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PERSONALIDADE
FHC divulga nota oficial ressaltando a dedicação do religioso à defesa dos direitos humanos
Papa lamenta a morte de d. Helder
da Agência Folha, em Recife,
da Sucursal de Brasília
e da Reportagem Local
A morte de dom Hélder Câmara, arcebispo emérito de Recife e
Olinda (PE), foi lamentada ontem pelo papa João Paulo 2º e por
políticos, intelectuais e religiosos.
O papa enviou ao Brasil mensagem de condolências pela morte
de dom Hélder, o mais importante líder da Igreja Católica na história do país e um dos expoentes
da ala progressista da instituição.
Na nota, o papa disse que recebeu com pesar a notícia do falecimento de dom Hélder. "Entre
suas inúmeras atividades pastorais, ele ajudou a criar o Conselho
Episcopal Latino-Americano e a
CNBB (Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil)", disse o papa.
O presidente Fernando Henrique Cardoso divulgou nota oficial
de três linhas na qual ressaltou a
dedicação de dom Hélder à defesa dos direitos humanos e "à luta
pela paz e pela solidariedade". "O
Brasil sentirá sua falta", concluiu.
Dom Hélder morreu em Recife
às 22h20 de anteontem, aos 90
anos, de insuficiência respiratória
aguda. O enterro estava programado para as 17h de ontem, na
Igreja da Sé, em Olinda (PE).
O presidente da CNBB, dom
Jayme Chemello, afirmou que
dom Hélder "foi o grande homem do episcopado brasileiro".
Chemello lembrou que, em
1952, dom Hélder foi responsável
pela fundação da CNBB -primeira entidade do mundo a reunir bispos de um país.
Esse tipo de organização só passaria a ser recomendado oficialmente pela Igreja Católica depois
do Concílio Vaticano 2º (62-65),
que renovou as práticas da igreja.
FHC foi representado no velório de dom Hélder pelo vice-presidente Marco Maciel, que é pernambucano e católico praticante.
Maciel divulgou nota lamentando a morte do arcebispo. "A
ação pastoral de dom Hélder Câmara ultrapassou os limites da
Arquidiocese de Olinda e Recife.
Sua voz se fez ouvir em praticamente todo o mundo. As suas
idéias contribuíram para a atualização da doutrina social da igreja,
do que foi exemplo sua destacada
participação no Concílio Ecumênico 2º, defendendo, na igreja, a
opção preferencial pelos pobres",
disse Maciel na nota.
Na opinião do advogado Dalmo Dallari, professor da Universidade de São Paulo, dom Hélder
"foi uma das figuras mais importantes da história do Brasil".
Segundo ele, o arcebispo foi um
dos principais expoentes da ala
progressista da Igreja Católica
-aquela mais voltada a preocupações de caráter social.
"Dom Hélder deve ser lembrado não só pelo que fez dentro da
Igreja Católica, mas também por
sua atitude corajosa nos piores
momentos do regime militar",
disse Dallari.
O presidente nacional do PT,
deputado José Dirceu, afirmou
que dom Hélder foi um "símbolo" da resistência ao regime militar e um inspirador da organização da Igreja Católica nos movimentos sociais.
Para o secretário de Estado de
Direitos Humanos, José Gregori,
dom Hélder foi a maior figura do
catolicismo moderno. "Ele conseguiu fazer uma ponte com a sociedade civil. Nessa ponte, ele se
comportou com muito equilíbrio
e nunca se afastou da mensagem
cristã, de conciliação e solidariedade entre os homens."
"A vida de dom Hélder e a sua
história se confundem com a luta
pela democracia e por justiça social. É um exemplo de dignidade
e de simplicidade", afirmou o líder do PT na Câmara, José Genoino.
Velório
O corpo de dom Hélder foi velado na Igreja das Fronteiras, de
acordo com recomendação deixada por ele antes de morrer.
Em documento registrado em
1º de junho de 1998 no 18º Cartório de Registro de Notas de Ipanema, no Rio, onde moram seus irmãos, dom Hélder pediu também
uma cerimônia sem pompa e manifestou o desejo de ser sepultado
na catedral da Sé, em Olinda.
