São Paulo, Sábado, 28 de Agosto de 1999
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PERSONALIDADE
D. Hélder Cãmara morre aos 90 anos

Evelson de Freitas - 6.abr.95/Folha Imagem
Dom Hélder Câmara, arcebisbo emérito de Olinda e Recife, que faleceu ontem à noite


da Agência Folha, em Recife,

e da Redação

Morreu ontem em Recife (PE) o arcebispo emérito de Recife e Olinda, d. Hélder Câmara, 90. O religioso estava em sua residência, localizada ao lado da Igreja das Fronteiras, em Recife.
Segundo Antonio da Matta, um dos voluntários que trabalhava com d. Hélder, o religioso morreu dormindo, às 22h20. A causa da morte teria sido uma parada cardiorrespiratória. Até as 0h25 de hoje, as informações ainda não eram oficiais.
A secretária particular de d. Hélder, Maria José Duperron Cavalcanti, a Zezita, foi quem primeiro teria alertado sobre a morte do religioso.
Ela percebeu que o arcebispo não estava bem quando foi dormir e, cerca de três horas depois, foi ao quarto verificar seu estado de saúde, segundo Da Matta.
Ao notar que o religioso não respondia aos seus chamados, afirmou o voluntário, ela entrou em contato com um médico. A morte foi então confirmada.
D. Hélder, segundo Da Matta, passou o dia "tranquilo", mas, pouco antes de dormir, por volta das 20h, aparentava estar "cansado, com falta de ar".
Ainda segundo o voluntário, dias antes de morrer, o arcebispo disse que sua maior preocupação era que um dia sua alma "fosse embora e que seu corpo resistisse". O corpo de d. Hélder será velado na igreja das Fronteiras e enterrado hoje na igreja da Sé, em Olinda. O enterro está marcado para as 17h.
A morte de dom Hélder acontece menos de uma semana após ter tido alta depois de uma internação causada por uma infecção.
O mais importante líder da Igreja Católica brasileira na história, o arcebispo havia sido internado em 18 de agosto no hospital Português, um dos principais de Recife com infecção urinária. Foi submetido a exames de sangue, raios-X e ultrassom.
Após ser medicado, recuperou-se rapidamente. No dia seguinte, o médico Ricardo Lima, que cuidava do religioso, disse que ele passava bem.
Quando recebeu alta, no dia 21, já não apresentava mais sinais da infecção. Ainda assim, manteria por mais alguns dias o tratamento com antibióticos.
D. Hélder fundou, em 1952, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), primeira entidade do mundo a reunir bispos de um país. Esse tipo de organização só passou a ser recomendado pela Igreja Católica depois do Concílio Vaticano 2º (1962-1965), que renovou as práticas da igreja.
Nascido em 7 de fevereiro de 1909, ordenou-se padre em 1931. Nesse mesmo ano, organiza a Juventude Operária Cristã, ligada à LCT (Legião Cearense do Trabalho), organização inspirada no salazarismo. Em 1932, torna-se dirigente da LCT, que passa a fazer parte da Ação Integralista Brasileira, organização fascista.
Quando se mudou para o Rio de Janeiro, na metade dos anos 30, foi convidado pelos superiores a abandonar as atividades políticas, que retomaria nos anos 60.
Nomeado arcebispo de Olinda e Recife em abril de 1964, foi acusado de comunista por suas denúncias de violação de direitos humanos no regime militar e por seus trabalhos com movimentos populares -criou as Comunidades Eclesiais de Base.
Por sua postura e seu prestígio internacional, d. Hélder tornou-se o inimigo número um do regime, que chegou a proibir qualquer menção a seu nome nos meios de comunicação.
Nos início dos anos 70, o governo Emílio Médici (1969-74) moveu, por meio da Embaixada do Brasil em Oslo (Noruega), uma campanha secreta contra a candidatura de dom Hélder ao Prêmio Nobel da Paz.
A revelação está contida no livro "Dom Hélder Câmara - Entre o Poder e a Profecia", de Nelson Piletti e Walter Praxedes, de 1997.
Sua atividade pública tinha sido bastante reduzida nos últimos anos. Por recomendação médica, evitava falar sobre temas polêmicos. Mantinha-se recluso a maior parte do tempo, mas ainda comparecia a eventos públicos.


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