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São Paulo, domingo, 29 de junho de 2003

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Paraguaios movimentaram 8% do PIB na agência

DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Casas de câmbio, empresas "offshore" e moradores do Paraguai movimentaram US$ 1,49 bilhão na agência do Banestado de Nova York entre 1996 e 1997 -alvo de investigação da Polícia Federal e da CPI do Congresso.
O valor representa 8% do PIB paraguaio registrado no mesmo período (US$ 19,2 bilhões) e 10% do valor total movimentado nos dois anos na agência.
Além disso, as contas de duas instituições bancárias sediadas no Paraguai -o Banco Integración e o Banco Del Paraná- movimentaram nos EUA US$ 10,4 bilhões no período 1996-1997.
Para a Polícia Federal, os dois bancos paraguaios atuaram como "co-autores de lavagem de dinheiro", na expressão do delegado federal José Castilho, que atuou no caso em Nova York.
O presidente da CPI, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), mostrou-se surpreso com os números que lhe foram apresentados pela Folha, ressalvando que seria preciso analisá-los assim que o corpo técnico da comissão estiver montado.
Na terça-feira, a comissão se reunirá para apreciar e votar os primeiros requerimentos apresentados pelos senadores, um cronograma de especialistas no assunto que serão ouvidos e uma série de ofícios para requisitar documentos já produzidos ao longo da investigação sobre o caso.
De imediato, segundo Barros, a CPI quer estabelecer relações com o Ministério da Justiça e com embaixadas, preparando o caminho para, no momento certo, lançar mão dos acordos de cooperação internacional para investigar essa movimentação e, quando for o caso, repatriar os recursos que eventualmente tenham origem em negócios ilícitos no Brasil.
Cinco casas de câmbio paraguaias operaram no Banestado: Acaray, Chaco, Imperial, Golden e Tupi, todas localizadas em Ciudad del Este, na fronteira com o Brasil. Elas se relacionavam com outras empresas "offshore" e contas identificadas só por números e apelidos em outros bancos.
A maior delas, a Tupi Câmbios, movimentou US$ 1,3 bilhão. Ela enviou dinheiro, em remessas de até US$ 1 milhão, para todos os principais doleiros brasileiros que operavam na própria agência.
A Tupi remeteu, por exemplo, US$ 16,4 milhões para a conta apelidada de "Campari" na agência do MTB Bank de Nova York. O Ministério Público de São Paulo quer ter acesso a essa conta, por desconfiar que ela recebeu recursos de origem ilícita.
Outra conta, apelidada de "Formidable" ("formidável", em espanhol), recebeu da Tupi US$ 24 milhões no Audi Bank.
Os bancos com sede no Paraguai também serão investigados pela CPI. O Banestado tinha cerca de 60% das ações do Banco del Paraná, com o qual fazia operações rotineiras de câmbio. O Integración era de capital paraguaio.
Entre as contas de pessoas físicas no Banestado, a de um paraguaio girou US$ 240,7 milhões -a maior do gênero na agência. A Polícia Federal não teve acesso à movimentação detalhada dessa conta, para saber o primeiro destino do dinheiro após ter deixado o Banestado.

Cooperação
A participação de paraguaios no suposto esquema de lavagem é um problema a mais para a investigação da CPI e da polícia.
"Eles [autoridades paraguaias] têm vontade de colaborar, mas o sistema lá é mais lento que o nosso no Brasil", explica Maria Cláudia Cabral, assessora para cooperação judiciária internacional do Ministério da Justiça.
Quando um pedido de cooperação judiciária em matéria penal chega ao Paraguai, primeiro passa pela suprema corte, depois vai para uma secretaria de matérias internacionais, uma outra de temas penais e somente então para a Justiça de primeira instância, onde está tramitando o processo relacionado ao pedido.
No Brasil, quando o pedido chega ao Ministério da Justiça, é encaminhado diretamente ao juízo da primeira instância competente. O Brasil mantém acordo de cooperação judiciária em matéria penal com todos os países do Mercosul e com outros seis (Itália, Portugal, França, Peru, Colômbia e Estados Unidos).
Instrumentos recentes, datados de meados dos anos 90, esses acordos permitem, de maneira bilateral, o acesso a documentos, tomada de depoimentos e quebra de sigilos, além de operações de busca e apreensão.
Os acordos foram utilizados, por exemplo, na coleta de provas relacionadas ao caso da obra superfaturada do novo prédio do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, a partir de 1998.
"Se os países não se unirem com base nesses acordos, não há possibilidade de êxito no combate ao crime organizado", disse ela. Em agosto, Cabral integrará um grupo de técnicos que irá à Suíça para a segunda rodada de negociações para fechar mais um acordo de cooperação.
No caso de Cuba e Coréia do Sul, o acordo com o governo brasileiro já está assinado e em fase de ratificação. Para as Bahamas, foi negociado, mas ainda não assinado. (RV e AM)


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