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GOVERNO PETISTA
Futuro ministro admite "adequar" leis para reforma agrária avançar
Rossetto vê "fronteira clara" entre novo governo e MST
Alan Marques - 23.dez.02/Folha Imagem
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Miguel Rossetto, futuro ministro do Desenvolvimento Agrário e atual vice-governador gaúcho |
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Único integrante da esquerda
petista no primeiro escalão do governo, o sindicalista Miguel Rossetto, 42 anos, ignora as críticas
que sofreu de produtores rurais,
tem pouca experiência na área em
que vai atuar e vê no diálogo e no
apoio à agricultura familiar os caminhos para conseguir dar terra e
trabalho no campo a quem reivindica e, até "por ética e exigência
constitucional", deve ter seu lote.
Vice-governador do Rio Grande do Sul e integrante da Democracia Socialista, corrente da ala
mais radical petista, ele ainda não
tem opinião formada sobre a medida provisória que exclui do programa de assentamentos as famílias que ocuparam terras.
Rossetto espera uma "mudança
fundamental" no relacionamento
do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) com o
novo governo, do radicalismo e
embates para o diálogo. Ele baseia
suas expectativas na história do
presidente eleito, Luiz Inácio Lula
da Silva, que teria um compromisso de vida e programático
com a reforma agrária.
Quanto ao chamado "gauchério", a forte presença de ministros
do Rio Grande do Sul, ele desconversa. "Os paulistas são infinitamente superiores...".
Depois de uma rápida pausa para o Natal com a família, Rossetto
retorna hoje a Brasília para analisar as informações produzidas
pela equipe de transição -do que
irá surgir até uma reestruturação
do ministério- e conversar com
o futuro ministro da Agricultura,
Roberto Rodrigues.
Ao contrário de Rossetto, Rodrigues foi aplaudido pelos produtores rurais. Mas o novo ministro do Desenvolvimento Agrário
ignora as críticas.
Rossetto diz que pretende firmar seu trabalho economizando
com eficiência de gestão e acredita que, na base do diálogo, será
possível construir, em nome de
um projeto pelo país, as bases da
reforma agrária.
A seguir, trechos da entrevista
concedida à Folha.
Folha - Ao anunciar o seu nome, o
presidente eleito, Luiz Inácio Lula
da Silva, disse que o senhor seria
ministro para realizar um sonho: a
reforma agrária. Qual sua experiência na área?
Rossetto- A experiência mais
forte que eu tenho diretamente,
além de acompanhar o movimento por conta da ação sindical que
tive na CUT [Central Única dos
Trabalhadores], foi no nosso governo [de Olívio Dutra, no Rio
Grande do Sul]. Temos experiências que são referenciais. Assentamos mais de 6.000 famílias.
Folha - Mas a meta era de 10 mil
famílias.
Rossetto- Isso. Mas eu vou te dizer por que 6.000 famílias, que é
uma marca histórica no Estado.
Os Estados não dispõem de instituições para produzir esse tipo de
política. Os instrumentos são da
União. Mas não só nós avançamos na democratização do acesso
à terra, na constituição de assentamentos que estão produzindo, e
bem, como construímos -e
achamos que isso é fundamental- toda uma infra-estrutura,
como habitação, saneamento, estradas, energia elétrica, capacitação técnica, custeio e, principalmente, conseguimos o envolvimento com as comunidades.
Avançamos, e isso é uma pauta
nacional, nas áreas dos quilombolas, nas comunidades indígenas,
onde temos ainda um contencioso muito importante.
Folha - O MST vai tratar o presidente Lula como tratou Fernando
Henrique Cardoso?
Rossetto- É evidente que há uma
mudança fundamental. O presidente Lula tem na sua história, no
seu programa [de governo], um
compromisso com a reforma
agrária, com o respeito aos trabalhadores e trabalhadoras do campo. É evidente que a minha expectativa é de uma relação política
claramente diferenciada e positiva. Agora, nós sabemos que há
uma fronteira clara entre governo
e movimentos.
Governos respondem pelo conjunto da sociedade, por exigências e limites legais e constitucionais. Movimentos guardam sua
autonomia e independência. Minha expectativa é que nós possamos, com o conjunto dos movimentos sociais, com todos aqueles que compreendem a importância da construção da paz no
campo a partir de uma democratização do acesso à terra, ao trabalho e à renda, possamos construir
e preservar uma grande unidade
de trabalho.
Folha - Seu nome mal foi anunciado e, como primeiros efeitos, houve elogios do MST e críticas dos
produtores rurais.
Rossetto- Eu te confesso que
não li nem acompanhei as críticas. Tenho dito que a reforma
agrária e o fortalecimento da agricultura familiar interessam ao
país, à sociedade brasileira. Acho
lamentável... Além de ser uma
exigência constitucional, [a reforma agrária] é uma exigência ética.
Nós temos que entrar no século 21
deixando para trás o que, infelizmente, nos acompanha desde o
século 18. Um país que queira virar nação, que respeite o seu povo,
não pode deixar tanta gente para
trás. Vamos avançar na reforma
agrária neste país, fortalecer a
agricultura familiar e construir a
paz no campo, com justiça e dignidade.
Folha - O sr. vai pedir a revogação
da medida provisória que exclui
por dois anos da reforma agrária as
famílias que invadiram terras?
Rossetto - Eu pedi para a equipe
de transição fazer um agregado de
toda a legislação desse último período em relação ao tema terra. O
sentido é que nós possamos aproveitar toda a legislação existente e
adequá-la a partir de uma diretriz
clara: responder a uma expectativa do povo brasileiro de que a reforma agrária avance positivamente, garantindo terra para
quem quer trabalhar. Isso significa assentar, dar crédito, assistência técnica, garantir a comercialização, incentivar cooperativismo
-faz bem à sociedade, ao campo,
à nossa economia.
Folha - Pelas suas respostas, haverá muito apoio à agricultura familiar.
Rossetto- Muito, muito. O Pronaf [Programa Nacional de Apoio
à Agricultura Familiar] será ampliado. Na verdade, esse é um
programa que se constitui basicamente de linhas de crédito. Vamos ampliá-lo com assistência
técnica. Teremos uma forte orientação e estímulo ao associativismo e ao cooperativismo. Precisamos criar mecanismos de comercialização. Nosso projeto estratégico [da reforma agrária] é intimamente ligado ao projeto Fome
Zero [de combate à fome, prioridade do novo governo]. E essa estratégia de fortalecimento da agricultura familiar dialoga com um
projeto de desenvolvimento geral
do país.
Folha - O ano é anunciadamente
de restrições. Quais suas expectativas de obter recursos para fazer
seu sonho virar realidade?
Rossetto- Eu não tenho essas informações. O Palocci vai nos informar na reunião [ministerial]
do dia 27, para todo mundo estar
avisado antes que assuma... [risos] Sabemos que vamos conviver com restrições, mas numa
perspectiva de superação. Aposto
muito numa eficiência de gestão
para avançarmos mesmo neste
primeiro ano.
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