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Dilma contrata laudos que negam autenticidade de ficha
Imagem ilustrava reportagem da Folha; peritos não se basearam no jornal impresso
Professores compararam imagens reproduzidas pela internet com papéis do Arquivo Público; Folha reconheceu
que ficha chegou por e-mail
DA REPORTAGEM LOCAL
A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, encaminhou à
Folha dois laudos técnicos, por
ela custeados, que apontaram
"manipulações tipográficas" e
"fabricação digital" em uma ficha reproduzida pela Folha na
edição do último dia 5 de abril.
A ficha contém dados e foto
de Dilma e lista ações armadas
feitas por organizações de esquerda nas quais a ministra militou nos anos 60. Dilma nega
ter participado dessas ações. A
imagem foi publicada pela Folha com a seguinte legenda:
"Ficha de Dilma após ser presa
com crimes atribuídos a ela,
mas que ela não cometeu".
O laudo produzido pelos professores do Instituto de Computação da Unicamp (Universidade de Campinas) Siome
Klein Goldenstein e Anderson
Rocha concluiu: "O objeto deste laudo foi digitalmente fabricado, assim como as demais
imagens aqui consideradas. A
foto foi recortada e colada de
uma outra fonte, o texto foi
posteriormente adicionado digitalmente e é improvável que
qualquer objeto tenha sido escaneado no Arquivo Público de
São Paulo antes das manipulações digitais".
O laudo produzido pelo perito Antonio Nuno de Castro
Santa Rosa da Finatec (Fundação de Empreendimentos
Científicos e Tecnológicos), ligada à UnB (Universidade de
Brasília), chega às mesmas
conclusões.
A ministra anexou o laudo da
Unicamp em carta ao ombudsman da Folha. "Diante da prova técnica da falsidade do documento, solicito providências
no sentido de que seja prestada
informação clara e precisa
acerca da "ficha" fraudulenta,
nas mesmas condições editoriais de publicação da matéria
por meio da qual ela foi amplamente divulgada, em 5 de abril
de 2009", escreveu Dilma.
Em reportagem publicada no
dia 25 de abril, intitulada "Autenticidade de ficha de Dilma
não é provada", a Folha reconheceu ter cometido dois erros
na reportagem original. O primeiro foi afirmar, na Primeira
Página, que a origem da ficha
era "o arquivo [do] Dops". Na
verdade, o jornal recebera a
imagem por e-mail. O segundo
foi tratar como verdadeira uma
ficha cuja autenticidade não
podia ser assegurada, bem como não podia ser descartada.
O jornal também publicou
um Erramos com os mesmos
esclarecimentos. A ministra se
disse insatisfeita, questionou a
nova reportagem e decidiu
contratar um parecer técnico.
Para a análise, os professores
descartaram a imagem da ficha
reproduzida pela Folha em sua
edição impressa. Captaram na
internet cinco imagens "com
conteúdo similar ao utilizado
pelo jornal Folha de S.Paulo".
Dentre elas, escolheram como
"objeto do laudo" a imagem divulgada no blog do jornalista
Luiz Carlos Azenha, que reproduz artigos que criticam o jornal e questionam a autenticidade da ficha.
Para os peritos, a imagem do
blog era a que tinha "a maior riqueza de detalhes". Goldenstein disse à Folha que "todas as
imagens são de uma mesma família" e que a qualidade da
imagem publicada pelo jornal
não é boa o suficiente para
"análise nenhuma".
Os professores compararam
a imagem com documentos
reais que supostamente teriam
alguma semelhança (papel, caracteres) com a ficha questionada. Trata-se de cópias de fichas de presos pela ditadura,
hoje abrigadas no Arquivo Público paulista. Escolheram as
produzidas entre 1967 e 1969.
Contudo, no Erramos e na
reportagem publicados no final
de abril, a Folha havia explicado que a origem da ficha não
era o Arquivo Público. A imagem não é datada -relaciona
eventos ocorridos entre 1967 e
1969, mas pode ter sido produzida em data posterior.
Para concluir que a fotografia foi "recortada e colada", os
professores compararam a foto
de Dilma com fotos que encontraram no mesmo arquivo. A ficha questionada não informa
que a foto de Dilma foi obtida
naquele arquivo.
Sobre a impressão digital
contida na ficha, os peritos
apontaram não ser possível nenhuma conclusão, devido à baixa qualidade da imagem.
Crimes negados
Ouvido pela Folha na última
quinta-feira, Goldenstein disse
que não leu o blog do jornalista
em que captou a imagem analisada e tampouco a reportagem
original da Folha. "Não estou
criticando o que a Folha fez.
Vou ser bem sincero, eu nem li
a reportagem original da Folha. Não cabe a mim julgar absolutamente nada. Meu papel é
analisar essas imagens digitais
que estão circulando na internet. O que a ministra me pediu:
"É possível verificar, é possível
um laudo sobre a autenticidade/origem da imagem? É possível dizer se vieram ou não do
Arquivo Público?"."
Doutor em ciência da computação pela Universidade de
Pennsylvania (EUA), ele diz
que foi o primeiro laudo externo que produziu em sua carreira. A ficha questionada era uma
das imagens que ilustrava a reportagem original cujo título
foi: "Grupo de Dilma planejou
sequestro de Delfim Netto".
Na carta à Folha, Dilma escreveu: "Reitero que jamais fui
investigada, denunciada ou
processada pelos atos mencionados nesse documento falso e
de procedência inidônea, ao
qual não se pode emprestar nenhuma credibilidade".
A Folha tem procurado checar a autenticidade da ficha.
Foram contatados três peritos
de larga experiência na análise
de documentos e um especialista em imagens digitais.
Todos disseram que teriam
dificuldades em emitir um laudo, pois necessitavam do original da ficha, que nunca esteve
em poder da reportagem. Disseram que a análise de uma
imagem contida num e-mail
não seria suficiente para identificar uma eventual fraude.
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