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ÍNTEGRA
"A situação não é boa em quase nenhum aspecto"
Leia a íntegra do discurso do
presidente eleito, Luiz Inácio Lula
da Silva, durante reunião com seu
futuro ministério.
"Daqui a quatro dias, eleito, diplomado e empossado, eu, hoje, tenho a
convicção que nós tivemos um acerto excepcional quando escolhemos o
companheiro Antonio Palocci para
coordenar a equipe de transição.
Possivelmente outro qualquer que
não o Palocci, mas para não falar de
ninguém, falar de mim mesmo, com
base em tudo o que eu sei que estão
naquelas caixas vermelhas e brancas,
poderia ter produzido um documento muito mais agressivo do ponto de vista político ao atual governo.
Entretanto, a sabedoria política nos
ensina que em determinados momentos a briga eminentemente verbal não ajuda ninguém, pode satisfazer apenas nossos desejos pessoais.
Como nós temos a responsabilidade de dirigir essa imensa nação pelos
próximos quatro anos, e não tem outro jeito, vamos pegá-la tal como ela
está. Eu acho que a situação não é
boa em quase nenhum aspecto, a
não ser na consolidação do processo
democrático.
Eu tenho tentado repetir todos os
dias: nós não teremos tempo para ficar chorando o leite derramado.
Nós, certamente, não teremos tempo para ficar debatendo com o governo que sai aquilo que eles não fizeram, porque sempre haverá a resposta de que eles fizeram o máximo e
nós é que estamos equivocados. E
nós sempre vamos dizer que eles fizeram o mínimo e que eles é que estão equivocados.
A nossa missão é provar que nós
poderemos mudar o nosso querido
Brasil. A primeira coisa de que eu estou convencido que nós já conseguimos mudar no seio de milhões e milhões de brasileiros é a recuperação
de sua auto-estima. É o fato de as
pessoas voltarem a acreditar que, a
partir delas, a gente pode fazer deste
país a grande nação, que desde pequeno eu ouço dizer que um dia nós
seremos um país extraordinariamente grande e rico. Seremos o celeiro do mundo.
Eu acho que, possivelmente, nós
não consigamos terminar a nossa
obra, porque uma grande obra, às
vezes, leva um tempo, mais do que
quatro anos para a gente terminar,
mas eu tenho certeza de que, pela
qualidade de pessoas que foram chamadas para trabalhar neste governo,
no primeiro escalão, pela qualificação profissional de cada companheiro ou companheira, pelos compromissos de vida ideológicos que cada
um tem, eu não tenho dúvida nenhuma, que nós poderemos fazer
pelo Brasil muito mais do que nós
mesmos acreditamos que possamos
fazer.
É por isso que eu queria, companheiro Palocci, agradecer a coordenação do teu trabalho nessa comissão de transição, agradecer a você
companheiro Luiz Gushiken, que no
início não queria participar nem da
minha campanha, porque estava
com a saúde debilitada e veio assumindo uma função ali, outra função
acolá, se eu não tomo cuidado, ele tinha sido candidato a presidente no
meu lugar.
Eu, particularmente, fico feliz em
saber que você está não apenas recuperado do ponto de vista da saúde física, mas motivado, como poucos de
nós, para recuperar a saúde política e
econômica do nosso país.
Eu e o companheiro José Alencar
tivemos um papel extraordinário
nesse processo de transição, não nos
metemos na transição, ou seja, na
medida em que nós confiamos numa coordenação e numa equipe de
técnicos para trabalhar, homens e
mulheres especializados nas mais diferentes áreas, não tínhamos por que
nos preocupar.
Ao terminar essa transição, como
presidente eleito, eu tenho a consciência tranquila e a certeza de que
vocês produziram o que de melhor o
ser humano poderia produzir pensando no seu povo, pensando no futuro da nossa gente. Depois que terminar essa reunião, que vai terminar
assim que eu terminar de falar, eu
vou ter uma conversa com os ministros e, depois, cada ministro deverá
se reunir com os companheiros que
prepararam aquele laborioso arsenal
de pastas não cor-de-rosa, mas vermelhas.
E, obviamente, que eu tenho clareza e, certamente, vocês têm clareza,
aqui nós temos algumas pessoas que
já foram governadores de Estado, o
Ciro Gomes, o Olívio Dutra, o Tarso
já foi prefeito e outros companheiros, que sabem perfeitamente bem
que somente depois que assumir e
colocar a mão na massa é que a gente
vai descobrir coisas que ainda não
apareceram na transição, por mais
competentes que vocês tenham sido.
E obviamente que, cada vez que
descobrirmos, nós teremos de pensar como comunicar isso à nação
brasileira, porque se não comunicarmos corretamente passaremos nós a
ser os culpados por erros que os outros cometeram. Da mesma forma
que nós não queremos ficar apenas
brigando verbalmente, nós queremos administrar este país com a
maior seriedade que um ser humano
já pensou administrar o nosso país.
Eu estou convencido de que esse
processo de transição é um marco na
história democrática do nosso país.
Não apenas a relação diplomática
entre o presidente eleito e o presidente em exercício, mas a facilidade
que tiveram os companheiros da comissão de transição na relação com o
governo.
