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JANIO DE FREITAS
O poder contestado
Origem e centro dos assuntos
que têm dominado a política e o
jornalismo político neste ano,
mesmo quando se trata de uma
mexida no ministério, o senador
Antonio Carlos Magalhães deu,
ontem, um largo passo para a
frente e para cima. Sua atitude
ultrapassa a de influência dominante nas decisões de Fernando
Henrique Cardoso, para ser a de
quem divide, em medida à sua escolha, poderes típicos do poder
presidencial.
A abordagem do necessário
combate à pobreza, na semana
passada, se fez como a exibição de
um contraste com Fernando Henrique, à maneira de uma provocação mais pontiaguda que o provocado, caindo na armadilha, fez
evoluir para um desafio de Antonio Carlos. Para dar ao senador a
pretendida oportunidade de exibir o contraste factual das intenções, finalidades no poder e competências.
Atitude de candidato, como interpretam muitos, ou não, como
ressalva o próprio Antonio Carlos, essa, por ora, é questão secundária. Significativo é que a atitude de Antonio Carlos nada teve
com a de um senador fazendo a
apresentação preliminar de projeto seu. As referências ao teor, a
tramitação que quer (isso mesmo,
quer), a essencialidade da proposta acima do apoio ou oposição,
tudo foi feito como faria o governante apresentando o seu projeto
ao país e ao Congresso. ""Eu preciso do apoio de toda a sociedade
para esse projeto" é, inequivocamente, frase presidencial em defesa de um projeto de governo.
Nunca de parlamentar pleiteando a simpatia dos colegas para
sua proposta.
É no que reflete de Fernando
Henrique e do governo, porém,
que está a importância imediata
da atitude de Antonio Carlos e
seu sentido político, institucional
até. O espaço predominante que é
o de Antonio Carlos não foi tomado por força nem por artifício. Resulta da dependência preferida
por Fernando Henrique. Da fraqueza que os seus áulicos têm
chamado de espírito conciliador.
Resulta da falta de firmeza também no sentido de visão clara e
coerência pessoal e política. Resulta da sua indolência.
O Brasil vive a situação de país
cuja Presidência está em disponibilidade. E sob a ilusão de que,
passado a turbulência econômica
mais explícita, em janeiro, o país
vai convivendo muito bem seus
problemas, promissoramente. Foi
só coincidência no tempo, mas
não por acaso institucional que a
elevação de atitude do senador
Antonio Carlos se deu quando
outras evidências, e mais graves,
denunciam a piora das condições
do país.
Greve nacional de caminhoneiros, com entupimento das maiores estradas e prejuízos ao abastecimento das cidades. Marcha nacional dos sem-terra sobre Brasília. Acampamento de trabalhadores da Ford no centro de São
Paulo. Mais um Estado, Alagoas,
declara moratória. Agravamento
incontrolável da violência urbana. Problemas à vista no Congresso, com recusa dos dois partidos
fundamentais a manter a docilidade utilitária dos últimos anos.
E, além de outros fatos eloquentes, um manifesto de militares pela renúncia de Fernando Henrique, no qual as assinaturas de reformados não deixam de representar a opinião de grande parte
da oficialidade da ativa.
Que Fernando Henrique esteja
há muito tempo contra a parede
só é fato surpreendente para
quem o supôs politicamente capaz. Mas que nem ao menos tente
sair da situação em se pôs, como
se nessa humilhação a sua vaidade purgasse culpas infindas, pode-se acreditar que ninguém esperaria. Nem formalizada ainda,
a proposta de Antonio Carlos logo
iniciou a polêmica em torno de
seus aspectos tributários, fiscais e
empresariais. São, talvez, os seus
aspectos menos expressivos.
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