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São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 2003

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ELIO GASPARI

Com jeito, Lula faz um grande acordo

É possível que Lula esteja a um passo da maior oportunidade política de sua carreira e o Brasil, perto de um dos melhores momentos de sua política externa. Há espaço para que se consiga um surpreendente acordo com os Estados Unidos e as instituições internacionais de crédito, capaz de reestruturar as economias latino-americanas. Pelo lado americano, uma repetição da oportunidade que o secretário de Estado John Foster Dulles jogou fora nos anos 50, quando sabotou a Operação Pan-Americana de Juscelino Kubitschek. Pelo lado brasileiro, uma repetição da oportunidade que o sectarismo esquerdista jogou nágua nos 60, sabotando a Aliança para o Progresso, de John Kennedy.
Pelas lentes do catastrofismo, os Estados Unidos são presididos por um ignorante pronto para demonstrar algum tipo de antipatia por um esquerdista barbudo que ousou chamá-lo de companheiro. Até amigo de Fidel Castro ele é. Pelas lentes dos incríveis acontecimentos que se seguiram à posse de Lula, o esquerdista barbudo pagou juros de 26,5%, aumentou o arrocho do superávit primário, repetiu que a responsabilidade pelas mazelas brasileiras é dos brasileiros e, se isso fosse pouco, tudo indica que expurgará seu partido.
Se Carlos Menem tivesse ganho a eleição argentina, tudo o que Lula fizesse seria pouco. Com Néstor Kirchner, a conversa é outra. Houve uma época em que se pensou numa América Latina personificada num concessionário de Coca-Cola com botas de vaqueiro. Algo como Vicente Fox, o atual presidente do México. Deu errado. A maior vitória dos Estados Unidos, do FMI e do Banco Mundial na América Latina chama-se Lula. Goste-se ou não dessa situação, é provável que Lula ainda seja uma esperança da esquerda, mas é certo que a cada dia ele se torna a verdadeira esperança da direita cosmopolita (nada a ver com grileiros do Pontal do Paranapanema e os empresários inadimplentes das confederações patronais).
Lula tem a oportunidade de mostrar a Bush, ao FMI e ao Banco Mundial (nesta ordem) que seu governo é a verdadeira prova do pudim para a transformação da América Latina numa verdadeira economia de mercado.
Se ele conseguir crescimento, ganham todos. Se prosseguir na estagnação que herdou, com mais desemprego e mais aviltamento do trabalho, perdem todos.
A oportunidade de Lula e de sua política externa está em ir buscar um acordo que abra espaço para o crescimento da economia brasileira de forma que se possa dizer: com a ajuda do governo americano, do FMI e do Banco Mundial, fez-se no Brasil uma experiência desenvolvimentista. Fez-se, por exemplo, o que se faz com a economia americana. Bush não está enfrentando o risco de recessão com a receita do "governor" Henrique Meirelles. Faz justo o oposto: expande as despesas.
A Casa Branca e o FMI não precisam que o Brasil fique preso numa armaldilha de meia dúzia de especuladores. Em 1989, o pai do atual presidente americano percebeu que a América Latina não devia continuar presa na gaiola da banca e desceu o Plano Brady goela abaixo de Wall Street. (John Reed, o presidente do Citi jamais esqueceu o volume da voz do secretário do Tesouro num telefonema que ele lhe deu, de Paris, dizendo-lhe para fechar um acordo com os mexicanos.)
O caminho para o entendimento é estreito, mas existe. As possibilidades de uma coisa dessas dar certo são maiores que as de um vendedor de tapioca do cais santista ocupar a presidencia da República e, nela, vir a defender uma taxa de juros de 26,5% ao ano.


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