São Paulo, segunda-feira, 30 de dezembro de 2002

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CONGRESSO

Presidente eleito terá de negociar para conseguir aprovar uma agenda de reformas complexa e muitas vezes impopular

Sem maioria, Lula tenta resistir ao "balcão"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DO PAINEL EM BRASÍLIA

Ao vetar a presença do PMDB no ministério em troca de votos, o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, sinalizou que pretende sanear as relações do novo governo com o Congresso. Em contrapartida, assumiu o risco de tentar fazer maioria consistente sem recorrer ao velho balcão de negócios do Planalto.
É um risco real. Com o PMDB, Lula daria a largada com o apoio institucional de 302 deputados e 51 senadores. Sem o PMDB, a base de sustentação parlamentar do novo governo é de 228 deputados e 31 senadores. É menos que a maioria simples de 257 votos na Câmara e de 41 votos no Senado.
Estabelecer uma relação institucional com o Congresso era também a intenção de FHC na gênese de seu governo, ao criar um conselho político com os presidentes dos partidos que o apoiavam -durou pouco mais de um trimestre. Logo FHC reabriria o balcão para negociar cada votação.
O próprio PT passou por uma experiência pedagógica no mês passado, durante a votação da medida provisória 66: para aumentar impostos e equilibrar o Orçamento de 2003, teve de ceder em assuntos caros, como a aprovação do foro privilegiado.
A diferença entre FHC e Lula é o tamanho da base no início do mandato -o tucano dispôs do apoio formal das maiores forças partidárias, que, ainda agora, somam 332 deputados, com PSDB, PFL, PMDB e PPB -suficiente para aprovar uma emenda constitucional na Câmara (308 votos).
O desafio do novo governo será aprovar uma agenda complexa, que inclui as reformas fiscal, política, trabalhista e sindical e previdenciária. A unificação do teto de aposentadoria dos setores público e privado, por exemplo, é pauta que pode provocar deserções na base de sustentação petista.
Restará ao presidente ir buscar os votos nos demais partidos. A margem de manobra petista deve se reduzir ainda mais se for confirmada a criação do bloco PSDB-PFL (155 deputados e 30 senadores) para a defesa programática das idéias do mandato de FHC. Mas nesses partidos Lula pode reunir forças para enfrentar o corporativismo interno.
"O PFL deve defender as suas posições de sempre. Se coincidirem com as propostas de Lula, nada tão natural como votar a favor. Se não coincidirem, votará como sempre votou em suas propostas e contra as divergentes", diz o prefeito do Rio, César Maia. E o PSDB admite votar as reformas que FHC não pôde fazer.
Mesmo no PMDB é dado como certo que pelo menos 40% dos seus 74 deputados votem com o governo. É a dissidência clássica da legenda, que na eleição já esteve com Lula. Mas esse percentual pode ser maior: no atual comando partidário, há quem defenda que o partido, pelo menos no primeiro ano, deve apoiar Lula.
O risco é a precariedade da base parlamentar lulista, que o deixará sujeito a eventuais pressões do Congresso. "A ausência de uma maioria sólida torna mais precário o apoio. Logo pode voltar o bom e velho balcão, igual ou pior do que com FHC", diz o cientista político Paulo Kramer, da Kramer & Ornelas Consultoria.
Kramer, a exemplo de outros cientistas políticos, acredita que Lula terá uma lua-de-mel generosa com o Congresso, entre oito meses e um ano. "A vitória alimenta a vitória. Mas basta a máquina emperrar um pouco para a base cobrar seu preço."
"É penoso para quem está do lado de dentro do balcão, angustiante para quem está de fora e provoca irritação na sociedade sem limites", diz o deputado eleito Moreira Franco (PMDB-RJ). (RAYMUNDO COSTA e OTÁVIO CABRAL)


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