São Paulo, Segunda-feira, 28 de Junho de 1999
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"ACM é sujo como pau de galinheiro", afirma Ciro

MÔNICA BERGAMO
da Reportagem Local

Com 16% das intenções de voto para presidente,
de acordo com a última pesquisa Datafolha, atrás apenas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro Gomes (PPS) está viajando o Brasil em campanha eleitoral. Na sexta-feira, 25, ele esteve em São Paulo para a filiação de três deputados estaduais ao PPS. Num gabinete da Assembléia Legislativa, recebeu a Folha para a seguinte entrevista, concedida ao lado da mãe, Maria José, 71, da tia, Terezinha, 67, e da irmã, Lia, 33:

Folha - A campanha terminou há nove meses e o senhor tem aparecido pouco na imprensa. Como explica estar em segundo lugar na disputa presidencial?
Ciro Gomes
- A mídia precisa de espetáculo para dar visibilidade às pessoas. Uma boa parte dessa mídia, por outro lado, está comprometida com a estratégia de poder. O que estou fazendo? Visitando cinco Estados por semana.

Folha - O senhor não acha que está, na verdade, atraindo a preferência de eleitores descontentes com o governo federal?
Ciro
- O descontentamento poderia se traduzir numa preferência por outras pessoas - Lula (PT), Itamar Franco (PMDB), Garotinho (PDT). O Lula está com 28%, que é o patamar histórico mais baixo do PT. Na pré-campanha de 1994, o Lula chegou a ter 40%. Em 98, chegou a 38%.

Folha - O senhor está atraindo os votos do Lula?
Ciro
- O definhamento do PT é um fato real. O partido está perdendo um pouco o encanto. Já chamei a atenção do pessoal do PT. Se você espremer o discurso, é uma mistura de protesto e ressentimento com promessa social irrealizável. Por outro lado, o processo político, com o Fernando Henrique, se sofisticou. O presidente representa fatores reais de poder: um ideário internacional forte, o setor exportador, a oligarquia parlamentar, o setor financeiro. Ele é orgânico, ao contrário de tudo o que caracterizou o enfrentamento tradicional do PT.

Folha - Ainda assim, parece que o Lula vai ser candidato outra vez.
Ciro
- Basta alguém ficar em segundo lugar contra ele que ganha a eleição. Eu não vou aderir a ele. Acho absolutamente razoável que ele não queira aderir a mim também. O que estou propondo, de novo, é uma ampla convergência de centro-esquerda.

Folha - Mas se ninguém abre mão das respectivas candidaturas, como isso pode acontecer?
Ciro
- Sairíamos pelo Brasil eu, Lula, Miguel Arraes, Leonel Brizola, as dissidências do PMDB e do PSDB. Abriríamos uma dinâmica de seminários regionais, acessíveis a todos os cidadãos, e daí tiraríamos uma grande convergência para políticas de educação, saúde, previdência. As pessoas que participassem desses seminários se inscreveriam no que chamaríamos de diálogo nacional. Em 2001, em eleições primárias, escolheriam o candidato da centro-esquerda para as eleições de 2002.

Folha - O PT correria o risco de abrir mão de ter um candidato?
Ciro
- O Lula concordou totalmente. Pensei que faria reparos, mas não. Conversamos há dois meses em São Paulo, tendo como testemunhas o João Hermmann (deputado federal do PPS) e o José Dirceu (presidente do PT). Ele disse: "Perfeito, vamos fazer".

Folha - O senhor acredita que o presidente da República influirá nas próximas eleições?
Ciro
- Ele vai ser uma companhia constrangedora. No governo, você pode às vezes passar por momentos de impopularidade. Mas ele perdeu a autoridade moral.

Folha - O PSDB consegue ter um candidato forte? Mário Covas, por exemplo?
Ciro
- Se eu for candidato contra ele, será uma disputa de idéias. Se posso fazer delicadamente uma censura, é a de que o Covas não cumpre o papel histórico determinado a ele. Que é, sem romper com Fernando Henrique, marcar posição, marcar um campo.

Folha - Esse papel não caberia também ao governador do Ceará, Tasso Jereissati?
Ciro
- Caberia. Mas não quero melindrá-lo ou ser indelicado. Tenho uma amizade com o Tasso, fraterna, que me dá acesso diário a ele para dizer isso.

Folha - Há notícias de que Tasso e Fernando Henrique estão afastados. Nessa hipótese, seria mais fácil Tasso apoiar a sua candidatura.
Ciro
- O que posso dizer é que adoraria ter o apoio do Tasso, ou então poder apoiá-lo.

Folha - O senhor acha que ele fica ao lado do presidente Fernando Henrique até o fim?
Ciro
- Não sei.

Folha - Como está a relação deles?
Ciro
- Não sei.

