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União acusa Vale de invadir assentamentos
Segundo relatório do Incra, mineradora negociou diretamente com 53 assentados no Pará terras de reforma agrária
Órgão diz que área na qual empresa já iniciou obras de projeto bilionário de produção de níquel foi adquirida ilegalmente
Tuca Vieira/Folha Imagem
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Obras do complexo de mineração de níquel da Vale em Ourilândia do Norte, no sudeste do Pará, que devem custar US$ 2,2 bi; área faz parte dos projetos de assentamento Tucumã e Campos Altos
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA,
EM OURILÂNDIA DO NORTE (PA)
Por meio de um relatório carimbado pela presidência do
Incra (Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária), o governo federal acusa a
Vale, segunda maior mineradora do mundo, de ter invadido
uma área de assentamentos da
União no sudeste do Pará para
desenvolver um projeto bilionário de produção de níquel.
Segundo o documento, ao
qual a Folha teve acesso, a mineradora Onça Puma, da Vale,
indenizou diretamente, entre
2003 e 2007, 53 assentados para que saíssem de seus lotes.
Apesar de possuir o chamado
"direito de lavra" da área do
DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), a
mineradora só poderia trabalhar na área com autorização
da chefia do Incra.
Na área de interesse da mineradora, há 7.400 hectares localizados dentro dos dois assentamentos -o equivalente a
quatro vezes a área do arquipélago de Fernando de Noronha.
Sem a mediação constante
do órgão federal, a mineradora
coagiu os lavradores a aceitarem as indenizações, segundo
alguns deles afirmaram à Folha. A empresa nega a pressão.
De acordo com o relatório, as
"compras" dos lotes ocorreram
por cinco anos. Nesse meio
tempo, no final de 2005, a Vale
comprou a canadense Canico,
cujo principal ativo no país era
o projeto da Onça Puma, inflado pela mineradora brasileira.
"Quem desencadeou essa situação foi a mineradora, que,
mesmo ciente da ilegalidade da
situação e sem haver recebido a
autorização formal desta autarquia, fez as negociações com os
assentados, com proposta altamente sedutora", aponta trecho do relatório do Incra.
"Estamos aguardando somente a passagem disso [pedido de autorização] pelo conselho [diretor do Incra]", afirma o
diretor da Vale para o projeto
Onça Puma, João Coral.
A capacidade do projeto é de
58 mil toneladas/ano de níquel,
o que representaria uma renda
bruta anual de US$ 2 bilhões. A
Vale estima gastar US$ 2,2 bilhões no projeto, sendo que só
no ano passado já foram aplicados US$ 537 milhões.
O resultado do investimento
pode ser visto em Ourilândia do
Norte (PA), próximo à área onde estão as reservas de níquel.
Um esqueleto da enorme planta de beneficiamento do minério já está de pé na cidade.
Em alguns dos lotes ocupados pela empresa, ainda intactos, se vê placas com o seguinte
aviso: "Proibida a entrada. Propriedade do projeto de mineração Onça Puma".
Indefinição
O documento do Incra seria
apresentado à Vale na semana
passada, mas a reunião com o
comando da empresa foi adiada
para final de julho, a pedido do
Incra. No órgão, não há consenso sobre que rumo seguir após a
constatação da invasão de parte
dos projetos de assentamento
Tucumã e Campos Altos.
Uma ala quer o confronto jurídico com a Vale, ou seja, que
se coloque a procuradoria do
órgão e a AGU (Advocacia Geral da União) para suspender o
projeto. Outra ala, mais realista, aceita a negociação com a
mineradora, pois sabe que,
diante dessa polêmica, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil)
e o presidente Lula tendem a ficar do lado da mineradora.
Segundo normas do Incra, o
assentado não é considerado
dono da terra, e sim uma espécie de usuário. Ele não pode negociar o lote ou as benfeitorias
construídas com dinheiro público. Se quiser abandoná-lo,
ele comunica o órgão, que coloca outro sem-terra no local.
No caso da Onça Puma, o trâmite normal seria uma negociação direta entre a mineradora e o órgão, e não diretamente com os assentados. Procurado
pela Folha, o presidente do Incra, Rolf Hackbart, não quis falar sobre o caso.
Ciente do relatório do Incra,
a Abra (Associação Brasileira
de Reforma Agrária), entidade
de intelectuais e líderes de movimentos sociais, enviou ao
BNDES uma representação na
qual pede ao banco que "adote
as medidas cabíveis para suspender os financiamentos" à
mineradora. O BNDES, que
aprovou R$ 8 bilhões de investimentos para a Vale, está analisando o documento da Abra.
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