São Paulo, sábado, 29 de dezembro de 2007

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Dossiê lista brasileiros sumidos na era Condor

Comissão relaciona 6 pessoas que desapareceram na Argentina como possíveis alvos do acordo entre as ditaduras militares

Em contrapartida, sete argentinos sumiram no Brasil de 1975, ano que é considerado o de início da operação conjunta, a 1980

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A nova edição do "Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos a partir de 1964", organizado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, lista pelo menos seis brasileiros que desapareceram na Argentina como possíveis alvos da Operação Condor, acordo entre as ditaduras do Cone Sul nos anos 70 para combater opositores. Em contrapartida, pelo menos sete argentinos desapareceram no Brasil entre 1975 e 1980, segundo o levantamento da comissão, que deverá ser lançado em 2008.
Os brasileiros desaparecidos na Argentina pós-75, quando a Condor foi oficiosamente criada, são Francisco Tenório Cerqueira Júnior (1976), Roberto Rascardo Rodrigues (1977), Luiz Renato do Lago Faria (1980), Maria Regina Marcondes Pinto de Espinosa (1976), Sidney Fix Marques dos Santos (1976) e Walter Kenneth Nelson Fleury (1976).
Os argentinos sumidos no Brasil são Norberto Armando Habegger (1978), Lorenzo Ismael Viñas (1980), Horacio Domingo Campiglia (1980), Mónica Susana Pinus de Binstock (1980), Jose Oscar Adur (1980), Liliana Inês Goldemberg (1980) e Eduardo Gonzalo Escabosa (1980). Os casos de Viñas e Campiglia passaram a ser investigados pela Justiça italiana no final dos anos 90 porque eles tinham dupla cidadania.
O primeiro desapareceu ao cruzar a fronteira da Argentina com o Brasil, de ônibus, perto de Uruguaiana (RS), e o segundo foi seqüestrado no aeroporto do Galeão, no Rio, junto com a guerrilheira Mónica Binstock. O processo na Itália resultou, no dia 24, em ordens de captura internacional emitidas pela Justiça italiana contra pelo menos 11 militares e policiais brasileiros. Os outros casos de argentinos desaparecidos no contexto da Operação Condor são investigados pela Justiça argentina. No Brasil, não há registro de processo criminal sobre o assunto.

"Pré-Condor"
A primeira edição do dossiê formulado pela comissão dos mortos e desaparecidos, de 1995, serviu de base para a lei 9.140/95, que regulou o reconhecimento da responsabilidade estatal por mortes e desaparecimentos por motivação política ocorridos entre 1961 e agosto de 1979. A nova edição listará, ao todo, cerca de 402 mortos e desaparecidos.
Segundo a historiadora Janaína Teles, membro da comissão e doutoranda em história pela USP, o levantamento se baseia em documentos oficiais e em relatos de testemunhas. Janaína é sobrinha de Criméia Almeida, que foi guerrilheira no Araguaia (1972-1974) e também integra a entidade.
No trecho sobre a Condor, a comissão destaca o pouco acesso a documentos militares brasileiros relativos à operação.
"A participação brasileira na operação foi mais restrita, embora não seja conhecida devido ao sigilo dos documentos militares no Brasil. Isto ocorreu em decorrência da dinâmica da chamada "distensão política", promovida pelo governo do general Ernesto Geisel, e pelo desprezo que os militares brasileiros nutriam pelos serviços de inteligências dos demais países. Sabe-se, porém, que ainda era grande a preocupação dos brasileiros com a Junta de Coordenação Revolucionária, idealizada em 1972 pelos grupos MIR (Movimiento de Izquierda Revolucionaria, do Chile), Tupamaros (Uruguai) e ERP (Ejército Revolucionário Del Pueblo, da Argentina), e que contava com a participação do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), do Brasil", aponta o dossiê.
O levantamento sugere que outras atividades conjuntas de países sob ditadura já haviam eliminado brasileiros no exterior. Documentos liberados recentemente citam, por exemplo, uma "Operação Mercúrio", que estaria por trás do desaparecimento, em janeiro de 1974, dos guerrilheiros brasileiros João Batista Rita Pereda e Joaquim Pires Cerveira. Nessa fase pré-Condor, outros seis brasileiros desapareceram no Chile entre 1973 e 1974: Antenor Machado dos Santos (1973), Jane Vanini (1974), Luis Carlos de Almeida (1973), Nelson Souza Kohl (1973), Túlio Roberto Cardoso Quintiliano (1973) e Wânio José de Matos (1973). Outro brasileiro, Luiz Renato Pires de Almeida, desapareceu na Bolívia em outubro de 1970.


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