São Paulo, sábado, 04 de maio de 2002

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PALEONTOLOGIA

Michael Schwickert, detido anteontem em Fortaleza, vendia espécimes brasileiros para museus na Europa

PF prende alemão suspeito de traficar fóssil

Manuel Cunha/"O Povo"
Peixe fossilizado apreendido com Michael Schwickert, suspeito de tráfico de fósseis


KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM FORTALEZA

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Suspeito de ser o maior traficante internacional de fósseis em ação no Brasil, o geólogo e paleontólogo alemão Michael Lothar Günther Schwickert foi preso anteontem em Fortaleza.
Schwickert já tinha prisão decretada desde o dia 25 de abril, mas apenas ao tentar renovar o visto de permanência no país, na sede da Polícia Federal no Ceará, em Fortaleza, ele foi preso.
O alemão não quis conceder entrevista e não constituiu advogado para representá-lo. Em depoimento à PF, disse ser inocente.
Ao mesmo tempo em que Schwickert era preso, a polícia apreendeu, no município de Milagres (487 km de Fortaleza), 1.740 fósseis que seriam exportados pelo alemão para a Europa. A maioria dos espécimes era composta de peixes e insetos do Período Cretáceo (144 milhões a 65 milhões de anos atrás).
A prisão dele foi motivada por outra apreensão de fósseis, em novembro do ano 2000, na bacia do Araripe, que fica na divisa entre Ceará, Pernambuco e Piauí (leia texto à direita). Na época, 20 mil peças foram encontradas.
Tráfico de fósseis é considerado crime contra o patrimônio cultural. Se condenado, Schwickert pode ter de cumprir pena de prisão de seis meses a três anos e, depois, ser expulso do Brasil.

Especialista
A prisão do alemão, que estava sendo investigado desde 1995, vai além de um simples caso de polícia: Schwickert, 45, é um dos "dealers" (comerciantes) de fósseis mais ilustres da Europa. Sua empresa, a MS-Fossil, na cidade de Sulzbachtal (no Estado da Renânia-Palatinado, oeste do país), fornece espécimes para instituições de pesquisa renomadas, como os museus de história natural de Paris e de Berlim.
Este último comprou de Schwickert em 2000, com nota fiscal e tudo, uma coleção de insetos fossilizados da formação Santana (uma das formações cretáceas do Araripe), vários deles ainda não descritos pela ciência.
Até aquele ano, a MS-Fossil concedia a qualquer pessoa -mediante uma contribuição em marcos alemães equivalente a R$ 10 mil- o direito de batizar insetos fósseis brasileiros. Bastava, para isso, enviar um e-mail (para msfossil@t-online.de).
A polícia e o DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral) acreditam que Schwickert seja a ponta de uma quadrilha internacional que envolveria até pesquisadores brasileiros.
A maior dificuldade encontrada pela polícia para prendê-lo em flagrante era o modo como Schwickert enviava os fósseis ao exterior. Ele fazia isso por meio de contêineres em navios, sob o disfarce de pedras e calcário. Geralmente ele usava os portos de Recife e do Rio de Janeiro, segundo o delegado Cauby Batista Lima, da Polícia Federal do Ceará.
Em entrevista à Folha em dezembro de 2000, Schwickert disse que nunca havia tocado um fóssil brasileiro para exportação. "Como você sabe, eu sou uma pessoa conhecida na Alemanha e não posso me arriscar a fazer nada contra a lei", disse.
A Folha apurou que a polícia quer tentar obter do geólogo informações sobre como os fósseis brasileiros são "esquentados" no exterior e passam a integrar coleções legalmente, com nota fiscal.
Países como a Europa e os EUA têm legislações que permitem a venda de material paleontológico, especialmente vindo de fora, mas proíbem a exploração de determinados sítios que ainda podem render espécimes importantes para estudo científico.
Tanto a PF quanto o DNPM querem também entender como agem os contrabandistas na região, que chegam a comprar fazendas em áreas ricas em fósseis e lançar mão de recursos como "mulas". "Ele contratava um trabalhador rural que foi quatro vezes à Alemanha para fazer curso de preparação de fósseis", disse o geólogo José Artur de Andrade, do DNPM do Crato.



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