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Política no fim do mundo Livro bíblico do Apocalipse reflete brigas internas entre seguidores de Jesus de origem judaica e os de origem pagã, afirma pesquisadora americana
EDITOR DE “CIÊNCIA E SAÚDE” Para desapontamento dos que gostam de especulações proféticas, o livro bíblico do Apocalipse não traz previsões detalhadas sobre Barack Obama ou o governo Dilma. Segundo uma especialista americana, o autor da obra estava com a cabeça num problema bem mais próximo de sua época: os começos da briga entre judeus e cristãos. Para a historiadora Elaine Pagels, o mais correto é dizer que o escritor, cujo nome é João (mas quase certamente não tem nada a ver com o apóstolo desse nome), via a si mesmo do lado judaico dessa disputa. Para ele, os verdadeiros seguidores de Jesus estavam dentro do judaísmo. Pagels expõe em detalhes sua interpretação sobre a obra que encerra a Bíblia em "Revelations" (trocadilho com "Revelation", nome mais usado para o Apocalipse em inglês). O livro da pesquisadora da Universidade de Princeton acaba de ser lançado nos Estados Unidos. Há tempos os estudiosos do Novo Testamento perceberam o caráter fortemente judaico do Apocalipse. Para ser mais específico, muitos acreditam que as batalhas e atrocidades descritas na obra são, em parte, autobiográficas. O autor teria nascido na Palestina e vivido os horrores da Grande Revolta Judaica (por volta do ano 70 d.C.), quando guerrilheiros judeus se levantaram contra Roma -e perderam feio. "Há a referência à destruição do Templo de Jerusalém pelos pagãos no capítulo 11, por exemplo", lembra Paulo Augusto de Souza Nogueira, especialista em literatura apocalíptica da Universidade Metodista de São Paulo. Além disso, o grego do Apocalipse não se parece muito com algo saído da boca de um filósofo ateniense. Parece ter sido fortemente influenciado pelo hebraico e pelo aramaico, sugerindo que seu autor não era falante nativo do grego. "Ele diz, por exemplo, 'uma grande voz' ou 'uma voz de trovão', quando haveria modos de dizer 'uma voz forte' em grego", diz Nogueira. CONTRA PAULO Pagels vai além. Ela propõe que, após sair da Palestina e ir para a Ásia Menor (atual Turquia) depois da queda de Jerusalém, o autor do Apocalipse entrou em contato com cristãos de origem pagã -e não gostou nada do que viu. Seriam membros de igrejas fundadas pelo apóstolo Paulo, que também era judeu, mas tinha uma visão menos rígida sobre a necessidade de seguir os preceitos do judaísmo caso a pessoa desejasse acreditar em Jesus. Paulo, por exemplo, achava até admissível que os pagãos convertidos comessem carne de animais sacrificados aos deuses romanos. Para o autor do Apocalipse, isso seria quase o mesmo que fazer um pacto com o Diabo. E Paulo não odiava Roma -ao contrário de João, cujos monstros míticos, como a famosa "Besta" (a do número 666) são representações disfarçadas do poder romano e de imperadores como Nero. Para Pagels, João reserva alguns de seus termos mais duros -como "sinagoga de Satanás"- para cristãos de origem pagã que toleravam o consumo de carne sacrificada aos ídolos e se viam como o "novo Israel" -daí a referência a uma sinagoga. "Isso é comum na literatura apocalíptica. A crítica mira tanto o inimigo externo quanto membros do grupo do autor com os quais ele não concorda", diz Nogueira.
"REVELATIONS" -
TRUPE DO ARMAGGEDON
TRONO DE SATANÁS
CABEÇA RESSUSCITADA
PROSTITUTA DA BABILÔNIA
666
616? |
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