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Conflito no Paraná expõe trajetórias de vida opostas
Disputa fundiária contrapõe as histórias de dois líderes
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CASCAVEL
O fazendeiro Alessandro Meneghel, 42, nasceu em família
de fazendeiros, casou-se com
filha de fazendeiro e ajudou a
fundar, aos 13 anos, a Sociedade
Rural do Oeste, entidade ruralista de Cascavel (PR) da qual é
presidente.
O sem-terra Valmir Mota de
Oliveira, 32, o Keno, nasceu em
família de sem-terra, uniu-se a
uma sem-terra e entrou no
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) aos
dez anos, quando o pai, semi-analfabeto, tentava sustentar
os outros 13 filhos, entre adotados e biológicos.
As trajetórias opostas de Keno e Meneghel, dois dos principais líderes que a disputa fundiária no oeste do Paraná produziu, são a imagem do conflito
agrário na região, cujo cenário
atual foi forjado com a criação,
em 1984, do MST -num encontro de sem-terra de 12 Estados em Cascavel.
Keno, o sem-terra, morreu
no último domingo, em tiroteio
com vigilantes da fazenda experimental da multinacional
suíça Syngenta Seeds, em Santa
Tereza do Oeste (PR). Por ser
presidente da sociedade ruralista, Meneghel é acusado, por
militantes sem terra, de ter ordenado o ataque -ele nega.
"Meu pai, um homem honesto, chegou aqui na década de
1970, e abriu todo esse campo",
diz Meneghel, enquanto dirige
uma camionete Mitsubishi
L200 de R$ 90 mil e aponta para a sua fazenda de 5.000 hectares, onde planta feijão, milho e
trigo e colhe rendimento de
cerca de R$ 1,2 milhão anuais.
Sua família já tinha uma usina de cana-de-açúcar em Bandeirantes (PR), quando seu pai
comprou a terra. Nunca foi invadida, ele diz, "por causa da
nossa fama de bravos".
Em Cascavel, Meneghel é tido como extravagante, falastrão e violento, capaz de, por
exemplo, entrar em uma boate
à cavalo atirando. "É tudo lenda", afirma. Mas ele assume
que tem coleção de 12 armas e
que responde a pelo menos cinco processos penais.
Sua filha se formou dentista e
casou com um agrônomo -que
já trabalha na fazenda de Meneghel. O filho estudou na Suíça, cursa administração de empresas em Londrina (PR) e deve assumir parte dos negócios
da família. Os nomes dos dois
estão tatuados nos pulsos de
Meneghel.
Se dependesse da vontade de
Keno, seus filhos Vladimir e
Carlos Eduardo, que têm menos de dez anos, também darão
continuidade a seu trabalho.
"Ele sempre dizia que queria
que os meninos fossem educados com as idéias do movimento", diz sua viúva, Íris de Oliveira. Eles se conheceram em
Açailândia (MA) em 1998, para
onde ele tinha ido ajudar a organizar militantes sem-terra.
Desde os 18, não trabalhava
com o pai.
Ela gostou do que lhe pareceu um "um homem com um
sonho, uma vontade muito
grande de Justiça". "Eu vou
continuar o que ele deixou. E os
meninos também."
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