Durante a madrugada e a manhã de ontem, pouca gente compareceu à Igreja das Fronteiras.
As portas da igreja foram abertas
às 2h15 para visitação pública.
O vice-presidente da República
permaneceu durante 15 minutos
ao lado do corpo de dom Hélder e
depois deixou o local.
A ex-prefeita de São Paulo e deputada federal, Luiza Erundina,
também esteve no velório. "Na
década de 70, quando eu dava aulas em Recife, sempre mantive
contato com dom Hélder para
discutir os problemas do regime
militar." Para Erundina, dom
Hélder sempre foi uma referência
no combate à repressão. "Ele não
calou a boca, nem diante da perseguição da Igreja."
Antes da chegada de Marco Maciel, o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), e
o prefeito de Recife, Roberto Magalhães (PFL), também estiveram
presentes no velório.
O velório de dom Hélder foi
marcado pela realização de missas de hora em hora, acompanhado, basicamente, por pessoas humildes.
A Arquidiocese de Olinda e Recife aguardava para o início da
tarde de ontem a chegada de caravanas do interior para participar
do enterro. Segundo a arquidiocese, pelo menos 80 ônibus deveriam chegar à capital pernambucana para acompanhar o cortejo
fúnebre.
Até chegar à catedral, o corpo de
dom Hélder deveria percorrer as
principais ruas e avenidas de Recife, em um carro aberto do Corpo de Bombeiros, seguido por
quatro batedores da PM (Polícia
Militar).
Dom Hélder Câmara deixou a
Arquidiocese de Olinda e Recife
em 1985, quando completou 75
anos, e passou a morar em uma
casa simples, construída a 20 metros da Igreja das Fronteiras.
A CNBB também divulgou nota
oficial pelo falecimento de dom
Hélder. "(Dom Hélder) deixa para todos exemplo de um profundo amor à igreja, que se traduziu
na colegialidade episcopal", disse
a nota, assinada pelo secretário-geral da entidade, d. Raimundo
Damasceno Assis.
"Ele testemunhou com sua vida
e com sua pregação, um grande
amor ao Brasil, expresso na promoção da dignidade e dos direitos
da pessoa humana, especialmente
dos mais pobres. Neste momento,
é preciso recordar e assumir sua
herança espiritual e humana, e sobretudo seu grande anseio por
um milênio sem fome", disse a
mensagem oficial da CNBB.
O bispo-auxiliar de Curitiba,
Ladislau Biernaski, também enviou uma nota de condolências,
dizendo: "Louvo ao Deus da vida
pelo dom da vida de d. Hélder Câmara, pelo seu testemunho, seu
profetismo, pelo seu amor ao povo e à Igreja, em especial, pela sua
dedicação à CNBB."
Biografia
Nascido em 7 de fevereiro de
1909, dom Hélder ordenou-se padre em 1931. Nesse mesmo ano,
organizou a Juventude Operária
Cristã, ligada à LCT (Legião Cearense do Trabalho), organização
inspirada no salazarismo. Em
1932, tornou-se dirigente da LCT,
que passa a fazer parte da Ação
Integralista Brasileira, organização fascista.
Quando se mudou para o Rio de
Janeiro, na metade dos anos 30,
foi convidado pelos superiores a
abandonar as atividades políticas,
que retomaria nos anos 60.
Nomeado arcebispo de Olinda e
Recife em abril de 1964, foi acusado de comunista por suas denúncias de violação de direitos humanos no regime militar e por seus
trabalhos com movimentos populares -criou as Comunidades
Eclesiais de Base.
Por sua postura e seu prestígio
internacional, dom Hélder tornou-se o inimigo número um do
regime, que chegou a proibir
qualquer menção a seu nome nos
meios de comunicação.
Nos início dos anos 70, o governo Emílio Médici (1969-74) moveu, por meio da Embaixada do
Brasil em Oslo (Noruega), uma
campanha secreta contra a candidatura do arcebispo ao Prêmio
Nobel da Paz.
A revelação está contida no livro
"Dom Hélder Câmara - Entre o
Poder e a Profecia", de Nelson Piletti e Walter Praxedes, de 1997.
Nos últimos anos, por recomendação médica, o arcebispo evitava
falar sobre temas polêmicos.
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