São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2008

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Capitão afirma que a democracia pode melhorar o Exército

Luis Fernando Ribeiro de Sousa defende mais participação política na corporação e quer concorrer à Câmara em 2010

Oficial nega que movimento queira minar a hierarquia e a disciplina no meio militar, como alegam os setores conservadores do Exército


Eduardo Lima/Folha Imagem
O capitão Luis Fernando de Sousa, no centro de Porto Alegre


DA ENVIADA A PORTO ALEGRE

O mineiro Luis Fernando Ribeiro de Sousa, 32, cresceu e até hoje vive no meio militar. É um capitão do Exército que acredita que a democracia pode melhorar as Forças Armadas. Ele integra um movimento que defende mais participação política na corporação, e se prepara para concorrer em 2010 a deputado federal. Para evitar punições, ele falou à Folha enfatizando que todas as idéias são pessoais e não representam a corporação. (ANA FLOR)

 

FOLHA - Como surgiu esse movimento?
LUIS FERNANDO RIBEIRO DE SOUSA
- Mudanças que poderiam melhorar as Forças Armadas, para que ela tenha papel importante, só acontecem por meio de participação política. Qualquer coisa que a gente pode fazer passa pela via política. Precisamos de deputados e senadores para promover qualquer transformação. Assim começamos a nos organizar.

FOLHA - Qual o objetivo do movimento?
SOUSA
- O regulamento disciplinar do Exército não contempla um monte de garantias que a Constituição contempla. O movimento é para dizer que o documento maior é a Constituição [e não regimentos internos]. Deve-se ter direito à liberdade de expressão, de associação para fins pacíficos.

FOLHA - Querem mais democracia no Exército?
SOUSA
- Dentro das Forças Armadas, até certo ponto tem democracia e até certo ponto não tem. O processo para que todos os direitos do artigo 5º e do artigo 6º [da Constituição Federal] cheguem aos militares não será de uma hora para a outra. Precisa haver democracia para toda a sociedade, inclusive para o Exército. O que está errado é o regulamento disciplinar. Lá na Constituição, que é a arma que nós empunhamos, diz que ninguém pode ser preso senão em flagrante delito. Temos que fazer mudar o regulamento disciplinar do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, fazer um regulamento da Defesa unificado e pedir que os governos estaduais também façam isso com as polícias militares.

FOLHA - Querem menos disciplina?
SOUSA
- Há setores mais conservadores, ainda da ditadura militar, que dizem que estamos querendo acabar com a hierarquia e a disciplina. Muito pelo contrário. Será uma disciplina verdadeira. Como uma pessoa pode ser punida por dar uma entrevista, por se associar?

FOLHA - O Exército está boicotando o movimento?
SOUSA
- O Exército sabe que nosso objetivo é ter um candidato por Estado. O que ele fez? Transferiu [os oficiais]. As ligações políticas locais são quebradas. A meu ver, foi uma medida pensada para desarticular esse movimento. Querem evitar que haja interferência política em assuntos do Exército.

FOLHA - Ao falar em participação política dos militares, não há como não se lembrar da ditadura...
SOUSA
- A gente não tem nada a ver com a ditadura militar. Eu não quero entrar no mérito [e dizer] se foi certo ou errado. Cabe a nós pensar para frente, somos capitães, tenentes. Nosso pensamento é desenvolver o Brasil, um lugar para a gente crescer, com a não-criminalização dos movimentos sociais.

FOLHA - O que é o capitanismo?
SOUSA
- É um movimento que constrói a democracia. É uma adequação da estrutura secular das forças militares à realidade pós-88. É fazer chegar a Constituição também ao meio militar.

FOLHA - Quantos os senhores são?
SOUSA
- Eu não quero identificar ninguém, porque a retaliação pode vir pesada. Mas eu recebo cerca de cem e-mails por dia, de todo o Brasil. São pessoas de todas as Forças Armadas com o mesmo sentimento.

FOLHA - Como os senhores estão se organizando para 2010?
SOUSA
- Estamos discutindo os candidatos. Definimos que vamos apoiar quem o presidente [Luiz Inácio] Lula [da Silva] apoiar. Vemos o Lula como uma pessoa mais desenvolvimentista. Não é uma opção pela direita ou pela esquerda. É desenvolvimento, onde há projetos de usinas nucleares, de submarino nuclear, de tecnologia militar, de fortalecimento da indústria militar de defesa. Queremos um país forte, uma América Latina integrada.

FOLHA - Quando você entra nas Forças Armadas, você sabe do regulamento ao qual deve se submeter.
SOUSA
- Regulamento que não contempla direitos. Um regulamento que te coloca uma rédea curta. Ele pode ser totalmente diferente sem estragar nada. O grande problema, que os generais não aceitam, é a [eliminação da] pena restritiva de liberdade. Você ficar preso dentro do quartel. Eu fui preso e meu filho foi me visitar. Imagina o que o menino pensa: "Meu pai é do Exército ou é traficante?" Prisão é para criminoso. Quem está com cabelo grande não é criminoso.


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