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Juros não caem porque Lula teme o mercado, diz Alencar
Vice-presidente acrescenta, porém, que petista "é um sujeito ultra-responsável'
Ele diz que Lula sabe da sua posição sobre juros ("Claro que sabe, eu falo isso sem parar, né'), mas nunca lhe pediu para ficar em silêncio
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Crítico recorrente dos juros
altos, o vice-presidente José
Alencar Gomes da Silva disse à
Folha que eles não caem mais
porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem "medo"
das ameaças feitas por economistas de mercado de que isso
causaria uma "inflação violenta" no país.
A alfinetada no colega, contudo, é logo seguida de elogios
pelo comportamento "ajuizado" do petista. "O Lula é um sujeito ultra-responsável, ele tem
preocupação que [uma queda
forte dos juros] pudesse trazer
uma inflação brutal."
Ao final da entrevista, feita
na véspera de Natal, já com o
gravador desligado, José Alencar faz questão de destacar que
gosta muito do presidente Lula,
tem um grande reconhecimento do valor dele e que sempre
será seu amigo.
Isso, segundo ele, não o impede de fazer suas críticas aos
juros altos. "Ele não pode me
demitir, então falo com absoluta isenção e independência."
Diz, porém, que pára de falar de
juros no dia que o presidente fizer tal pedido. "Eu não falaria
mais, mas nunca me pediu."
Leia a seguir os principais
trechos da entrevista concedida pelo vice-presidente em Belo Horizonte, no escritório de
sua empresa, a Coteminas:
FOLHA - O sr. sempre foi um crítico
dos juros altos. Nos últimos tempos,
parou de criticar. O que aconteceu?
JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA - Eu
não mudei nada. Eu nunca deixei de condenar. A inflação não
era de demanda, não exigia taxas de juros daquele patamar [a
taxa Selic chegou a 26,5% ao
ano no início do primeiro mandato] para combatê-la.
FOLHA - Por que o sr. acha que o
governo não resolveu essa questão
dos juros altos?
ALENCAR - Porque há uma
ameaça de articulistas, que são
economistas ligados ao sistema
financeiro, que é muito organizado, e que colocam quase que
como alternativa: ou nós mantemos esses juros ou mais uma
vez vamos ter uma inflação violenta no país.
FOLHA - Estão surgindo pressões
inflacionárias por causa da forte demanda. Se o Copom (Conselho de
Política Monetária) subir os juros, o
sr. ficará frustrado?
ALENCAR - Eu nunca critiquei o
Copom diretamente, ele não
tem responsabilidade nenhuma perante à nação.
FOLHA - Quem tem?
ALENCAR - Quem tem é o governo, o presidente da República, é
ele quem tem de dar a determinação para que as taxas de juros
sejam essas. Agora, se ele não
quer fazer diretamente, porque
tem medo desses que o ameaçam com inflação, então que ele
fortaleça, enriqueça o Conselho Monetário Nacional [que
define a meta de inflação anual
a ser perseguida pelo Banco
Central].
FOLHA - Por que o sr. acha que ele
não faz isso?
ALENCAR - Por que o Lula é um
sujeito ultra-responsável, tem
preocupação que pudesse trazer uma inflação brutal.
FOLHA - Não estou entendendo. O
sr. diz que ele é responsável, preocupado com a inflação, mas diz que é o
responsável pelos juros altos...
ALENCAR - Veja bem, cada um
de nós tem sua característica, o
presidente da República não
tem o dever de ser familiarizado com todas as questões. Por
exemplo, não acredito que haja
nenhum cientista político que
conheça mais política do que o
Lula. No campo social, não
existe nenhum presidente mais
responsável e sensível do que
ele. É um craque.
FOLHA - O sr. diz que o Lula é um
craque na área política e social, mas
na econômica...
ALENCAR - Na área econômica
ele tem a preocupação com a
inflação. E como eles batem,
batem, batem, ele acredita então que graças a essa política
monetária, de taxa de juros elevadas, é que nós temos a inflação baixa no Brasil. Ele acha isso.
FOLHA - O sr. concorda?
ALENCAR - Não, eu discordo
frontalmente. Por quê? Porque
isso é graças ao equilíbrio orçamentário, e não à política monetária.
FOLHA - O sr. conversa sobre isso
com o presidente?
ALENCAR - Eu e o Lula nos entendemos muito bem, ele sabe
dessa minha encrenca com relação aos juros. Claro que sabe,
eu falo isso sem parar, né, então
ele sabe. Ele nunca me pediu
que não falasse. E digo para você, se ele tivesse pedido, eu não
falaria mais, mas nunca me pediu.
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