, que os censores confundiam o iídiche com o alemão
(línguas de fato semelhantes).
"Foi difícil convencê-los, porque naquela época havia muita
ignorância sobre a cultura judaica", relembra.
Siegfried acabou se livrando da
cadeia Ämas, escaldado, tomou
uma providência: daquele dia
até o fim da guerra, o "Hora Israelita" dispensaria as músicas
com letras e só tocaria composições instrumentais.
Escoteiros
Nada podia ser mais absurdo
do que acusar os Gotthilf de propaganda nazista.
Por causa da política anti-semita do Terceiro Reich, Siegfried, a mulher e o filho único
abandonaram a Alemanha, deixando para trás uma empresa de
transporte com 60 funcionários,
uma conta bancária e um prédio
de quatro andares.
Nos primeiros tempos de São
Paulo, tiveram de se amontoar
em um pequeno quarto alugado.
"Desde o princípio", diz Francisco, "procurei me integrar à
vida brasileira."
Entre 1942 e 1950, chefiou um
grupo de escoteiros na cidade,
formado por jovens judeus. O
desejo de integração era tanto
que os garotos batizaram a companhia com um nome indígena:
Avanhandava.
Hoje, Francisco produz e apresenta o programa "Mosaico na
TV", que a CNT/Gazeta exibe
todos os domingos e que se destina à comunidade judaica.
(AA)
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