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ELIO GASPARI
Há um grande livro na praça, é "Pós-Guerra'
Tony Judt escreveu uma preciosa história da Europa, da ruína de 1945 à prosperidade de hoje
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SAIU UM DAQUELES livros que
entram na vida de quem os lê e
não saem mais. É "Pós-Guerra
- Uma História da Europa desde
1945", do professor anglo-americano Tony Judt. São 848 páginas (1,2
kg) com o majestoso painel de um
mundo que em pouco mais de meio
século passou da ruína ao controle
de mais de um terço da produção
mundial. A Segunda Guerra custou à
Europa 36 milhões de vidas e desalojou 30 milhões de pessoas. Hoje a
União Européia forma um bloco de
500 milhões de cidadãos livres, educados e prósperos, capazes de fazer
do século 21 sua hora e vez.
"Pós-Guerra" será útil para quem
não viveu o período, pois passa longe
da matraca das falsificações produzidas durante a Guerra Fria . Judt vira pelo avesso diversas certezas. Stálin poderia invadir a Europa? Difícil.
Em 1946, o generalíssimo cometeu
um dos erros de sua vida. Achava
que a guerra era inevitável, mas teria
os Estados Unidos de um lado, a Inglaterra de outro e ele de fora. Entre
1945 e 1947, a União Soviética baixou seu efetivo militar de 11,4 milhões para 2,9 milhões de soldados.
Socialismo? Não houve esse tipo de
coisa, o que existiu foi o estado ditatorial leninista.
Judt parece um malabar da política, da economia e da cultura. Vai da
filosofia (o escritor francês Jean
Paul Sartre chamava a violência comunista de "humanismo proletário") ao cinema (a Ponte do Rio
Kwai é um sinal de que os ingleses
passaram a ver a guerra de outra forma).
Quando joga números no meio da
narrativa, consegue o improvável:
aumenta o prazer da leitura. Algumas vezes surpreende: a guerra destruiu apenas 20% da capacidade industrial da Alemanha e tanto ela
quanto a Itália, a França, o Japão
saíram com mais máquinas e equipamentos do que tinham antes do
conflito. A Alemanha administrou a
França mandando para lá apenas
1.500 funcionários. (Em 1953, a máquina de propaganda do governo
americano tinha 13 mil empregados.)
"Pós-Guerra" conta a história de
duas Europas. A Ocidental, vigorosa,
e a socialista, estagnada. Em 1957, só
2% das casas italianas tinham geladeira. Em 1974, eram 94%. Segundo
Judt, diversos fatores contribuíram
para o renascimento europeu, da
ajuda americana à liberalização do
comércio. Mesmo assim, decisivos
mesmo foram o otimismo e o leite
grátis. Mais gente, mais trabalhadores, mais produtos e mais consumidores transformaram as cidades arruinadas na Europa moderna.
O livro tem dois capítulos excepcionais. "O fantasma da Revolução"
conta os anos 60 da juventude do
Ocidente. O seguinte, "O fim de caso" narra os 60 do outro lado do Muro. Judt desmonta a mitologia sessentona com muita erudição, alguma ironia e nenhuma piedade. Ele
gosta mais da garotada de Praga do
que dos cabeludos de Paris. Sua conclusão: "Os 60 acabaram mal em todos os lugares".
Dois personagens do fim do século
estão muito bem retratados. Margaret Thatcher, por quem Judt tem
uma ponta de admiração, mesmo
detestando sua política, e Mikhail
Gobarchev, a quem maltrata, gostando do que fez. O governante soviético admitia que tocassem rock,
desde que fosse "melodioso, coerente e bem executado". "Era isso que
Gorbachev queria, um comunismo
melodioso, coerente e bem executado", diz Judt.
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