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biografia
Um radical de cunho religioso
AUGUSTIN WERNET
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em 1987, quando d. Luciano Mendes de Almeida foi
eleito presidente da CNBB,
havia curiosidade da imprensa em saber suas idéias:
"Peço a Deus atuar na conversão dos homens do egoísmo ao verdadeiro amor, sem
conformismo e sem a impaciência dos violentos, para
que as estruturas da convivência humana correspondam cada vez mais à dignidade dos filhos de Deus".
Projeto ambicioso, formulado em linguajar simples de
cunho bíblico. Os termos
progressista ou conservador
não eram apropriados para
caracterizar d. Luciano. Ele
era um radical de cunho religioso. Pessoa de diálogo e
conciliador, procurava, com
integridade e inflexibilidade,
viver e pôr em prática princípios e fundamentos que têm
suas raízes na vida de Cristo
e na mensagem bíblica.
Nascido em 1930, no Rio
de Janeiro, de família católica, formou-se, sempre como
primeiro aluno da classe, no
prestigiado Colégio Santo
Inácio. Aos 16, entrou para o
Seminário da Companhia de
Jesus em Nova Friburgo. A
formação jesuítica é um eixo
de sua vida: piedade inaciana, obediência aos superiores, esmerada formação cultural e científica e amor ao
próximo.
As leituras filosófico-teológicas que mais o influenciaram foram as obras de renomados intelectuais que tiveram decisiva influência
nas decisões do Concílio Vaticano 2º. Foi ordenado padre em Roma, em 5 de julho
de 1958, e terminou os estudos na Europa com o grau de
doutor em filosofia. De volta
ao Brasil, foi nomeado bispo
em 1976 e recebeu a sagração
episcopal por d. Paulo Evaristo Arns. Entre 1976 e 1988,
foi bispo auxiliar na região de
Belém. Notabilizou-se pela
dedicação à população carente e à Pastoral do Menor.
Sempre defendeu reformas sociais e com insistência
cobrou do governo a execução das reformas de base. Foram estas posturas decisivas
para sua eleição, em 1979, a
secretário-geral da CNBB e
para sua reeleição, em 1983,
como também para sua condução, em 1987, à presidência da entidade. Sua escolha
representou o deslocamento
da liderança da ala progressista, de cunho mais político
e social, para a linha moderada, de cunho mais religioso.
Este processo teve continuidade com a reeleição de d.
Luciano, em 1991, e com a
eleição para presidente da
CNBB, em 1995, de d. Lucas
Moreira Neves. Em 1988, d.
Luciano foi nomeado arcebispo de Mariana (MG).
A sua fala foi sempre clara
quando se tratava de questões de doutrina: rejeitou o
aborto; criticou a campanha
de combate à Aids; manifestou-se contra o divórcio e
não recuou na rejeição do
controle de natalidade por
meio artificiais. Agradava a
uma parte do clero ao defender reformas sociais, ao mesmo tempo em que se juntava
aos padres mais tradicionais
na resistência às tendências
secularizadoras que relegam
questões religiosas a um plano secundário. Em resumo:
d. Luciano era um padre que
rezava de verdade, praticava
a caridade de modo radical,
valorizava mais a ortopraxis
do que a ortodoxia e, neste
nosso mundo secularizado,
viveu uma religiosidade de
cunho bíblico e evangélico.
AUGUSTIN WERNET é professor titular do
Departamento de História da USP e autor de
"A Igreja Paulista no Século 19" (Ática)
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