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JANIO DE FREITAS
À margem da lei
Fosse um único delegado da
Polícia Federal a cometer
uma ilegalidade, seria possível
admitir a ocorrência de um fato
sem propósitos definidos. São
vários, porém, os delegados da
PF que agiram em comum para
o mesmo fim. Nem se sabe ao
certo quantos são, citados já
quatro ou cinco, além de um escrivão.
A ação combinada e repleta de
ilegalidades deliberadas recaiu
sobre um candidato à Presidência da República, concorrente
previstamente principal do candidato do governo. E, desenvolvendo-se há um ano e sete meses, só foi sustada anteontem
porque descoberta. A falsidade
de sua motivação é óbvia: se verdadeira, a Polícia Federal estaria levando já mais de ano e
meio para descobrir se o candidato de oposição teria imóveis
em nome de terceiros. Mesmo
para a PF, seria um exagero de
incompetência policial.
O ministro da Justiça, Miguel
Reale Jr., determinou um procedimento administrativo para
apurar um dos pontos de partida das ações ilegais da PF: o uso
indevido do nome e da autoridade da CPI do Narcotráfico por
delegado, para criar a "justificativa" de investigações contra
Luiz Inácio Lula da Silva. Mas a
criação de um documento falsamente atribuído a uma seção do
Congresso Nacional é definível
como ato de falsidade ideológica. E falsidade ideológica é crime. Logo, caso de inquérito criminal.
O mesmo se dá com a alegação
para o pedido de escuta telefônica em mais de 40 aparelhos de
Santo André. No caso da CPI, a
providência ministerial seguiu-se a pedido do presidente daquela comissão, deputado Magno
Malta. No caso de Santo André,
a falta de pedido e de providência faz supor que o ministro continua convicto de que as falsificações de documento e de motivos, por parte da Polícia Federal,
são "cavalo de batalha do PT
para encobrir as irregularidades
na Prefeitura de Santo André"
-as quais, por sinal, não têm
que ser protegidas por sigilo na
CPI da Câmara Municipal.
Mas quem pode investigar as
práticas na PF, sem suscitar suspeitas, justificadas, de desvios
por espírito de corporação? A
Constituição responde: "São
funções institucionais do Ministério Público: (VII) exercer o
controle externo da atividade
policial. Mas o Ministério Público Federal está sob a direção do
procurador-geral Geraldo Brindeiro, que não tem a seu crédito
qualquer iniciativa para fazer
respeitada aquela determinação
constitucional.
Com isso, a Polícia Federal se
permite, há anos, praticar à vontade o que chama de IPP, que
vem a ser Investigação Policial
Preliminar. É o procedimento
adotado contra o candidato Lula da Silva. E nada faz crer que
não esteja adotado contra Ciro
Gomes e contra Anthony Garotinho. Trata-se, no entanto, de
procedimento ilegal e perigosíssimo para os cidadãos.
O IPP transcorre nas sombras
e em silêncio, para que dele não
tomem conhecimento o Ministério Público e os magistrados. Pode estender-se por quanto tempo
seus praticantes queiram e, como não está regido pelas normas regulares e legais, presta-se
a todo tipo de arbitrariedade. Se
assim quiser um policial ou um
grupo deles, pode prestar-se inclusive a extorsões, a partir de
um inquérito que inexiste oficialmente até para a própria PF.
A legislação e o Código de Processo Penal exigem que as investigações se façam sob a forma de
inquéritos, para evitar que práticas policiais fora da lei sujeitem os cidadãos, candidatos ou
não, aos atos típicos de estados
policiais. Como o de espionar e
investigar, sob motivações falsificadas, a vida de uma pessoa
por um ano e sete meses, sem
que a vítima, o Ministério da
Justiça, o Ministério Público e o
Judiciário tenham, ao menos,
conhecimento.
No Rio houve um bandido,
Lúcio Flávio Villar Lírio, famoso
pela inteligência e por certas posições, que adotava este refrão:
"Polícia é polícia, bandido é
bandido". Bons tempos, aqueles.
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