Campinas, Segunda, 10 de maio de 1999

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INFÂNCIA PERDIDA
Campinas reduz sua média geral de mortalidade infantil, mas área do São José concentra miséria
Morte de bebê cresce 44% em "bolsão"

Frâncio de Hollanda/Folha Imagem
Erosão é coberta por lixo no Jardim Monte Cristo, maior área de ocupação de Campinas


ELI FERNANDES
free-lance para a Folha Campinas
MAURÍCIO SIMIONATO
da Folha Campinas

A mortalidade de bebês com menos de um ano aumentou 44% nos últimos dois anos na área atendida pela unidade de saúde São José (região sudoeste), onde fica o maior "bolsão" de miséria de Campinas, segundo levantamento da prefeitura. Na cidade o índice caiu 17,8% no mesmo período.
Desnutrição e falta de serviços básicos, como fornecimento de água tratada e coleta de esgoto são apontados por médicos e sociólogos como principal determinante desse crescimento na região.
A proporção, até o fim de 98, é de 17 crianças que morrem antes de completar um ano de idade para cada grupo de mil bebês que nasceram vivos e cujo atendimento foi feito pelo Centro de Saúde ou pelo pronto-socorro do Jardim São José, disse o médico João Antunes, coordenador da unidade.
Segundo o Nepo (Núcleo de Estudos da População) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a média dos países considerados desenvolvidos é de nove bebês mortos antes de um ano, em cada grupo de mil.
O aumento do índice nessa área se contrapõe ao que acontece na cidade, onde a mortalidade infantil foi reduzida em 17,8% no mesmo período, segundo dados da Prefeitura de Campinas.
Do total de 203 mortes infantis em Campinas no ano passado, cerca de 10,8% ocorreram na região do São José. Esse índice representa 22 bebês que morreram antes de completar um ano de idade.
Até o final de 96 foram registradas 15 mortes de bebês em cada mil crianças que não chegavam a completar um ano no São José.
A área compreende o Parque Oziel e o Jardim Monte Cristo, as maiores invasões urbanas de Campinas. A região é delimitada pelas rodovias Anhanguera, Santos Dumont, Bandeirantes e estrada velha de Indaiatuba.
A população do local é de aproximadamente 60 mil habitantes, segundo a informações da Secretaria Municipal da Saúde. Só nas ocupações a estimativa é de haver pelo menos 8.000 famílias sem-teto.

Combate
O combate à mortalidade infantil e à miséria nessa região é discreto e vem sendo feito principalmente por organizações assistenciais desvinculadas do poder público, como o Centro Boldrini, que atende a população no Parque Oziel uma vez por semana.
A Secretaria Municipal da Saúde de Campinas não tem sequer um plano emergencial para diminuir o crescimento da taxa naquela região. "Não há perspectiva de melhora desse quadro", disse o médico Igor Del Guércio, diretor de saúde da secretaria.
A demógrafa Estela Maria Garcia Pinto da Cunha, pesquisadora do Nepo, disse que a mortalidade infantil pode ser combatida com políticas pontuais (que podem apenas prolongar as vidas dos bebês) e globais de ação social.
Ensinar as mães a fazer soro caseiro é uma política pontual, pois evita a morte da criança, mas não suas causas, na maioria das vezes um complexo de problemas de estrutura social gerados pela má distribuição de renda, segundo a pesquisadora.
"Uma política global, que vai acabar com a miséria e, consequentemente, com a desnutrição, impede inclusive que a criança já nasça com problemas de saúde que podem levar à morte", disse.
Para ela, mais preocupante que a proporção de crianças mortas para cada mil nascimentos é o histórico do crescimento da mortalidade infantil. A proporção é mais baixa do a que da região de Campinas, de 19 mortes por mil nascimentos, porém está em crescimento.
Além da taxa de mortalidade, a explosão populacional na região, ocasionada pelas invasões de terras urbanas, elevou também a taxa de nascidos, que era de 979 em 96 e saltou para 1.320 no ano passado.



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