Folha - O senhor diz que a candidatura de Antonio Carlos Magalhães à presidência, uma vez confirmada pelo PFL, emborcaria em um mês, pois apareceria todo o tipo de escândalo. Que escândalo?
Ciro
- O escândalo da pasta rosa, que mostra financiamento ilegal do Ângelo Calmon de Sá e do Banco Econômico para a campanha eleitoral dele. O escândalo da sociedade dele com o mesmo Ângelo num banco nas Ilhas Cayman. E outras coisas do passado.

Folha - Ele diz que tem moral inatacável, e que a prova é que só quem tem estatura moral compra as brigas que ele compra.
Ciro
- Não tem. Não aguenta trinta dias de debate. Ele especializou-se em encobrir o abuso com arrogância e grito. Outro dia censurou o presidente do Supremo Tribunal Federal por ter sido nomeado juiz pela ditadura e indicado ao STF pelo Collor. (rindo) Logo ele, Antonio Carlos. Ele pensa que as pessoas são imbecis. Pensa que o silêncio na Bahia diante dos desatinos dele é imbecilidade. Não é. É medo, porque ele controla a polícia, a justiça, a televisão, o jornal, as rádios do interior, dá 24 horas para fulano ir embora do Estado. Só que aqui fora nós não temos medo. Antonio Carlos não compreende a desavença democrática, quer logo destruir as pessoas. É outra coisa que em trinta dias se revela.

Folha - Como assim?
Ciro
- Ele vai "dar" em repórter. Vai tu lá e pergunta para ele: que história é essa aí de OAS, conhecida como Obra Arranjada pelo Sogro? (A empreiteira OAS é do genro de ACM, Cesar Matta Pires). Que negócio é esse de Jorge Lins Freire no Banco do Nordeste no governo Collor? Como é essa história de Lafayette Coutinho (acusado de irregularidades quando presidiu o Banco do Brasil no governo Collor)? Ele "dá" em vocês e pronto. Perdeu a eleição.

Folha - Eram pessoas ligadas a ele?
Ciro
- Sim, senhora. Todo o aparato financeiro do governo Collor -Banco do Nordeste, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal -foi dominado por Antonio Carlos e Ângelo Calmon de Sá, que nomeavam quadros do Banco Econômico para esse cargos. ACM não aguenta o debate. Pela natureza, antidemocrática, e porque é sujo que só pau de galinheiro.

Folha - É o quê?
Ciro
- (aproxima a boca do gravador e fala alto) É sujo que só pau de galinheiro.

Folha - O senhor disputaria a presidência contra o governador de Minas Gerais, Itamar Franco?
Ciro
- A disputa pela presidência é de uma responsabilidade política que não pode estar vulnerável a manhas e amizades pessoais.

Folha - Por que o senhor não apoiou a moratória do Itamar?
Ciro
- Como governador do Ceará, paguei 100% da dívida mobiliária. Como imagina que eu me sinto vendo Estados ricos não pagarem? Em nome de minha amizade com Itamar, fiquei calado. Mas não concordo, de forma nenhuma.

Folha - Apesar das críticas, o senhor não concorda que o pior da crise econômica já passou?
Ciro
- Isso é loucura, papo-furado, uma mentira perigosa, porque desmobiliza. O Armínio Fraga, que é macaco velho de mercado, reduziu os prazos para aplicações estrangeiras, eliminou impostos, botou a taxa de juros lá em cima e entupiu o Brasil de dólar de curto prazo. O paciente não morreu, mas o câncer, que é a dívida pública, aumentou, está em US$ 400 bilhões. Vamos ter que pagar US$ 100 bilhões só de juros. O governo não tem isso. Com sacrifício enorme, conseguirá um superávit pífio, que não paga nem metade do buraco. O risco de se investir no país aumenta. Será necessário rolar a dívida com juro mais alto, prazo mais curto. Uma hora o governo não consegue mais. E soluciona isso com a volta da inflação.

Folha - Ou com moratória.
Ciro
- Interna, não. Nunca houve, a não ser no confisco do governo Collor. E na Argentina, quando houve o "currency board". É o receituário que estão oferecendo ao presidente.

Folha - Quem está oferecendo a solução de "currency board" ao presidente?
Ciro
- Esses professores banqueiros que ele ouve. O André Lara Rezende, o Pérsio Arida, o Luiz Carlos Mendonça de Barros. Eu acho, no entanto, que a probabilidade maior é a volta da inflação.

Folha - Uma última pergunta: o senhor vai casar?
Ciro
- (fica vermelho) Não sei. Quem já foi casado uma vez, como eu, vai pensar muito antes de se casar outra vez.
Lia (irmã de Ciro) - Só se a mamãe autorizar.

Folha - O senhor está namorando?
Ciro
- Não.

Folha - O senhor não está namorando com a atriz Patrícia Pillar?
Ciro
- Posso ser visto num restaurante com ela, sou amigo dela, e tal... posso eventualmente estar aí com ela numa relação de amizade. Mas, por enquanto, não estou com relação nenhuma, formal, com ninguém.



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