São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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Conflito no Paraná expõe trajetórias de vida opostas

Disputa fundiária contrapõe as histórias de dois líderes

JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CASCAVEL

O fazendeiro Alessandro Meneghel, 42, nasceu em família de fazendeiros, casou-se com filha de fazendeiro e ajudou a fundar, aos 13 anos, a Sociedade Rural do Oeste, entidade ruralista de Cascavel (PR) da qual é presidente.
O sem-terra Valmir Mota de Oliveira, 32, o Keno, nasceu em família de sem-terra, uniu-se a uma sem-terra e entrou no MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) aos dez anos, quando o pai, semi-analfabeto, tentava sustentar os outros 13 filhos, entre adotados e biológicos.
As trajetórias opostas de Keno e Meneghel, dois dos principais líderes que a disputa fundiária no oeste do Paraná produziu, são a imagem do conflito agrário na região, cujo cenário atual foi forjado com a criação, em 1984, do MST -num encontro de sem-terra de 12 Estados em Cascavel.
Keno, o sem-terra, morreu no último domingo, em tiroteio com vigilantes da fazenda experimental da multinacional suíça Syngenta Seeds, em Santa Tereza do Oeste (PR). Por ser presidente da sociedade ruralista, Meneghel é acusado, por militantes sem terra, de ter ordenado o ataque -ele nega.
"Meu pai, um homem honesto, chegou aqui na década de 1970, e abriu todo esse campo", diz Meneghel, enquanto dirige uma camionete Mitsubishi L200 de R$ 90 mil e aponta para a sua fazenda de 5.000 hectares, onde planta feijão, milho e trigo e colhe rendimento de cerca de R$ 1,2 milhão anuais.
Sua família já tinha uma usina de cana-de-açúcar em Bandeirantes (PR), quando seu pai comprou a terra. Nunca foi invadida, ele diz, "por causa da nossa fama de bravos".
Em Cascavel, Meneghel é tido como extravagante, falastrão e violento, capaz de, por exemplo, entrar em uma boate à cavalo atirando. "É tudo lenda", afirma. Mas ele assume que tem coleção de 12 armas e que responde a pelo menos cinco processos penais.
Sua filha se formou dentista e casou com um agrônomo -que já trabalha na fazenda de Meneghel. O filho estudou na Suíça, cursa administração de empresas em Londrina (PR) e deve assumir parte dos negócios da família. Os nomes dos dois estão tatuados nos pulsos de Meneghel.
Se dependesse da vontade de Keno, seus filhos Vladimir e Carlos Eduardo, que têm menos de dez anos, também darão continuidade a seu trabalho. "Ele sempre dizia que queria que os meninos fossem educados com as idéias do movimento", diz sua viúva, Íris de Oliveira. Eles se conheceram em Açailândia (MA) em 1998, para onde ele tinha ido ajudar a organizar militantes sem-terra. Desde os 18, não trabalhava com o pai.
Ela gostou do que lhe pareceu um "um homem com um sonho, uma vontade muito grande de Justiça". "Eu vou continuar o que ele deixou. E os meninos também."


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