|
Próximo Texto | Índice
RIO +10
Nem a proposta européia com meta de 15% de geração por fontes renováveis consegue dobrar EUA e árabes
Fracassa a iniciativa brasileira de energia
Juda Ngwenya/Reuters
|
Premiê britânico, Tony Blair (esq.), e presidente francês, Jacques Chirac, em coletiva na Rio +10 |
CLAUDIO ANGELO
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADOS A JOHANNESBURGO
A briga foi boa, mas o impasse foi maior. Após duas madrugadas e um dia inteiro de negociações, a proposta brasileira de aumentar para 10% o total de fontes renováveis na matriz energética dos países até 2010 foi derrotada na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio +10). Para
ambientalistas, isso aponta o fracasso da cúpula.
O texto acordado no início da
noite não estabelece metas para
renováveis, algo que os países árabes (exportadores de petróleo) e
os EUA (maior consumidor de
combustíveis fósseis) não admitiam. Também foi derrotada a
proposta da União Européia de
15% de renováveis -incluindo
grandes usinas hidrelétricas (tais
usinas são consideradas problemáticas porque não só inundam
grandes áreas, muitas vezes de
florestas, e desalojam populações,
mas também porque a decomposição da vegetação inundada emite gases do efeito estufa).
Um compromisso entre as iniciativas brasileira e européia era a
última esperança para impor alvos ao plano de ação de Johannesburgo, desde que a proposta brasileira fora descartada pelo G-77,
o bloco dos países pobres (ao qual
pertencem o Brasil e também todos os países árabes).
Para amenizar o fracasso, o texto aprovado pelos ministros do
Ambiente da Rio +10 pede, com
urgência, "substancial aumento
na porção global de energias renováveis", reconhecendo "o papel de metas regionais e nacionais
voluntárias onde existirem".
Em outras palavras, se Brasil e
União Européia quiserem adotar
metas, parabéns para eles. O cumprimento dessas metas, inclusive,
poderá ser fiscalizado pela Comissão Mundial para o Desenvolvimento Sustentável. Se não quiserem, não haverá punição.
"Você não imagina como foi difícil conseguir isso", disse José
Goldemberg, secretário de Estado
do Meio Ambiente de São Paulo e
artífice da iniciativa brasileira.
Segundo Goldemberg, Kuait,
Omã e Arábia Saudita vetaram a
posição dominante no G-77, que
era favorável à meta de 10%. "É
claro que os americanos ajudaram à beça", comentou. Mesmo
assim, o simples reconhecimento
de que a energia renovável precisa
de alvos teria sido uma vitória.
"Isso vai influir no comportamento daqui para a frente."
Energia nuclear ficou fora
Outra vitória foi a exclusão da
energia nuclear na formulação do
texto, que abria a possibilidade de
que tecnologia nuclear fosse
transferida a países subdesenvolvidos. Para Marcelo Furtado, do
Greenpeace, não há nada a comemorar no texto final. "Isso aponta
para o fracasso da conferência",
afirmou. Ele diz concordar, no
entanto, que o Brasil assumiu um
papel de protagonista.
Diferentemente dos discursos
progressistas e ecologicamente
corretos dos chefes de Estado, o
texto final que se desenha para o
plano de ação da Rio +10 é muito
mais fraco do que seria necessário
para a implementação das recomendações da Agenda 21 para a
sustentabilidade.
O ministro do Meio Ambiente,
José Carlos Carvalho, pinta um
quadro menos dramático. "O risco de retrocesso não se confirmou", disse ontem. Tanto o princípio da precaução quanto o das
responsabilidades comuns, mas
diferenciadas, pilares da Eco-92,
foram mantidos no texto final.
As metas de água e saneamento
-reduzir pela metade até 2025 o
número de pessoas sem acesso a
água potável ou esgoto- também foram um avanço. E a Convenção sobre Diversidade Biológica começou a sair do papel, com
a concordância dos países ricos
em repartir benefícios auferidos.
O assessor especial da Presidência da República para a cúpula,
Fábio Feldmann, vê a situação de
outro jeito. "Eu acho que a marca
desta conferência até agora não
foi o sucesso", disse.
Segundo Feldmann, o que
aconteceu na Rio +10 foi um caso
de "bode na sala". Ou seja, criou-se uma série de obstáculos que
não estavam no roteiro antes
-como a tentativa de retroceder
em pontos acordados na Eco-92- para dar a impressão de que
houve algum avanço de fato. "Ela
corre o risco de ser uma Rio -10,
ou Rio -20", afirmou. "Se for um
fracasso, tem de responsabilizar
os protagonistas desse fracasso."
O jornalista Claudio Angelo viajou a Johannesburgo a convite da BrasilConnects Cultura e Ecologia
Próximo Texto: Ricos pedem fim de subsídios para agricultura; Canadá já apóia Kyoto Índice
|