São Paulo, Quinta-feira, 27 de Maio de 1999
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JANIO DE FREITAS
"Tripas expostas"

Gravação de tráfico de influência no Planalto, contratações ilegais no Projeto Sivam, Proer e favorecimento aos então donos do Banco Nacional, compra de votos parlamentares para a reeleição, primeiras revelações do grampo no BNDES, ""ajuda" do Banco Central ao Marka e ao FonteCindam, segundas revelações do grampo comprometendo o próprio presidente -a lista é vasta.
Uma após outra, as tantas CPIs possíveis, ou necessárias, no governo Fernando Henrique Cardoso têm sido evitadas por interesses políticos de lideranças partidárias, e não porque seja consensual a insuficiência de motivos para instalar os inquéritos. Cada um desses episódios, porém, custou a Fernando Henrique um pedaço substancioso da imagem com que compensava, em boa parte, sua inoperância como presidente.
A divulgação da sua interferência em manobras comprometedoras da privatização é mais um caso em que evitar a CPI não evita os efeitos deletérios do escândalo. Mas, já indicavam as pesquisas de opinião pública, não há mais parcelas positivas da imagem, com as quais compensar o novo desgaste.
As lideranças partidárias fortes querem, é claro, os seus partidos utilizando-se do organismo do governo, com propósitos eleitorais. Mas nenhuma se lançaria na recuperação de Fernando Henrique. Fazê-lo seria fortalecer projetos eleitorais alheios, a começar do que o PSDB, um fantoche sob o rótulo de partido, ganharia com a transfusão que o Fernando Henrique recuperado lhe faria.
Assim como Fernando Henrique é um presidente que não sabe governar, o governo é um aglomerado sem movimento. Leves indícios de vida há só no Ministério da Saúde, menos por vida ativa que pela vivacidade de José Serra. O governo, portanto, não é uma força, nem sequer um instrumento precário, que possa mudar o panorama de terra arrasada.
Sobre o chão calcinado algumas figuras vão crescer mais. Antonio Carlos Magalhães, Jader Barbalho, Michel Temer, Mário Covas, que não pode perder terreno, é possível que Itamar Franco, é certo que mais alguns. Ainda que nem a eles convenha tanta antecipação, estão forçados pela evaporação de Fernando Henrique a funcionar já e só com vista à sucessão presidencial. O Brasil precisa desesperadamente de governo, terá política.
O país não teve ""suas tripas expostas por CPIs", na expressão de Fernando Henrique, no seu melhor estilo. Mas paga, como se tivesse. Porque a Presidência e o governo acabaram tendo suas ""tripas expostas" pela falta de condições morais para encarar qualquer das CPIs possíveis, ou necessárias.


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