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Impasse de Seattle indica risco de decadência da OMC
DO ENVIADO ESPECIAL A DAVOS
A OMC (Organização Mundial
do Comércio) corre o risco de desintegração se não conseguir, ainda este ano, superar os impasses
que levaram ao colapso a sua mais
recente conferência ministerial,
realizada em Seattle, entre novembro e dezembro de 1999.
O alerta foi lançado ontem pelo
ministro do Comércio da África
do Sul, Alec Erwin, um dos mais
experientes negociadores de comércio internacional, em uma
sessão do Fórum Econômico
Mundial dedicada exatamente ao
futuro da organização que faz o
papel de, ao mesmo tempo, xerife
e juiz do sistema comercial planetário.
Por mais que o ministro europeu do Comércio, o francês Pascal
Lamy, tenha dito que, sim, a OMC
tem futuro, o ambiente estava
mais para velório, de resto preparado por comunicado conjunto
de todos os três ex-diretores-gerais da organização em que se
afirma que o sistema "corre perigo".
Desastroso
O ministro sul-africano acrescentou que a "desintegração" da
OMC, por ele antevista, seria "desastrosa". É uma opinião certamente compartilhada pela diplomacia brasileira, que sempre
apostou todas as suas fichas nas
negociações comerciais multilaterais, as quais só podem se dar no
âmbito da Organização Mundial
do Comércio.
A razão é simples: em negociações globais, o Brasil pode aliar-se
a outros países para extrair concessões dos países desenvolvidos,
o que se torna mais complicado se
a negociação é bilateral.
Os riscos
O risco de desintegração se deve, basicamente, a dois fatores:
1 - Os países em desenvolvimento, obviamente a esmagadora
maioria dos membros da OMC,
consideram que os acordos comerciais acertados na Rodada
Uruguai (negociações comerciais
entre 1986 e 1994, que precederam
a OMC) são desequilibrados. Favorecem mais os ricos que os pobres.
Martin Khor, diretor da Organização Não-Governamental "Rede
do Terceiro Mundo", da Malásia,
diz, com razão, que os acordos levaram a um aumento das importações dos países em desenvolvimento, sem o correspondente incremento nas exportações (o Brasil é, aliás, um bom exemplo).
2 - A crescente desconfiança da
opinião pública, tanto nos países
ricos como pobres, sobre o papel
e o desempenho de organizações
como a OMC. "Há um desencanto público e político com as instituições internacionais", admitem
os três ex-diretores-gerais da Organização Mundial do Comércio
em seu comunicado de ontem.
Foi esse desencanto que serviu
de combustível para as espetaculares manifestações de protesto
que incendiaram Seattle (nos Estados Unidos), quando da 3ª Conferência Ministerial da OMC (seu
órgão supremo).
A 4ª Conferência está em princípio livre desse cerco. Ficou marcada ontem para entre 5 e 9 de novembro no Qatar, país árabe que
impõe severas restrições não só à
entrada de estrangeiros em seu
território como ao direito de manifestação.
Mas não está livre dos desacordos entre os grandes atores da cena internacional, que não foram
minimamente desatados no ano e
pouco decorrido desde Seattle.
O único eventual avanço será
anunciado no fim do mês que
vem. Ontem, Pascal Lamy, o ministro europeu, disse que, até lá, a
União Européia anunciará os resultados do que chama de "revisita" às posições que levou para
Seattle.
Entre elas, o que o jargão diplomático chama de "acesso a mercado", ou seja, a derrubada de
barreiras às importações. São exatamente as barreiras européias no
campo agrícola o alvo da maior
pressão do governo brasileiro, a
ponto de o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, ter dito a
seu colega Lamy que, se as barreiras não forem desmontadas, o governo brasileiro se somaria às manifestações de protesto contra a
OMC.
(CLÓVIS ROSSI)
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