São Paulo, quarta-feira, 27 de outubro de 2004

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ECOS DO REGIME

Decreto de FHC será revisto com cautela, diz Nilmário Miranda

Governo quer abrir arquivos sigilosos, mas "sem pressa"

FERNANDA KRAKOVICS
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Nilmário Miranda (Direitos Humanos) afirmou ontem que o governo vai rever o decreto editado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que ampliou o prazo de indisponibilidade de documentos oficiais considerados sigilosos. Segundo ele, a abertura dos arquivos, no entanto, será feita "sem pressa".
A Folha apurou que as resistências à abertura de arquivos oficiais no Itamaraty são tão grandes -ou mesmo maiores- que as nas Forças Armadas. Esse quadro foi exposto anteontem pelo ministro José Dirceu (Casa Civil) em reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministros.
Ao dizer que julgava "razoável" rever o decreto de FHC, o que permitiria a abertura de alguns documentos sobre a ditadura militar (1964-1985), Dirceu citou as resistências nos meios diplomáticos. Exemplos: ações "heterodoxas" no passado ao discutir fronteiras com países vizinhos e uma disputa comercial com os EUA que, se revelada, mostraria suposto suborno de importantes autoridades brasileiras no passado.
Em 2002, a quatro dias do término de seu mandato, FHC assinou um decreto ampliando o sigilo de documentos ultra-secretos de 30 anos para 50 anos, prorrogáveis indefinidamente, "de acordo com o interesse da segurança da sociedade e do Estado".
"O governo vai reexaminar o decreto [de FHC], mas dentro dos parâmetros já colocados pelo presidente, com a cautela de não provocar ressentimentos, crises políticas nem militares. O país não precisa passar por nada disso. Podemos avançar de forma tranqüila, mas isso depende de muitos arranjos, muitos acordos. Há disposição de discutir o decreto, protegendo o sigilo de Estado, mas também avançando no resgate histórico daquele período", afirmou Nilmário ontem, após audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Depois o ministro explicou melhor o que deve ser feito: "O decreto tem que ser revisto, então é rediscutir prazos [para a divulgação] e o modo de classificação dos documentos, preservando segredos de Estado mas, ao mesmo tempo, permitindo avanços". Segundo ele, não há estimativa para a abertura dos arquivos.
Além de Dirceu, o ministro Luiz Dulci (Secretaria Geral) defendeu na reunião com Lula uma alteração do decreto. O presidente, porém, quer fazê-la quando baixar a poeira gerada pela publicação de fotos que foram divulgadas como sendo do jornalista Vladimir Herzog, morto pela ditadura em 1975. Segundo arquivo do governo, as fotos não são dele, mas de um padre espionado pelos militares.
A divulgação das fotos provocou uma crise devido à reação do Exército, que soltou uma nota defendendo a prática da tortura durante o regime militar. Pressionado pelo presidente, o comando do Exército reescreveu a nota e lamentou a morte de Herzog.
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados deve ouvir hoje o cabo reformado José Alves Firmino, fonte das fotos publicadas pela imprensa. Ele deverá apresentar uma série de documentos para confirmar a atuação de arapongas no início e meados da década de 90.
A modificação legal para abrir arquivos pode ser feita por decreto presidencial ou por projeto no Congresso que já trate do tema.


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