São Paulo, terça-feira, 31 de maio de 2005

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SABATINA FOLHA

Ministro afirma que nível de corrupção não é maior do que no governo anterior e vê dificuldades em conciliar reformismo e status quo

PT e PSDB deveriam estar juntos, diz Gil

Tuca Vieira/Folha Imagem
O ministro da Cultura, Gilberto Gil, na sabatina da Folha ontem, quando respondeu a perguntas de jornalistas e da platéia por duas horas


DA REPORTAGEM LOCAL

O ministro da Cultura, Gilberto Gil, disse ontem que "tem muita gente querendo" que ele deixe o ministério. "Mas eu não quero. Só deixaria se o presidente Lula quisesse." Para Gil, o PT e o PSDB, hoje em posições antagônicas, "não deviam se "oposicionar". O que deveriam é estar juntos".
Terceiro entrevistado de uma série de sabatinas promovidas pela Folha, Gil afirmou que não se arrepende de ter aceito o ministério e que não está decepcionado com o desempenho do governo.
"Não me decepcionei, pois sei que as coisas são complicadas. Não é fácil conciliar o ideário reformista, quase revolucionário, com o status quo e com a defesa de interesses arraigados", disse.
Depois de apoiar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nas eleições de 1994 e 1998, Gil, 62, disse que declarou seu voto em Lula em 2002 para que a "coisa tivesse um rodízio".
"Era interessante para o país que as forças que historicamente estavam ao redor de Lula e do centro para esquerda chegassem ao poder." O PT era, na sua opinião, "a única grande força progressista popular que ainda não tinha chegado lá".
"O Chico Buarque já disse que havia contra Lula todo um setor que torcia nariz e anunciava um desastre que não se comprovou. Ele [Lula] foi suficientemente hábil para atrair para o campo da consideração e do entendimento os seus valores republicanos e fazer com isso o melhor para o país", disse o ministro, que é filiado ao PV -partido que abandonou a base de apoio governista.
Para Gil, os "níveis de corrupção atuais não estão nada acima dos índices do governo anterior, que também foi assolado por denúncias, mas é a sociedade brasileira que tem de mudar isso. Não é um problema só do governo".
A sabatina com Gilberto Gil durou duas horas e foi marcada por forte participação espontânea da platéia, de cerca de 280 pessoas. A entrevista foi coordenada pelo jornalista Marcos Augusto Gonçalves, editor de Opinião da Folha, e teve como entrevistadores Fernando de Barros e Silva, editor de Brasil, Mário Cesar Carvalho, repórter especial, e Arthur Nestrovski, editor da Publifolha e crítico de música do jornal.
Pouco antes do final, o diretor de teatro José Celso Martinez Corrêa, que estava na platéia, fez uma apologia à presença de Gil no Ministério da Cultura e foi aplaudido por todos os presentes. Minutos depois, ao final, Gil pediu um violão e deu uma rápida canja, cantando a música "De Manhã".
A canção, de Caetano Veloso, foi gravada pela primeira vez em 1965 por Maria Bethânia em um compacto junto com "Carcará".
Durante a sabatina, Gil foi questionado se sentia-se confortável no cargo de ministro mesmo tendo sofrido um corte de cerca de 57% no orçamento de sua pasta. "Estou tentando fazer desse limão uma limonada", disse.
"A situação [de falta de recursos] não é novidade específica do governo Lula. Vou fazendo as coisas na medida que tento aumentar nosso orçamento. Na medida em que puder ficar e que as dificuldades não forem incontornáveis, eu fico.Vou tentando convencer os menos convencidos no governo", afirmou. Segundo ele, os "menos convencidos" são os membros da equipe econômica.
"Os ministros que lidam com o dinheiro são "convencíveis" apenas com números, e a falta deles na área da cultura, abrangentes e confiáveis e que representem radiografias, é uma falha." Logo depois, Gil diria que a atual política econômica deixa "angustiado o próprio presidente Lula".
Segundo Gil, a carência de recursos em sua área tem levado o ministério a se deslocar para outras áreas. "Estamos tentando fazer uma reposição da questão cultural. Entender o que é seu dinamismo, seu processo de transformação e aceleração. Para entender as relações entre cultura e lei, a regulação do mercado e as suas investidas de caráter selvagem não precisamos, necessariamente, de dinheiro", disse.
Gil afirmou que o ministério vai discutir na semana que vem propostas de mudanças na Lei Rouanet, de incentivos fiscais para a área cultural. "O conceito geral [das mudanças] é elevar a qualidade, democratizar o acesso e aumentar os fluxos [de recursos]."
Questionado se o governo cedeu aos interesses de grandes grupos de comunicação, especialmente da Rede Globo, no projeto de criação da Ancinav (Agência Nacional de Cinema e Audiovisual), Gil disse que seu ministério fez apenas "um recuo tático".
"Os detratores afirmavam que a criação da agência era uma antecipação à existência de uma lei específica para a área. O presidente Lula foi sensível ao argumento e fizemos o recuo para um ajuste."


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