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Filme omite episódios da vida de Lula
Livro "Lula, O Filho do Brasil", que inspirou produção, revela episódios polêmicos da vida do presidente que não aparecem na tela
Diretor e corroteirista dizem que fita seria muito longa se todos os fatos narrados em livro fossem abordados; DVD terá quase três horas
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A RECIFE
Em trechos de "Lula, O Filho
do Brasil", imagens de cinejornais e de reportagens de TV da
época se misturam à ficção. Cenas gravadas para o filme foram
digitalmente retocadas para
parecer antigas. Principalmente no terço final, centrado na fase sindical do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, o espectador é convidado a ver "a realidade" tal qual ela ocorreu.
Contudo, a comparação entre o filme e o livro homônimo
que o baseou revela o sumiço de
episódios que poderiam empanar o brilho do personagem heroico construído pelo roteiro.
Por outro lado, fatos que poderiam tornar Lula mais simpático aos olhos da plateia também foram retirados. Os realizadores do filme dizem que não
queriam ser acusados de "exagerar a realidade".
Sindicalismo
O livro conta uma ameaça de
Lula de cortar a assistência médica dos operários que não aparecessem para votar numa assembleia, a revelação de que
quem escrevia os discursos dos
líderes sindicais, incluindo o da
posse de Lula no sindicato em
1975, era o advogado Maurício
Soares e a informação de que
ele já lançara a ideia de um partido político em 1978, logo após
as primeiras greves -o que indica suas ambições político-partidárias dois anos antes da
criação do PT.
Em outro episódio, mais prosaico, Lula poderia ser acusado
de abuso no desempenho de
sua função no sindicato. No livro, Marisa reconhece que, a
princípio, teve "muita bronca"
de Lula, pois ele, interessado
em namorá-la, segurou um documento sem o qual ela não
conseguia receber o dinheiro
de sua pensão de viúva.
A liberação da pensão, que
em outro sindicato já havia sido
feita sem entraves, demorou de
três a quatro dias nas mãos de
Lula. No filme, Lula aparece
ajudando Marisa a resolver o
problema no mesmo dia.
A perseguição a Lula pela ditadura também é narrada -ele
foi preso, cassado da presidência do sindicato e teve seu irmão torturado- sem a informação de que ele se reuniu com
o general Dilermando Monteiro, então comandante do 2º
Exército, logo após as greves de
1978. A reunião é narrada por
Lula no livro: "Ele [general] me
tratou muito bem, foram quase
três horas de conversa. Foi uma
coisa muito interessante".
Para o sindicalista Paulo Vidal (retratado no filme de forma caricatural e com outro nome, "Feitosa"), que presidiu o
sindicato entre 1969 e 1975, Lula foi "pedir a bênção" do regime na reunião com o general,
quando teria explicado que não
queria se aliar aos comunistas
para derrubar a ditadura.
A intensa tortura, com choques elétricos e pau-de-arara,
sofrida por Frei Chico na prisão
do Exército, por exemplo, não é
mostrada -na fita ele é preso e
reaparece com problemas de
movimentação nos braços,
num almoço em família.
Filho hostilizado
Os efeitos da ditadura sobre
um filho do primeiro casamento de Marisa, um dos pontos
mais fortes do relato que ela
prestou para o livro, também
sumiram do filme. Marisa contou que quando Lula foi preso
pela ditadura, em 1980, o filho
Marcos, então com 9 anos, foi
hostilizado, ofendido e perseguido até mesmo por sua professora primária, que era contrária aos operários.
"Ele foi muito torturado.
Quando eu descobri, o tirei da
escola", narrou Marisa.
O diretor do filme, Fábio Barreto, e a corroteirista, Denise
Paraná -jornalista autora do
livro-, disseram que, caso filmassem lacunas apontadas pela Folha, que assistiu ao filme
no último dia 19, em Recife
(PE), a fita ficaria muito longa.
O filme tem duas horas e oito
minutos. Para eles, os episódios mais importantes foram
abordados. Barreto disse que a
versão do filme em DVD deverá ter duas horas e 50 minutos
de duração, e que "na montagem definitiva e integral, teria
3 horas e dez minutos". "Minha
vontade era ter uma mídia que
me permitisse colocar mais
coisa da vida não só dele [Lula],
como do movimento sindical,
do operariado do ABC", disse.
O livro foi escrito por Denise
nos anos 90 e relançado em
2002 pela Editora Fundação
Perseu Abramo, entidade criada e mantida pelo PT. Denise
foi assessora de Lula por dois
anos e se declara amiga dele e
de sua família.
Na linha da "história oral", o
cerne do livro é a transcrição literal de depoimentos prestados nos anos 90 por Lula, seus
irmãos, um amigo e Marisa.
Embora não contraponha as
versões nem verifique a exatidão dos relatos, o livro trouxe à
tona episódios da vida do presidente que formam um rico painel do que as pessoas mais próximas de Lula, e ele próprio, viveram ou julgaram ter vivido
entre 1945 e 1980.
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