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JANIO DE FREITAS
O país dos grampos
Com a novidade de que o
governo pretende proibir a
publicação de gravações telefônicas mesmo que legais, já são
três os aspectos que, embora
igualmente suscitados pelo vale-tudo entre Telecom Italia e
Brasil Telecom, merecem tratamentos distintos e próprios. Os
três têm implicações que excedem os limites do conflito de poder empresarial, mas dois deles
têm dimensão política e pública
de gravidade.
Um dos aspectos é, claro, o de
verificar se e como a legislação
foi transgredida nas investigações da Kroll Associates para a
Brasil Telecom e em qualquer
procedimento de uma ou outra
parte do conflito.
Com dimensão diferente, o segundo aspecto é o indício de
tráfico de influência implícito
na informação, presente entre
as conclusões da Kroll já publicadas, de que o ministro Luiz
Gushiken e o presidente do
Banco do Brasil, Cássio Casseb,
comprometeram-se no conflito
das empresas privadas quando
já integrantes do governo.
Não consta que o governo tenha adotado providência alguma para a apuração do indício.
Se supõe que a omissão é o mais
conveniente, engana-se: indício
não apurado continua vivo e
sempre lembrável. Em caso de
dúvida, é só perguntar aos envolvidos nas marotagens telefônicas da privatização, ainda
agora citados, todos, com direito a fotografias.
O mais recente dos aspectos
sugere, de saída, uma pergunta:
se o ministro Luiz Gushiken
não aparecesse como um dos
nomes proeminentes nesse caso
de intrigas, processos, espionagem e poderosas fortunas em
jogo, teria empolgado o Planalto a idéia de proibir a publicação de gravações telefônicas,
ainda que autorizadas em juízo?
As afinidades naturais do poder com as soluções autoritárias querem, sempre, preencher
a distância entre o questionamento e a reação. A pretendida
proibição tem o mesmo berço
dos "pingos nos is" que o ministro José Dirceu prometeu aos
promotores e aos procuradores
da República - única promessa petista cujo esquecimento,
parece que real, é benfazejo.
No Brasil há gravações telefônicas, desde muito tempo, para
todos os lados e propósitos. E
não poderia ser diferente, no
país em que os jornais até trazem anúncios assim: "Detetive
[fulano], investigação empresarial [...] acompanhamentos,
provas fotográficas, filmagens,
gravações telefônicas, levantamentos em geral". O jornal que
transcrevo tem oito anúncios
semelhantes - e é um dia fraco. Podem dizer que as gravações e outros "levantamentos"
só se fazem com autorização judicial. Pois sim.
As gravações clandestinas é que
precisam do combate que não lhes
é dado. Proibir a publicação só resulta em restrição antidemocrática
à liberdade de ser informado sobre
assunto de interesse público: tal
proibição não restringe a prática
das gravações clandestinas. O provável é que as torne ainda mais difundidas, porque a publicação
eventual de um caso desses serve,
sempre, para acautelar possíveis
vítimas e advertir possíveis contratantes.
O propósito tão extremado do
governo faz parecer que são freqüentes as transcrições de gravação nos jornais. Se mais houvesse,
haveria menos corrupção e menos
fraudes.
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