O companheiro José Dirceu, nas
conversas com o Pedro Parente, o
companheiro Gushiken, nas conversas com outros ministros, o Palocci,
nas conversas com a área econômica... Às vezes, parecia até que nós já
estávamos governando, quando, na
verdade, nós estávamos apenas pegando informação. Mas de qualquer
forma esse processo demonstra que
nós temos condições de não permitir
que haja nenhum retrocesso na prática democrática do nosso país.
Haverá um dia em que presidente
eleito e presidente que termina o seu
mandato sairão abraçados, passarão
no meio do povo, como se fosse uma
festa da democracia. Não como em
alguns países ou mesmo no Brasil
em alguns momentos em que presidentes tiveram que sair por trás ou
outros lugares que nem posse puderam dar aos seus sucessores. Essa
transição, portanto, é um marco que
deve marcar a trajetória política de
cada um de nós.
Eu queria terminar dizendo a todos vocês o seguinte: escolher o governo é como escolher uma seleção:
às vezes, você tem 50 centroavantes
da melhor qualidade que você teria
que convocar, mas só pode convocar
um e aí tem "n" critérios que fazem
com que a gente escolha um ou outro companheiro, uma ou outra
companheira.
O que eu quero é que vocês tenham clareza é que aqui nesta sala e
fora desta sala a gente poderia montar um outro ministério, da mesma
forma que no Brasil um técnico pode
montar várias seleções porque temos gente de sobra para assumir
quantos cargos forem necessários.
A equipe está montada e essa equipe tanto os mais experientes quanto
os mais, eu diria, novatos sabem que,
nas costas de cada um de nós pesa
uma responsabilidade imensa.
Eu estou com 57 anos de idade. Há
muito anos eu não conheço um momento histórico no Brasil em que o
povo tivesse com tanta expectativa.
O povo não quer saber se o Ciro é
do PPS, o povo não quer saber se o
Anderson Adauto é do PL, o povo
não quer saber se o Furlan não é filiado a nenhum partido político, o povo não quer saber se o Roberto Rodrigues não é filiado, se o companheiro Agnelo é do PC do B. O povo quer saber que nós fazemos parte de
uma equipe e aceitamos fazer parte
de uma equipe com a convicção de
que cada um de nós tem muito, mas
muito a oferecer para o nosso país.
Todo mundo sabe quais são as
nossas prioridades. Todo mundo sabe que nós queremos garantir que o
povo brasileiro tome café, almoce e
jante todo dia. Todo mundo sabe
que nós queremos que a saúde seja
um direito de todos e não um privilégio de quem pode pagar um plano de
assistência médica. Todos nós sabemos que não basta dizer que todas as
crianças estão na escola.
É preciso dizer que qualidade de
ensino essas crianças estão tendo. E
todos nós aqui temos compromisso
com isso. Todos nós vamos trabalhar 24 horas por dia para conseguirmos o nosso objetivo.
Eu quero que vocês saibam, meus
amigos, que eu serei o eterno vigilante para que a gente possa cumprir cada coisa que a gente prometeu durante o processo de campanha. Cada
ministro vai ter o tempo de apresentar o seu plano de metas. Nós vamos
trabalhar cobrando resultados. De
tempos em tempos nós vamos nos
reunir e ver o que cada um está fazendo, o que não está fazendo e por
que não está fazendo. Nós vamos dar
conta do recado.
Hoje, eu saí de casa de manhã meio
triste porque era uma despedida e as
pessoas choravam e diziam para
mim que o Brasil não estava legal,
que a situação não estava boa, que
nós íamos ter dificuldades. E eu dizia: mas é por isso que nós ganhamos, se estivesse boa eu não tinha
ganhado. Se a coisa estivesse maravilhosa, possivelmente outro ganharia.
É exatamente porque está assim que
o povo depositou a expectativa e a
esperança que nós poderíamos consertar este país e vamos consertar.
Tenham a certeza disso. Nós vamos
demarcar a história deste país: antes
e depois deste governo que começa
dia 1º de janeiro de 2003.
Na apresentação do ministério alguns companheiros não estavam
presentes porque estavam trabalhando. Afinal de contas, este é um
governo dos trabalhadores. Então, as
pessoas estavam trabalhando. Então, eu queria agora apresentar a vocês: o companheiro Celso Amorim,
que estava em Londres, na Embaixada Brasileira, nosso ministro das Relações Exteriores.
Queria apresentar o companheiro
José Viegas, que vai ser o ministro da
Defesa e estava trabalhando na Embaixada de Moscou. Queria apresentar aqui o companheiro Olívio Dutra, que vai ser o ministro das Cidades. Vocês perceberam que, quando o Olívio vem, o Rossetto não vem,
quando o Rossetto vem, o Olívio não
vem? Vamos ver se, a partir de 1º de
janeiro, os dois virão. E o companheiro Tarso Genro, que vai ser o secretário do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.
Eu agora queria convidar os companheiros e as companheiras que fazem parte desse ministério, desse governo a se projetarem para uma sala
que já está reservada para a gente ter
uma conversa pequena porque eu
sei que alguns companheiros têm
que viajar, mas uma conversa que eu
quero ter com vocês e o Palocci também. Depois, então, as pessoas saciarão o desejo da imprensa e dos fotógrafos. Não agora. Não agora. Depois nós faremos isso, está bem?
Gente, à equipe de transição, muito obrigado, mas do fundo do coração, pelo inestimável trabalho que
vocês prestaram ao nosso governo e
ao nosso país, meus parabéns".
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