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QUESTÃO AGRÁRIA
No Maranhão, fábrica de papel demitiu 1.300 funcionários e fez a cidade de Coelho Neto entrar em crise
Eucalipto valoriza terras da Bahia em 267%
LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM TEIXEIRA DE FREITAS
A presença de grandes fabricantes de celulose no sul e extremo
sul da Bahia trouxe duas conseqüências imediatas: a explosão do
preço da terra e a monocultura do
eucalipto. Desde 2004, quando
Aracruz, Suzano e Veracel aumentaram as compras de pequenas e grandes propriedades para
plantar eucalipto, o preço médio
de um hectare subiu 266,6%, passando de R$ 1.200 para R$ 4.400.
Juntas, as empresas detêm cerca
de 500 mil ha da matéria-prima
para a fabricação da celulose
plantados em 30 cidades (cada ha
possui 10 mil m2). Duas operam
na Bahia -Suzano e Veracel. A
Aracruz, embora com unidade no
Espírito Santo, também tem uma
grande área plantada no Estado.
As empresas também encontraram uma solução para ampliar as
suas presenças na Bahia e reduzir
custos -o fomento, um financiamento concedido aos produtores
interessados em plantar eucalipto. Veracel, Aracruz e Suzano
transferem para os agricultores a
responsabilidade do plantio.
"O fomento, na realidade, é
uma estratégia adotada pelas empresas para evitar as invasões, reduzir a pressão social e diminuir
os seus custos, pois não precisam
contratar empregados. Mas também prende o homem à terra e divide a riqueza", disse Fábio Zanon
Dall'Orto, gerente regional da Superintendência de Desenvolvimento Industrial e Comercial.
Desde abril de 2004, data da primeira ação na Veracel, o MST
(Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra) já invadiu propriedades da Aracruz e da Suzano. Nesta empresa, a última invasão terminou na quinta-feira,
com a saída de 3.500 sem-terra.
Com o fomento, as três empresas repassam aos produtores cerca de R$ 1.750 por hectare plantado e fornecem gratuitamente assistência técnica, mudas, formicidas e insumos. Na assinatura do
contrato, o valor do adiantamento é transformado em dívida que
deve ser paga em metro cúbico de
madeira depois de seis anos (período entre o plantio e o corte).
Na semana passada, as três empresas pagavam, em média, R$
52,84 por metro cúbico. "Quem
faz as contas percebe que o negócio é altamente lucrativo porque
um hectare de eucalipto na região
produz no mínimo 240 metros
cúbicos. Ou seja, além de receber
adiantado, o dono da terra lucra
mais adiante", disse Dall'Orto.
No contrato, as empresas estabelecem que 97% da produção
deve ser necessariamente vendida
à indústria que fez o adiantamento, "pelo preço de mercado".
"Não somos ingênuos e sabemos que o nosso futuro está nas
mãos dessas empresas, mas,
atualmente, o negócio é mesmo
muito lucrativo", disse Pedro Augusto Graça de Carvalho, presidente da Aciatef (Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Teixeira de Freitas). "Nós
também sabemos que, com o fomento, as empresas aumentam a
sua influência na região sem comprar terras e "amarram" os produtores que aderirem ao sistema."
O diretor florestal da Veracel,
Antonio Sergio Alipio, tranqüiliza
os proprietários. "O plano estratégico da empresa prevê a compra
de 20% de eucalipto dos fomentados. Nós não compramos as terras e não plantamos as florestas,
mas precisamos da madeira."
No ano passado, a Veracel inaugurou a sua fábrica de celulose em
Eunápolis (BA), num investimento de US$ 1,250 bilhão. A Suzano
também está investindo US$ 1,3
bilhão na ampliação e modernização da fábrica de Mucuri (BA).
Mas Alípio admite risco no fomento. "Nós celebramos um contrato. É claro que há riscos. Por
exemplo, se houver uma perda de
toda a produção ou mesmo de
parte dela e constatarmos que o
produtor não seguiu as nossas recomendações, o ônus, sem discussão, é do proprietário."
Dos cerca de 500 mil ha plantados de eucalipto nas duas regiões
da Bahia, cerca de 100 mil ha são
de fomento, segundo a Sudic.
Maranhão
O município de Coelho Neto
(MA) hoje é um exemplo de "deserto verde". Lá não há eucaliptos,
mas uma grande floresta de bambu (cerca de 60 mil hectares) e
plantações de cana-de-açúcar. Ao
menos 80% das terras do município são ocupadas pelas duas culturas, exploradas pelo mesmo
grupo empresarial. Por conta disso, 82% da população de 47 mil
habitantes mora na área urbana.
"Até o tomate que se compra
em Coelho Neto vem de outros locais porque não há terra", disse o
prefeito Magno Bacelar (PV). A
família de Bacelar fundou nas décadas de 60 e 70 a usina de álcool e
a fábrica de papel e celulose. Mais
tarde, as empresas passaram para
um grupo de Pernambuco.
A situação da cidade ficou crítica no início deste ano, quando a
unidade de papel foi desativada:
1.300 funcionários foram demitidos. O município está em situação
de emergência. A fábrica impulsionava a economia local, apesar
de recolher poucos impostos, pois
gozava de isenções fiscais. "Cerca
de 70% da economia do município gira em torno da empresa",
disse Bacelar. "Afetou do quem
vende picolé até o vendedor de
passagens de ônibus." Segundo o
prefeito, o município não tem como criar alternativas sem a ajuda
dos governos estadual e federal.
Colaborou SÍLVIA FREIRE, da Agência
Folha
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