São Paulo, domingo, 30 de novembro de 2008

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ELIO GASPARI

Há um ano Jobim promete, mas não entrega


Os poderes da aerocracia engavetaram no Planalto o projeto de ressarcimento dos passageiros


NESTA SEMANA completa-se um ano do dia em que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, anunciou à patuléia que as empresas aéreas seriam obrigadas a ressarcir os passageiros por conta de atrasos, cancelamento de vôos e overbooking. Num exemplo, o cliente que penasse um atraso de três a quatro horas num vôo do Rio a Brasília seria indenizado com R$ 198, em dinheiro ou milhas. A tabela entraria em vigor logo depois do Carnaval, com a edição de uma medida provisória.
O ano está no fim e o doutor voltou a falar em tráfego aéreo, prometendo serviços regulares durante o movimento das festas. É a "Operação Feliz 2009". Tomara que dê certo, mas cadê o projeto do ressarcimento de 2007?
Quem acreditou em Jobim fez papel de bobo, porque maiores foram os poderes da aerocracia. O papel de paspalho é um risco a que se submete qualquer pessoa que acredita no governo, mas as justificativas oferecidas para a propaganda enganosa exigem que o paspalho se transforme num quadrúpede.
A política de ressarcimento não teria entrado em vigor porque a situação normalizou-se. Tolice. A compensação deveria vigorar exatamente numa situação de normalidade. Isso ajudaria na implantação da novidade sem massacrar as empresas.
Como o Congresso reviu sua docilidade diante da emissão de medidas provisórias, o governo teria decidido enviar um projeto de lei ao Congresso. Bingo. Nesse caso, a menos que haja interesse do Planalto e um acordo de lideranças, a tramitação no Legislativo consome pelo menos um ano. Por que o anteprojeto continua no gaveteiro da comissária Dilma Rousseff?
Há ainda o argumento da complexidade da questão. Ela exigiria estudos e debates. Tudo bem, então o ministro Jobim não deveria ter feito um overbooking de expectativas que não podia atender.
As coisas ficariam mais fáceis se o governo admitisse que as companhias aéreas não querem ressarcir os passageiros a quem vitimam. Nos Estados Unidos e na Europa, elas aceitam esse tipo de compromisso, mas como o Brasil foi um dos últimos países do mundo a adotar programas de milhagem, não se pode esperar que os aerotecas abandonem seus aliados.

PAPAI ALI BABÁ
Está na pauta de votações da Câmara dos Deputados um projeto de emenda constitucional (130-B) que altera o rito processual do julgamento dos parlamentares acusados de malfeitorias. Hoje eles são denunciados ao Supremo Tribunal Federal. Uma vez aceita a denúncia, o STF os julga, sem direito a recurso. Pela proposta, caberá ao Supremo aceitar ou não a denúncia, mas depois disso a papelada desce ao juízo de primeira instância, iniciando-se uma lenga-lenga que pode durar dez anos. Com a aprovação da emenda retornam à mansidão das comarcas e ao paraíso dos recursos os processos dos mensalões do PT (40 companheiros) e do tucanato mineiro (27 bicudos).

TRÊS E NADA
De um velho administrador de crises econômicas e intrigas palacianas: "Barack Obama precisava escolher um nome para enfrentar a crise econômica. Escolheu três: Timothy Geithner, um habilidoso quadro do Fed, Lawrence Summers, um economista talentoso de temperamento abrasivo, e criou um novo conselho de sábios para o terceiro, Paul Volcker, imponente ex-presidente do Fed. Meu medo é que sejam necessários seis meses para descobrirmos quem manda, em que direção". Do mesmo sábio: "Em 1933, ao tomar posse, com o sistema financeiro aos frangalhos, Franklin Roosevelt disse que "a única coisa de que devemos ter medo é do próprio medo". Obama precisa descobrir uma maneira de dizer a mesma coisa".

MANGABEIRA 2008
A cada dia são mais doces as lembranças que o professor Mangabeira Unger tem do seu ex-aluno Barack Obama na Faculdade de Direito de Harvard.
Em 2005 a opinião do mestre era seca: um quadro interessado em servir ao sistema.

UM VENENO TUCANO PARA A PETROBRAS

A oposição tucana no Senado fez uma tempestade num copo de veneno. No dia 31 de outubro a Petrobras tomou emprestados R$ 2 bilhões na Caixa Econômica por 180 dias, a juros de mercado. Se uma empresa que tem R$ 11 bilhões em caixa e gira em torno de R$ 4 bilhões por mês decide fazer um papagaio de R$ 2 bilhões, nada há de estranho nisso. Grosseiramente, é como se um cidadão que tem R$ 5.000 aplicados e ganha R$ 2.000 mensais resolve pedir ao banco um empréstimo de R$ 1.000.
A Petrobras fez o empréstimo pelos motivos mais elementares. Precisava do dinheiro para despesas imediatas, e o crédito secara. (Em outubro ela recolheu R$ 4,7 bilhões de impostos e royalties.) Tanto o empréstimo da Caixa, como outro feito no Banco do Brasil (R$ 751 milhões), foram triviais, sem nada a ver com juros subsidiados.
É tóxico o argumento segundo o qual a Caixa não deveria emprestar à Petrobras porque esta não não é sua função. Ela financia programas de saneamento a 9,5% ao ano, e a carteira que em outubro emprestou à Petrobras a 14,1% nada tem a ver com a conta da infra-estrutura. A Caixa fechará novembro com R$ 4,2 bilhões de empréstimos comerciais a empresas.
Pena que a marquetagem da Petrobras insista em dizer que seu plano de investimentos está inalterado. Se é assim, foi concebido por aloprados, pois lidava com a exploração de poços cuja produção pode custar até US$ 80 por barril. Bom negócio com o petróleo a US$ 150. Como o barril está a US$ 55, basta fazer a conta.

GILMARNET
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, vem recebendo uma envaidecedora superexposição de seu comissariado de informações. O sítio do STF tem um espaço destinado a "artigos e discursos" dos ministros. Desde abril, quando Mendes assumiu a presidência da corte, listaram-se ali 20 obras suas, dez das quais proferidas no exterior. Nesse período, foram quatro os textos e discursos dos outros dez juízes. (John Roberts, que preside a Corte Suprema dos EUA desde 2005, ainda não listou artigo ou palestra na página de seu tribunal.)

EXEMPLO TUCANO
É ensurdecedor o silêncio do tucanato diante do processo de cassação do mandato do governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima. Não disseram uma palavra louvando o Judiciário, quando ele foi posto para fora, muito menos defendendo-o. Persistiram em obsequioso silêncio mesmo depois que Cunha Lima decidiu anarquizar as finanças do Estado. Se o partido não quer falar, tudo bem, mas a dissimulação de José Serra e Aécio Neves não cai bem nas biografias de candidatos a presidente da República.

FORÇA CATARINENSE
Uma vinheta ilustrativa da capacidade dos catarinenses de superar desastres. Em 1878 o alemão Bruno Hering chegou ao vilarejo de Blumenau e comprou um tear. Dois anos depois uma enchente levou o que tinha. Conseguiu dinheiro emprestado e foi em frente. Um século depois a Hering era uma das maiores empresas do setor têxtil brasileiro. A empresa mobilizou-se para proteger seus funcionários e sua página na internet está recolhendo contribuições para as vítimas da enchente.


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