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ARTIGO
Fé e má-fé
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
AS AÇÕES que o empresário Edir Macedo -direta
ou indiretamente- inspirou contra a Folha e contra
Elvira Lobato não constituem
tentativa de atentado contra a
liberdade de imprensa. Ofendem, porém, princípios básicos
do direito processual e constitucional. Mostram, ainda, grave descompasso com as funções da inteligência, brinde de
Deus aos seres humanos, ou,
pelo menos, à maioria deles.
Comecemos pela não intimidade com o direito, em duas
partes. Quem tenha sugerido
dezenas de ações separadas, em
comarcas diversas, trazendo
petições iguais ou assemelhadas, descuidou-se da leitura das
leis do processo. A cumulação
de ações no mesmo juízo, que
os autores não quiseram, também pode ser requerida pelos
réus, como preliminar de suas
alegações gerais. O artigo 292
do Código de Processo Civil refere hipóteses da admissibilidade da cumulação em um só juízo. No mesmo código, o artigo
103 reputa conexas -e assim
devem ser processadas num só
juízo- duas ou mais ações cujo
objeto ou a causa de pedir sejam as mesmas. É o caso típico
dos processos aqui referidos. A
segunda parte vem da jurisprudência sintetizada nas súmulas
37 e 227 do STJ (Superior Tribunal de Justiça): afirmam a
cumulabilidade de ações como
as aqui referidas, a permitir a
unificação dos processos.
O uso inadequado da inteligência obriga a pensar no que
teria inspirado os próceres dos
autores a pensarem no esquema da avalanche de pedidos.
Tentativa de atemorizar o jornal e a jornalista? Criar problemas funcionais para a defesa?
Cercear a liberdade de expressão? Nesta última alternativa a
inadequação teria ido ao absurdo de admitir que a essencial liberdade de culto também poderia sofrer a mesma ameaça,
sem dizer que o artigo 220 da
Carta, em seu parágrafo 2º,
proíbe qualquer censura à divulgação jornalística, sob qualquer forma.
Por último: a questão nada
tem de religiosa ou com sua liberdade de culto. Vincula-se a
interesses comerciais, na luta
que o empresário Edir Macedo
move para ampliar sua presença no mercado das faixas publicitárias da televisão, o que é direito dele. Não assim para a opção adotada (engajamento de
fiéis) para as ações, carregada
de discriminação e de preconceito, quando o principal interessado se oculta por trás de
terceiros em conduta que as
leis do processo e as eternas
podem caracterizar como conduta de má-fé. Má-fé.
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