São Paulo, sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO

Foro especial não se confunde com privilégio

LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A PROPOSTA de emenda constitucional (PEC) que acaba com o foro especial para autoridades acusadas de crime é um monstrengo.
Hoje, deputados são julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Governadores e desembargadores, pelo Superior Tribunal de Justiça. Prefeitos e juízes, pelos Tribunais de Justiça de cada Estado. É assim porque, em tese, órgãos colegiados são mais imunes a pressão política ou corporativa.
Foro privilegiado não se confunde com privilégio, com vantagem. O mecanismo tem por objetivo garantir a autoridades públicas julgamento imparcial. Procura proteger o eventual réu de perseguições locais. E elas existem. Procura impedir que o prestígio e o poder local de autoridades impeçam a realização da Justiça.
Reclama-se da falta do duplo grau de jurisdição nos julgamentos das autoridades, diferentemente dos processos comuns. Não há apelação, a decisão é definitiva. Mas, em contrapartida, o julgamento se dá pelo plenário do tribunal. No STF, um parlamentar condenado não tem a quem recorrer, mas de seu julgamento participam todos os ministros.
Há quem afirme que o Supremo Tribunal Federal nunca condenou ninguém, mas a impunidade não é argumento para a mudança. O andamento dos processos em primeira instância não é garantia de nada.
O poder de pressão de um senador contra um juiz singular é na teoria maior e, num país como o Brasil, ainda contaminado pelo coronelismo, teria bastante eficácia. Por outro lado, o ativismo de promotores, procuradores e juízes que se deixam levar pelo embalo do partidarismo ideológico e da notoriedade jornalística é algo que pode atingir a própria governabilidade.
A PEC 130/2007 estabelece um grau de controle processual esdrúxulo, sem precedente no sistema judicial em vigor, e que prolongaria ainda mais os processos. Pela proposta, os tribunais, que hoje têm competência para julgar, ficariam só com a atribuição de abrir a ação penal e de autorizar investigações envolvendo a quebra de sigilo. Ora, se o juiz tem o poder de condenar e absolver, por que não poderia ele próprio decidir sobre a necessidade de interceptação telefônica? Não faz sentido.
Mudanças constitucionais não podem ser marcadas pelo casuísmo. A PEC tramita desde 2007, provavelmente estimulada por alguma decisão impopular, mas, segundo reportagem da Folha de ontem, réus do mensalão diretamente interessados em tirar o processo do STF estariam atuando para a sua aprovação. Coisa de república de banana.
O STF, o STJ e os Tribunais de Justiça estão aparelhados para cumprir seu dever. Não há justificativa para que os processos se arrastem como hoje acontece. O problema é de vontade política.


Texto Anterior: Depoimento: Jefferson falou sobre mensalão a Lula, afirma Chinaglia
Próximo Texto: Mendes diz que CNJ vai criar "Siafi do Judiciário"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.