|
Próximo Texto | Índice
BIOLOGIA
Perfil genético do peixe sofre mudança profunda com pesca no Atlântico Norte, que dizimou 99,9% da população
Sob ameaça, bacalhaus amadurecem cedo
ALESSANDRO GRECO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Em 1497, o navegador e explorador italiano Giovanni Caboto
(também conhecido como John
Cabot) ficou impressionado com
a quantidade de bacalhau do
Atlântico (Gadus morhua) pescada por seus marinheiros na costa
de Labrador, no Canadá. Na década de 1990, cinco séculos depois, a
devastação do estoque desse peixe é tamanha que mudou profundamente o perfil genético da população que restou na região.
A diminuição atingiu 99,9%, em
relação à década de 1960, apesar
de o Canadá ter declarado uma
moratória na região em 1992, vigente até hoje e sem data para terminar. Segundo pesquisa publicada na última edição da revista
científica britânica "Nature"
(www.nature.com), a pesca excessiva levou as fêmeas de bacalhau a diminuir de tamanho e a
chegar à idade adulta mais cedo,
uma conclusão até então posta
em dúvida por cientistas e empresários de pesca.
Crescimento acelerado
"[Esben] Olsen e seus colegas
apresentaram evidências contundentes de mudança genética em
um dos mais conhecidos locais
com pesca excessiva de um tipo
de peixe", afirma Jeffrey Hutchings, da Universidade de Halifax, Nova Escócia (Canadá), em
comentário sobre a pesquisa na
mesma edição da "Nature".
A polêmica quanto à influência
da pesca sobre os genes do bacalhau vem da chamada "plasticidade" desses peixes diante de mudanças no seu ambiente. A diminuição da quantidade de bacalhau resultante da pesca excessiva
pode acarretar -além do aumento no preço de um peixe que
já foi comida de pobre- um aumento de recursos (alimento) e,
conseqüentemente, ao crescimento acelerado dos peixes remanescentes.
Peixes que crescem mais rápido
atingem a idade adulta antes de
peixes com crescimento mais lento. Segundo o estudo, no Atlântico Norte a chegada à idade adulta
das fêmeas diminuiu, em média,
de seis anos, no meio da década
de 1980, para cinco anos, no meio
da década de 1990.
"Isso poderia explicar, talvez de
forma rápida e econômica, a observação de que uma população
[de peixes] explorada tende a chegar à maturidade mais cedo, mas
eu acho que isso não exclui a possibilidade de que haja também
mudanças genéticas na maturação", diz Olsen.
Os dados encontrados apóiam a
hipótese de Olsen e de seus colegas de que não se trata apenas de
um efeito da maior disponibilidade de alimentos, mas também de
uma seleção de peixes com a capacidade genética de crescer e
amadurecer mais rápido. Para interpretar esses dados, porém, foi
preciso usar um novo método
probabilístico, capaz de separar o
colapso do bacalhau no Atlântico
Norte da mudança no crescimento e na maturação.
"Concluímos que nossa análise
apóia fortemente a hipótese de
que genótipos com tempo de maturação mais curto foram favorecidos em relação àqueles com maturação mais longa", afirma o
pesquisador.
Início de reversão
Talvez o maior achado da pesquisa seja o fato de ela indicar que,
em 1993, começou uma reversão
desse processo. "Nossa análise sugere que a moratória [de 1992]
causou uma mudança no regime
de seleção do bacalhau, em que
aqueles com genótipo para maturação mais longa passaram a ser
favorecidos em relação àqueles de
maturação mais curta", diz Olsen.
Como a moratória tem somente
12 anos, os autores afirmam, por
precaução, que é preciso esperar
novas pesquisas para ver se há
mesmo essa reversão.
Próximo Texto: Panorâmica - Câncer: Perfil genético aponta escolha de tratamento Índice
|