São Paulo, quarta-feira, 29 de novembro de 2006

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À frente da Radiobrás, Bucci critica PT

Presidente da estatal discorda do conceito defendido pela sigla de incentivar veículos de comunicação "independentes"

"A imprensa tem de discutir o governo, não o contrário", afirma o jornalista, que não teve ainda uma definição sobre permanência no cargo


VERA MAGALHÃES
DO PAINEL, EM BRASÍLIA

O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, diz que não cabe ao governo usar verbas de publicidade para dar incentivo a meios de comunicação, discorda do conceito defendido pelo PT de "veículos independentes" e avalia que não cabe ao governo fazer análise de mídia. Para Bucci, não cabe à Radiobrás ser "porta-voz" nem fazer "propaganda" do governo. Ele defende a gestão da empresa, marcada pelo planejamento estratégico e pela "impessoalidade no trato da informação". Bucci entregou o cargo a Lula após a eleição, mas ainda não conversou com ele a respeito.

 

FOLHA - Bernardo Kucinski escreveu artigo em que critica a condução da Radiobrás no governo Lula, dizendo que ela teve "vergonha" de ser estatal. Como responde a isso?
EUGÊNIO BUCCI -
A Radiobrás e seus funcionários jamais tiveram vergonha de ser integrantes de um sistema estatal. A Radiobrás é uma estatal e, portanto, tudo que ela não pode ser é partidária. Sendo uma estatal, ela não pode se arvorar a ser porta-voz da causas que supostamente sejam abraçadas pelos integrantes do governo federal. Não pode fazer assessoria de imprensa, atuar como porta-voz do governo ou fazer propaganda de governo. Essas funções são da administração direta. O vício do governismo é uma face do partidarismo. As falas das autoridades do governo entram nas reportagens da Radiobrás entre aspas, são falas de fontes que nós ouvimos, não são parte de um programa, de uma plataforma expressa da Radiobrás. Ela não existe para assumir a defesa de autoridades, ela existe para bem informar o cidadão.

FOLHA - Como o sr. responde à crítica de que a Radiobrás deixou de construir uma "narrativa própria" do governo Lula?
BUCCI -
O que significa "narrativa própria" de governo? Eu não consigo entender o significado dessa expressão. Quem teria essa incumbência é quem tem a voz do governo. Portanto, quem ocupa postos na administração direta, que é o governo por excelência. Evidentemente que não pode ser o reportariado da Radiobrás o incumbido de estabelecer tal categoria política cujos contornos eu desconheço.

FOLHA - Na crise política a Radiobrás discutiu como cobriria denúncias como o mensalão?
BUCCI -
Com os escândalos de corrupção ou com a cobertura das políticas públicas, o procedimento é o mesmo. Há traços distintivos entre a cobertura geral da mídia e a da Radiobrás. A gente nunca usa uma informação em "off", seja uma declaração, seja um extrato de um documento ou uma imagem. Tudo o que nós publicamos tem origem declarada e tem crédito. Nós não fazemos interpretação, não fazemos opinião, análise, crítica. Damos os fatos, as declarações, os contextos para que o cidadão componha a sua narrativa. Isso é fundamental para entender como nós cobrimos o mensalão: com normalidade, buscando informações oficiais em vários lugares onde isso estava sendo apurado, nas estatais, no Ministério Público ou no Congresso.

FOLHA - Houve alguma ingerência do Palácio do Planalto na Radiobrás?
BUCCI -
Não. Não houve. É importantíssimo que fique claro.

FOLHA - Na eleição, o PT chegou a discutir uma proposta de incentivo a veículos de mídia "independentes". Como o sr. vê essa discussão?
BUCCI -
Acho que deve ser feito um reparo não ao PT, mas ao linguajar que essa discussão acabou consagrando, que é a expressão veículos independentes. Por definição, um veículo jornalístico independente é aquele que extrai os recursos para seu sustento diretamente da sua atividade principal. Um jornal independente é aquele cuja receita de vendas, assinaturas e de publicidade é suficiente para custear sua operação. É independente porque não depende nem de verbas públicas nem da participação privilegiada de um anunciante em particular. Eu acho engraçado porque, nessa discussão, quando se refere a veículos independentes está-se falando justamente de veículos dependentes. Verba de publicidade de governo não pode ser usada para estabelecimento de política de estímulo a veículos de comunicação. O governo, quando compra espaço publicitário, deve seguir critérios técnicos.

FOLHA - Outra idéia no PT é a de que a imprensa deve fazer uma auto-reflexão da cobertura do governo Lula e das eleições. O sr. concorda?
BUCCI -
Quem tem de discutir a imprensa não é o governo. A imprensa tem de discutir o governo, mas não o contrário.


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