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Oposição a Chávez usa fator petista para tentar golpe
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
A nunca interrompida conspiração para depor o presidente da
Venezuela, Hugo Chávez, ganhou, nos últimos dias, um pretexto novo, chamado Luiz Inácio
Lula da Silva, o candidato do PT.
Informa o jornal britânico "Financial Times", em sua edição de
ontem: "Oficiais militares dissidentes, radicalmente opostos a
Chávez, dizem que há urgência
em tentar sua remoção do cargo
antes da posse de Luiz Inácio Lula
da Silva, o provável vencedor, de
acordo com as pesquisas, da eleição presidencial brasileira".
Completa Andy Webb-Vidal,
correspondente do jornal britânico em Caracas: "Alguns críticos
de Chávez vêem a vitória de Lula
como a peça que falta no quebra-cabeça que permitiria a Chávez
consolidar uma aliança política
esquerdista mais ampla na América Latina, que reverteria as reformas econômicas pró-mercado
e os avanços democráticos na região".
Trata-se, na prática, de ressuscitar tese que um acadêmico norte-americano de extrema-direita
lançou há algum tempo pelo jornal "The Washington Times", de
propriedade da seita Moon, segundo o qual a vitória da Lula
proporcionaria a formação de um
eixo Brasília/Caracas/Havana.
Não é uma tese levada a sério
em meios acadêmicos respeitáveis, como a London School of
Economics. "Parece-me claramente um delírio ou, pior que isso, um argumento da direita golpista que é o eco de argumentos
de outras direitas golpistas latino-americanas dos anos 60 e 70", diz
Francisco Panizza, especialista
em América Latina da LSE.
Mas, na Venezuela, mesmo
opositores de Chávez que não
compram a tese do eixo esquerdista, dizem que ela ganha força e
pode ser usada politicamente pelo
fato de o "Foro de São Paulo",
criado pelo PT, incluir partidos
ou movimentos de extrema-esquerda.
É o que diz, por exemplo, o sociólogo Rafael Suárez, da Universidade Católica Andrés Bello, um
dos ninhos da oposição a Chávez.
Suárez admite que o "fator Lula" pesa na batalha venezuelana
pelo poder, mas é secundário em
relação aos problemas internos.
O fato concreto é que a oposição
venezuelana demonstra pressa
em afastar Chávez.
Anteontem, a chamada Coordenadoria Democrática, coalizão
anti-Chávez, fez um apelo às Forças Armadas para que desconheçam o governo Chávez. Em abril,
conspiração similar levou a um
breve afastamento do presidente,
logo reconduzido ao poder, pela
resistência de setores da população e das Forças Armadas.
Agora, no entanto, avalia o sociólogo Suárez, cresceu substancialmente a oposição a Chávez,
como consequência de "um rotundo fracasso em tão pouco tempo, com tantas vantagens que tinha a seu favor".
É claro que pode ser uma avaliação enviesada de um opositor,
mas o fato de a economia venezuelana ter retrocedido 7,1% no
primeiro semestre do ano é combustível suficiente para queimar o
prestígio do governo.
Talvez estimulada por esse novo
cenário, a oposição pretende marcar, na segunda-feira, o dia para
uma greve geral (na verdade, um
locaute, ou seja, um movimento
conduzido pelos próprios proprietários de negócios).
Chávez já ameaçou: se houver o
locaute, os trabalhadores tomarão as empresas.
A radicalização, portanto, está
dada. É tanta que a embaixada
dos Estados Unidos, país que
nunca escondeu antipatia em relação a Chávez, manifestou sua
preocupação com planos para recorrer "a ações violentas e inconstitucionais, destinadas a alterar a
ordem constitucional, seja para
derrubar o governo, seja para
mantê-lo no poder".
Diferenças
Se o fato Lula está sendo pretexto para a conspiração, Panizza e
Suárez coincidem em estabelecer
diferenças entre o político brasileiro e o presidente venezuelano e
entre Brasil e Venezuela.
Diz Panizza: "Lula é um político
que sempre atuou no marco das
instituições políticas brasileiras e
deu uma contribuição muito importante para o fortalecimento
institucional da democracia. Chávez sempre foi um político anti-institucional, que arrasou o sistema político venezuelano e implantou uma democracia populista".
O venezuelano Suárez lembra
que as pesquisas estão mostrando
que os eleitores brasileiros "estão
escolhendo uma interessante
combinação de forças entre a Presidência, o Congresso e as autoridades locais".
Completa: "Isso é muito importante para o benefício do Brasil e
para tornar mais difícil qualquer
manobra interna ou externa de
Lula ou de qualquer outro. No lado da Venezuela, temos um personagem que conseguiu justamente o oposto, ou seja, confiscar
demasiados espaços de poder e
deseja conquistar mais e mais".
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