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ADMINISTRAÇÃO
Proposta do governo que cria critério social para compras públicas é inconstitucional, segundo especialistas
Projeto que muda lei de licitação é criticado
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
Especialistas em licitação afirmam que o projeto de lei do governo que visa favorecer pequenas empresas e fornecedores locais nas licitações públicas não
pode ser aprovado pelo Congresso porque fere a Constituição.
A Folha mostrou ontem que a
proposta, ainda em elaboração,
prevê que União, Estados e municípios devem considerar critérios
sociais na hora das compras, o
que inclui pagar mais caro por
produtos e serviços, mas obter benefícios como empregos e desenvolvimento do comércio local.
Segundo especialistas, beneficiar um concorrente fere o princípio constitucional da isonomia
(igualdade de todos perante a lei).
"Isso é um absurdo. É absolutamente inconstitucional. Já há até
uma jurisprudência maciça no
Supremo Tribunal Federal dizendo que ninguém pode ter preferência", diz o advogado Toshio
Mukai, especializado em licitações públicas.
A legislação (lei 8.666/1993) estabelece que "a licitação destina-se a garantir a observância do
princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais
vantajosa para a administração".
Para o advogado, a proposta
-que o governo pretende enviar
ao Congresso ainda neste ano- é
"populista". "Viola o próprio
conceito de licitação, que existe
para o governo economizar e gastar bem o dinheiro público, não
para ficar criando emprego."
O professor da Fatec (Faculdade
de Tecnologia) e consultor de licitações Paulo Boselli também afirma que o projeto é inconstitucional, mas não duvida que ele seja
aprovado. "A força do governo
faz passar qualquer coisa", diz.
Segundo ele, usar licitações não
é o caminho certo para estimular
a economia local. Sugere que se
acabe com a "enxurrada de burocracia" dos processos licitatórios.
"Para uma empresa pequena, é
extremamente caro e complicado
participar de uma concorrência.
Tem que contratar despachante,
ter 20 documentos em ordem...
Além disso, o poder público tem o
péssimo hábito de não pagar em
dia", diz Boselli.
Cade
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que
tem entre suas atribuições proteger a concorrência, diz que é preciso esperar que o texto do projeto
fique pronto, mas já prevê que pode haver problemas.
"As pessoas que fazem os projetos não são deuses e podem errar", diz o presidente do órgão,
João Grandino Rodas, acrescentando que o Cade alertará para
eventuais problemas.
Para ele, com base no que foi
adiantado pelo governo, a proposta "acende um sinal de preocupação": "É válido considerar o
critério social na licitação, mas
desde que se preserve minimamente a concorrência".
O Tribunal de Contas da União,
que fiscaliza os recursos federais,
também vê o projeto com ressalvas. "Em princípio, a idéia é interessante, porque seria uma forma
de prestigiar as pequenas empresas", diz o ministro Valmir Campelo, presidente do TCU. "Mas a
idéia deve ser precedida por uma
ampla discussão."
O projeto de lei é motivo de especial preocupação para os empreiteiros. "Há outras formas de
incentivar as pequenas empresas", diz Carlos Eduardo Lima
Jorge, diretor-executivo da Apeop
(Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas), que reúne
cerca de 300 construtoras que
executam obras no Estado de São
Paulo. Algumas têm sede em outros Estados e seriam as mais afetadas pela mudança na lei.
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